Literacia em saúde: o que é e quais os benefícios

Literacia em saúde

A literacia em saúde diz respeito ao conjunto de conhecimentos que possuímos acerca da saúde e dos serviços de saúde. Uma boa literacia permite-nos tomar decisões informadas e adotar comportamentos mais saudáveis.

Sem literacia em saúde, não compreenderíamos o que nos faz bem, o que nos faz mal, o que devemos fazer para proteger a nossa saúde (por exemplo, qual a importância de uma alimentação equilibrada ou das vacinas), etc.

Sendo a literacia em saúde algo tão importante, neste artigo pretendemos explicar em que consiste a, que fatores a influenciam e como pode ser promovida.

O que é a literacia em saúde?

A literacia em saúde é, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o conjunto de competências cognitivas e sociais que determinam a motivação e a capacidade de as pessoas acederem, compreenderem e utilizarem a informação de saúde de forma a contribuírem para a promoção e manutenção da sua saúde.

Desse modo, a literacia em saúde implica a aquisição de um nível de conhecimento, competências pessoais e confiança para agir, de forma a melhorar a saúde individual e comunitária, através da alteração de comportamentos, estilos e condições de vida, representando um fator crítico para o empoderamento da população, no que à saúde diz respeito.

Assim, a literacia em saúde implica o conhecimento, a motivação e as competências das pessoas para acederem, compreenderem, avaliarem e aplicarem informação em saúde de maneira a formarem juízos e tomarem decisões no dia-a-dia sobre cuidados de saúde, prevenção de doenças e promoção da saúde, para que possam manter ou melhorar a qualidade de vida durante o ciclo de vida.

Importa também percebermos que quando falamos em literacia esta engloba duas componentes diferentes da saúde: a saúde física e a saúde mental. A literacia em saúde física inclui aspetos como a atividade física e a nutrição. Já a literacia em saúde mental inclui o conhecimento sobre estratégias importantes para uma saúde mental positiva e a identificação de problemas e soluções a esse nível.

Quais as competências de literacia em saúde?

A literacia em saúde, como vimos, não é uma única competência, mas sim um conjunto de competências, incluindo:

  • Conhecimentos básicos sobre saúde, que facilitam a adoção de comportamentos protetores de saúde e de prevenção de doenças, assim como o autocuidado;
  • Conhecimento acerca dos direitos em saúde e participação informada no debate público de assuntos relacionados com a saúde;
  • Competências de utilização dos sistemas de saúde enquanto consumidor, e de tomada de decisão relativa à saúde, sendo que a pessoa consegue agir como um parceiro ativo dos profissionais de saúde.

As competências de literacia de saúde implicam:

  • Acesso, ou seja, a capacidade para procurar e obter a informação necessária relativa à saúde;
  • Compreensão, isto é, a capacidade de compreender a informação sobre saúde à qual se acede;
  • Avaliação, sendo esta a capacidade de interpretar, filtrar, julgar e apreciar a informação de saúde à qual se teve acesso;
  • Aplicação, ou seja, a capacidade de comunicar e usar a informação para tornar uma decisão de manter e melhorar a saúde.

Através destes diferentes processos a pessoa consegue adquirir conhecimentos e capacidades que lhe permitem agir de forma ativa, quer seja de uma forma global e contribuindo para uma melhoria da saúde comunitária, quer seja de uma forma específica enquanto doente ou paciente / utilizador de um serviço de saúde específico e determinado.

Que fatores influenciam a literacia em saúde?

As competências incluídas no leque da literacia em saúde vão sendo adquiridas ao longo da vida e dependem de vários fatores. Mesmo pessoas que têm níveis educacionais elevados podem ter dificuldade em lidar com o sistema de saúde, nomeadamente quando passam por alguma condição de saúde que as torna mais vulneráveis.

Os níveis de literacia em saúde que as pessoas possuem influenciam diretamente a sua saúde, bem como o seu desenvolvimento social, pessoal e cultural.

A literacia em saúde é influenciada por diversos fatores:

  • Sistemas de saúde – quanto mais acessível e próximo das pessoas for o sistema de saúde, melhores serão os níveis de literacia que as pessoas possuem. Se os sistemas de saúde forem fechados, desorganizados e pouco próximos das pessoas, os níveis de literacia em saúde sofrerão com isso;
  • Educação – os níveis de educação das pessoas influenciam diretamente os níveis de literacia em saúde. Basta pensarmos que para que alguém possa compreender e interpretar devidamente informação num panfleto sobre uma doença e a sua prevenção, essa pessoa precisa de ter conhecimentos básicos de leitura, por exemplo;
  • Comunicação social – a comunicação social tem um papel fundamental nos níveis de literacia em saúde, já que esta pode funcionar como um dos principais veículos de transmissão de informação sobre saúde. Se a comunicação social procura transmitir às pessoas informações pertinentes, relevantes e fidedignas sobre saúde e acesso a serviços de saúde, então ela será um fator que contribuirá positivamente para os níveis de literacia em saúde;
  • Família – a família é um contexto importante para a literacia em saúde. É no nosso contexto familiar que aprendemos, desde pequenos, o que nos faz bem e o que nos faz mal, que comportamentos devemos adotar, o que é saudável e o que não é, quando devemos recorrer a um serviço de saúde e como o podemos fazer, etc;
  • Ambiente de trabalho – o ambiente laboral em que estamos inseridos também influencia os níveis de literacia em saúde, podendo contribuir para uma melhor literacia;
  • Comunidade e as decisões políticas – os governos tomam decisões relevantes no que à literacia em saúde diz respeito, devendo existir decisões políticas que incluam campanhas de promoção da literacia em saúde.

Como é a literacia em saúde em Portugal?

Atualmente os níveis de literacia em saúde em Portugal estão abaixo da média europeia. Deste modo, os portugueses têm uma baixa literacia em saúde, o que traz, inevitavelmente, custos individuais, mas também sociais. Os baixos níveis de literacia de Portugal estão associados a baixos níveis educacionais e de acesso a informação, o que provoca uma consequente diminuição da autonomia da pessoa.

De acordo com um estudo realizado em 2016, Portugal apresentava uma percentagem de 45,5% das pessoas inquiridas com níveis de literacia em saúde baixos, indicativos de limitações em termos das competências que são necessárias para prevenir doenças.

Consequências da falta de literacia em saúde

É prioritário promover e reforçar a literacia em saúde uma vez que os baixos níveis de literacia acarretam custos elevados, quer para as pessoas quer para a sociedade como um todo e para o sistema de saúde. Segundo a OMS, 3 a 5% dos gastos em saúde são causados pelo facto de os níveis de literacia em saúde das pessoas serem insuficientes.

Ao não terem uma adequada literacia em saúde, as pessoas não sabem usar os serviços e recursos de saúde da melhor forma, além de optarem por opções e estilos de vida pouco saudáveis. De facto, baixos níveis de literacia em saúde levam a um aumento do número de internamentos, a uma maior procura e utilização dos serviços de urgência, a uma menor preocupação e ação para a prevenção da doença e promoção da saúde e, consequentemente, a uma diminuição da qualidade de vida das pessoas.

Os problemas podem ser ainda mais acentuados quando falamos de literacia em saúde mental, já que vários estudos indicam que os jovens não conseguem identificar, tratar e prevenir as doenças mentais. Embora a ansiedade seja um problema de saúde mental bastante comum, grande parte das pessoas não reconhece os sintomas e não procura ajuda.

Promover a literacia em saúde e a participação das pessoas no Serviço Nacional de Saúde tornará possível que estas tomem decisões mais informadas e eficazes, podendo por sua vez compreender, processar, assimilar e aplicar a informação à qual têm acesso, permitindo assim otimizar a utilização das competências e desenvolvendo um conjunto de aptidões que se traduzem em níveis de literacia distintos.

Quais os benefícios da literacia em saúde?

Quando os níveis de literacia em saúde são mais elevados, são inúmeros os benefícios que podemos observar:

  • Maior capacidade das pessoas para pensarem de forma crítica de forma a anteciparem problemas de saúde e exibirem comportamentos saudáveis, estabelecendo metas de forma a prevenir a doença e promover a saúde;
  • Maior capacidade das pessoas para, de forma autónoma ou com ajuda, encontrarem soluções para problemas de saúde que surjam;
  • Maior capacidade de autonomia, sendo que as pessoas manifestam mais competências para procurar, obter e usar de uma maneira crítica e adequada os serviços de saúde e as informações sobre a saúde;
  • Maior capacidade para comunicar de uma forma eficaz, transmitindo ideias e informações fidedignas e de forma organizada;
  • Cidadãos mais pró-ativos e responsáveis, com um papel ativo ao manter a sua comunidade protegida, saudável e segura.

Como promover a literacia em saúde?

Como vimos, uma adequada literacia em saúde é algo fundamental. Deste modo, importa pensarmos de que forma a literacia pode ser promovida, quer de um ponto de vista mais global e abrangente (em termos de campanhas e políticas) quer de um ponto de vista individual, já que cada pessoa pode, individualmente, fazer a diferente.

Ao promover a literacia em saúde, aumentamos a capacidade que cada pessoa tem para agir sobre a sua saúde, bem como para procurar informação, tomar decisões e assumir responsabilidades. Isto, consequentemente, contribuirá para um aumento dos níveis de bem-estar e da qualidade de vida.

