Depressão pós-férias: lidar com o regresso ao trabalho

regresso ao trabalho

As férias costumam ser sempre um momento muito aguardado. Finalmente a libertação das obrigações laborais, a ausência de horários, a liberdade para a entrega ao desfrutar dos prazeres da vida. No entanto, tal como o início das férias pode trazer emoções positivas intensas, o seu fim pode intensificar-se igualmente, mas em emoções negativas. Se na maior parte dos casos o regresso ao trabalho é algo feito com alguma tranquilidade, para outras pode ser um verdadeiro martírio.

Neste artigo pretendemos explicar de que se trata a depressão pós-férias e quais algumas estratégias que podem ajudar para um regresso tranquilo ao trabalho.

O que é a depressão pós-férias?

Ao pensarmos neste termo temos de ter algum cuidado ao enquadrá-lo, pois muitas vezes é um conceito usado para várias situações sendo que nem todas elas constituem de facto um quadro depressivo.

Assim, o termo depressão pós-férias é muitas vezes usado para designar as emoções e sintomas negativos que por vezes surgem com o regresso ao trabalho. De facto, quatro em cada dez pessoas apresentam sintomas compatíveis com a depressão pós-férias.

Algum desânimo é normal surgir no momento do regresso ao trabalho, no entanto pode ocorrer mais do que um simples desânimo, com sintomas de irritabilidade, frustração, ansiedade, fadiga e mesmo angústia ou tristeza. Geralmente o mal-estar que pode ser sentido pela antecipação do regresso ao trabalho pode permanecer até uma semana, altura em que a pessoa se consegue readaptar à rotina. Se os sintomas se prolongam por mais tempo, podemos então estar perante um distúrbio que deve ser atendido.

O distúrbio da depressão pós-férias constitui-se de sintomas típicos que antecedem o regresso ao trabalho e podem persistir também nos primeiros dias de trabalho, e que se caracterizam por exemplo por dores musculares, dores de cabeça, cansaço, insónias, angústia, ansiedade e raiva.

O termo depressão pós-férias pode causar alguma estranheza, uma vez que supomos que as férias permitem à pessoa descansar, relaxar, divertir-se e renovar as suas energias, estando assim num estado de espírito mais positivo no regresso ao trabalho. No entanto, nem sempre é isto que acontece. Frequentemente o regresso ao trabalho é vivido com mau-humor, cansaço, fadiga, sonolência, ansiedade e até sintomas físicos como dores de cabeça.

Aquilo que distingue essencialmente as pessoas que retomam ao trabalho sem grande dificuldade e aquelas que apresentam depressão pós-férias não reside nas férias, mas sim no trabalho em si. A insatisfação laboral parece estar na base deste problema.

As condições e o ambiente de trabalho, o stress, o grau de exigência das tarefas e funções, as relações interpessoais e conflitos, a conciliação trabalho-família, entre outros, quando apresentam condições adversas, podem gerar insatisfação laboral, burnout e até depressão. Assim, na realidade as férias não estão na origem da depressão pós-férias, o que se verifica é que a obrigatoriedade do regresso ao trabalho que se impõe pode agudizar o quadro de sintomas e a insatisfação que já existe previamente.

Como prevenir a depressão pós-férias?

A depressão pós-férias deve identificar-se e prevenir-se antes das férias ocorrerem e do regresso ao trabalho se impor. É importante atentar a sintomas que ocorrem durante todo o ano e relativos ao trabalho ou ao ambiente laboral, tais como tristeza excessiva, choro frequente, desânimo e desmotivação, dificuldades de concentração, alterações no sono ou no apetite, entre outros.

Se o trabalho é fonte de insatisfação, é fundamental gerir esta situação antes da chegada das férias. É importante estar atento a alguns sintomas:

  • Falta de energia;
  • Desânimo;
  • Dificuldades de concentração;
  • Cansaço ou fadiga;
  • Tristeza;
  • Insónias;
  • Medo;
  • Sensação de culpa ou impotência;
  • Dores musculares ou dores de cabeça;
  • Problemas gastrointestinais (por exemplo dores de barriga ou diarreia).

Na presença desta sintomatologia depressiva a pessoa deve procurar ajuda psicológica, compreendendo que a intervenção atempada pode prevenir o agravamento dos sintomas e o surgimento de um quadro clínico mais grave.

É também importante que as empresas disponham de recursos e meios para apoiar os seus trabalhadores, por forma a que se previna os níveis elevados de stress, o burnout e a insatisfação laboral. Empresas atentas aos seus trabalhadores são empresas que ajudarão a prevenir quadros como a depressão pós-férias e a garantir um regresso ao trabalho mais saudável e positivo.

Para além das vantagens para os trabalhadores, as empresas que priorizam e valorizam a saúde mental e bem-estar dos seus colaboradores apresentam também maior sustentabilidade, produtividade e fator competitivo no mercado. Permitir por exemplo uma maior flexibilidade em termos de horários, bem como dar aos trabalhadores boas condições de trabalho e estruturas e recursos de apoio pode ser muito importante e prevenir problemas como a depressão pós-férias ou o burnout.

O que fazer num caso de depressão pós-férias?

Se de facto se verifica que está instalado um quadro de depressão, é importante que seja procurada ajuda psicológica, para um adequado diagnóstico e subsequente tratamento. Primeiramente serão avaliados os sintomas presentes e os fatores que estão associados, bem como as causas. Se o trabalho é a razão que de facto está na origem de toda a sintomatologia, poderemos estar perante um caso de burnout que deve ser tratado.

A intervenção psicológica é eficaz no burnout, estando esta eficácia devidamente comprovada. A psicoterapia é importante para o tratamento dos sintomas de burnout e para o restabelecimento do bem-estar físico, emocional e ocupacional. Em alguns casos pode ser necessário também o recurso à medicação, para por exemplo ajudar a diminuir sintomas depressivos, ansiosos ou insónias.

Como assegurar um melhor regresso ao trabalho?

Em muitos casos podemos não estar perante a um quadro de depressão pós-férias que precisa de ser tratado, mas ainda assim termos um mal-estar associado. Nesses casos, algumas medidas e estratégias podem ser fundamentais para promover um regresso ao trabalho mais tranquilo e saudável:

1. Organizar-se antes de ir de férias

Por um lado, é importante percebermos que garantir um regresso ao trabalho adequado começa antes mesmo das férias. Se formos de férias com as coisas desorganizadas, trabalho que vai ficar pendente e se vai acumular com aquele que surgirá durante a nossa ausência, é mais provável que o stress surja quando tivermos de regressar. Por isso, ir de férias com as coisas organizadas, devidamente ajustadas e preparadas pode ajudar muito no momento de regressar.

Se regressar ao trabalho já pode ser, em si mesmo, fonte de stress, convém diminuirmos outras possíveis fontes de stress adicional. Por exemplo, se para além de estar preocupado com o regresso ao trabalho também fica preocupado com o dinheiro que gastou nas férias, o seu stress aumenta ainda mais. Por isso, previna antecipadamente estas fontes de stress. Faça um orçamento do quanto pode e pretende gastar nas férias, resolva conflitos ou questões pendentes. Procure assegurar-se o mais possível de que quando voltar de férias não vai ter várias questões para resolver e que o preocupem.

2. Aproveitar as férias

Também as férias que fazemos e as formas como as fazemos podem ser um fator que melhora ou piora o mal-estar associado ao regresso ao trabalho. Por isso, é importante que realmente faça férias de uma forma positiva e que lhe faça sentido. Procure perceber as suas necessidades: o que procura nas férias? O que está a precisar neste momento? O que mais gosta? Precisa de ir à aventura e ter experiências novas, ou prefere relaxar e descansar sem estímulos ou preocupações à volta? Quer ir de mochila às costas fazer trilhos e caminhadas, ou quer relaxar à beira-mar e repor os sonos numa cama confortável?

Planeie de acordo com aquilo que quer fazer e aquilo de que necessita. Se a logística da viagem e todos os planos associados for para si um fator de stress, recorra a uma agência de viagens, por exemplo, ou peça a um amigo que seja ele a planear a viagem.

Também não é conveniente sobrecarregar-se nas férias, querer fazer tudo e encher o dia com atividades, pois poderá ficar mais cansado ainda e terminar as férias com a sensação de que precisa de “férias das férias”. Tenha em conta que improvisos acontecem e que é importante ter liberdade e tempo livre para descansar e diminuir os níveis de stress.

Para quem tem mais tendência para sentir mal-estar associado ao regresso ao trabalho, pode ser uma boa ideia fazer férias mais curtas mais vezes ao ano. Em vez de guardar os dias todos e usá-los de uma vez só, ficando depois com a sensação que vai passar muitos meses a trabalhar sem descanso, vá tirando miniférias ou fins-de-semana prolongados.

3. Preparar o regresso ao trabalho

Férias são sinónimo de liberdade, o que significa que muitas vezes deixamos de ter horários. Se isso por um lado pode ser positivo, por outro pode dificultar o regresso ao trabalho pois as rotinas e os horários ficaram desregulados. Como nos deitamos e acordamos sempre tarde, passa a ser difícil retomar o anterior horário laboral. Ou como passamos a comer fora de horas e a saltar muitas refeições, pode ser difícil regular a nossa alimentação. Por isso, uma estratégia importante pode ser a de começar a retomar as rotinas uns dias antes de voltar ao trabalho, para garantir que no dia de regressar não há um choque tão grande e uma dificuldade acentuada em retomar horários e rotinas.

Comece por exemplo a deitar-se e a acordar mais cedo três dias antes e a fazer as refeições da forma que costuma fazer no período laboral, ou pelo menos de forma aproximada. Isto pode ser especialmente importante se viajar para um outro fuso horário, uma vez que o nosso corpo demora cerca de um dia a habituar-se a um fuso horário novo.

Uma forma importante de prevenir sentir-se assoberbado no regresso ao trabalho é retomar de forma gradual. Para isso, procure preparar-se previamente, para que no primeiro dia de trabalho não tenha de lidar logo com inúmeras tarefas e situações de stress. Tente deixar um dia livre entre a altura em que volta das férias e o dia de voltar a trabalhar. Neste dia pode organizar-se, aproveitar para arrumar as coisas que precisa de arrumar, tratar das compras que tem de fazer para a semana, entre outras coisas.

Se possível, não marque muita coisa para o primeiro dia de regresso ao trabalho, para se poder ajustar, ler os e-mails que estão por ler, organizar o seu espaço de trabalho, fazer um almoço mais tranquilo… Deixe as reuniões e as decisões importantes para depois desse primeiro ou mesmo dos primeiros dias, se conseguir. Se conseguir, pode também optar por regressar a meio da semana, para ter menos dias até ao fim-de-semana e assim se poder reajustar de forma mais gradual.

4. Priorizar o bem-estar todo o ano

Muitas vezes temos a tendência de esperar pelas férias ou pelo fim-de-semana para realmente vivermos, desfrutarmos e fazermos coisas que nos dão prazer. Encaramos a semana como o período das obrigações. Quanto mais tivermos esta perspetiva, mais provável será de vivermos com desânimo o regresso ao trabalho após as férias ou os domingos à noite.

Mas a semana de trabalho não tem de ser um período cinzento onde não entra o prazer e a diversão. Procure incorporar e priorizar, todo o ano e durante toda a semana, os momentos de prazer e diversão. Aposte nos hobbies, nos convívios com as pessoas de quem gosta, enfim, inclua na sua rotina o que lhe faz bem, todos os dias.

Também os hábitos saudáveis devem existir todo o ano. Se garantirmos o nosso bem-estar e equilíbrio todos os dias, é mais fácil vivermos e gerirmos as mudanças com tranquilidade. Por isso, mantenha hábitos saudáveis de sono, alimentação e atividade física.

5. Aceitar e gerir pensamentos e emoções

É fundamental aprendermos também a aceitar as emoções menos positivas, compreendendo que é natural que surja alguma ansiedade ou desânimo com o regresso ao trabalho. Tudo isto é normal e geralmente passageiro, e não vale a pena tentarmos forçar a boa disposição ou insistir para que tenhamos de estar contentes e plenamente motivados. A motivação e o regressar ao ritmo habitual vai voltando com a adaptação dos primeiros dias.

Se os seus níveis de ansiedade estão mais elevados com o regresso ao trabalho, procure investir no relaxamento: faça exercícios respiratórios todos os dias ou pratique meditação antes de ir dormir.

Sabermos controlar a nossa mente e os nossos pensamentos é importante. Identifique os seus pensamentos negativos e preocupações: as tarefas que vai ter de fazer, os emails, o receio de não ser capaz de fazer as coisas… Identifique estes pensamentos, observe-os sem julgar e questione-os: qual a probabilidade daquilo que receia acontecer? Como pode lidar com a situação? Será que está a distorcer a realidade? Compreenda que pode ter pensamentos e observá-los, que eles são normais, mas nem sempre refletem a realidade.

Por fim, valide e normalize aquilo que está a sentir. Seja bondoso consigo mesmo, e compreenda que é natural termos alguma dificuldade em nos ajustarmos à mudança. Que todos precisamos do nosso tempo para nos adaptarmos, e que não há problema nenhum nisso. Compreenda que as emoções menos boas são naturais e até importantes, e que aprender a lidar com elas irá dar-lhe mais ferramentas e estratégias de gestão das emoções, tornando-o mais capaz e mais autoconsciente.

6. Encontrar aspetos positivos no regresso ao trabalho

Regressar ao trabalho não tem de ser uma coisa 100% negativa, e encontrar coisas positivas pode ajudar a incrementar a sua motivação e diminuir o mal-estar. Procure coisas que o motivem: um projeto novo que quer iniciar, por a conversa em dia com os colegas, reorganizar a secretária ou dar um novo aspeto ao seu gabinete… Além disso, existem mais férias! Reveja os momentos positivos das suas férias e comece a fazer planos para a próxima viagem ou simplesmente para o próximo fim-de-semana. O nosso humor e as nossas emoções são um reflexo do nosso pensamento e daquilo em que focamos a nossa energia.

Procure encarar o regresso ao trabalho como um recomeçar, uma oportunidade para fazer mudanças em hábitos ou aspetos da sua vida que pretende melhorar, como por exemplo ter uma alimentação mais saudável, beber mais água, cozinhar as refeições em casa, começar a fazer exercício…

Durante os primeiros dias de trabalho, procure incluir coisas positivas e que o façam sentir-se melhor. Por exemplo, planeie um almoço com um colega, ou dar um passeio na hora de almoço, comece a fazer exercício físico ou a investir num novo hobbie.

Prepare o regresso ao trabalho com tranquilidade e lembre-se: não espere pelas férias para ser feliz!

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.