A literacia deve ser promovida nos diversos contextos de vida das pessoas, e é importante que sejam disponibilizadas ferramentas que facilitem a interpretação da informação que é transmitida, para que as pessoas possam tomar decisões informadas e consciente.

A literacia em saúde pode ser promovida pelos próprios cidadãos, pelas instâncias políticas responsáveis pela educação e pela saúde, pelos serviços de saúde e ainda por outros setores da sociedade.

As principais estratégias para promover a literacia em saúde são:

  • Diminuir a complexidade do sistema de cuidados de saúde e sociais, por forma a facilitar a possibilidade de as pessoas compreenderem o sistema e terem acesso a ele;
  • Diversificar as estratégias e os meios de comunicação e informação, tendo em conta que cada pessoa tem um perfil diferente e níveis de competências diferentes;
  • Apoiar iniciativas, programas e campanhas que tenham como objetivo promover os conhecimentos e as competências relacionadas com a saúde e com o uso de serviços de saúde;
  • Incluir a literacia em saúde nos currículos das escolas;
  • Incentivar os profissionais de saúde a, em vez de adotarem uma abordagem prescritiva, promoverem a autonomia das pessoas e permitirem que os pacientes sejam parte ativa e colaborante no seu próprio processo de tratamento;
  • Incentivar os profissionais de saúde a permitir que a pessoa exponha as suas dúvidas, expectativas, preocupações, sugestões e propostas…;
  • Adotar, nos contextos de saúde, uma linguagem clara, assertiva e acessível a todas as pessoas;
  • Apostar e investir numa boa relação terapêutica entre paciente e profissional de saúde;
  • Promover e criar debates e eventos de promoção da literacia em saúde;
  • Envolver todas as pessoas da comunidade para participarem em iniciativas relacionadas com a saúde (por exemplo rastreios ou campanhas de vacinação);
  • Criar campanhas de prevenção em diversas temáticas relacionadas com saúde, sendo que estas campanhas podem ocorrer em espaços da comunidade como escolas ou centros de saúde;
  • Criar locais de acesso fácil onde as pessoas possam expor as suas dúvidas sobre saúde;
  • Desenvolver ambientes e contextos promotores de comportamentos saudáveis, como espaços para a prática de atividade física;
  • Utilizar as plataformas digitais e redes sociais para a promoção da literacia em saúde;
  • Promover nos locais de trabalho formações como por exemplo a formação em primeiros socorros;
  • Promover comportamentos saudáveis nos locais do trabalho, criando por exemplo espaços em que as pessoas possam circular ou estar de pé, proibindo o consumo de tabaco, etc;

Que recursos de literacia em saúde existem?

Atualmente existem alguns recursos e instrumentos de apoio no nosso Sistema Nacional de Saúde português que procuram promover a literacia em saúde:

  • Biblioteca de Literacia em Saúde: consiste num repositório de informação digital de referência para consultar e partilhar informação e recursos promotores de literacia em saúde, articulados com programas prioritários nacionais e organizados segundo o ciclo de vida. Esta biblioteca identifica, recolhe, organiza, agrega e divulga os recursos de qualidade que visam a promoção da literacia em saúde. Permite, de forma autónoma ou acompanhada, que pessoas doentes, os seus cuidadores ou profissionais de saúde possam aceder a informação credível e fidedigna sobre temas relevantes de saúde. A biblioteca pode ser consultada em www.biblioteca.sns.gov.pt e pode ser navegada por temas-chave, bem como consultas fichas técnicas ou descarregados recursos pertinentes ou ainda visitar portais de acesso;
  • Livros digitais sobre temas de saúde, que podem ser consultados na área do cidadão do portal do SNS, na biblioteca de literacia em saúde ou no Portal do Plano Nacional de Leitura. Podem ser consultados vídeos, jogos, bandas desenhadas e ligações externas para portais de saúde e artigos científicos. Podem ainda ser testados conhecimentos, impressa páginas do livro e importados conteúdos para o Diário da Minha Saúde;
  • Diário da Minha Saúde – é um instrumento que permite a cada pessoa agregar, num espaço digital personalizado e confidencial, a informação respeitante ao seu percurso de vida e à sua saúde. A informação pode incluir notas sobre experiências pessoais, excertos de leituras, conteúdos multimédia, entre outros. Neste Diário a pessoa pode copiar conteúdos de interesse, escrever sobre o seu estado de saúde, preparar consultas com o médico e partilhar conteúdo com familiares, amigos ou profissionais de saúde;
  • Linha telefónica SNS24;
  • Aplicações móveis como a MySNS Carteira ou o portal do cidadão do SNS24.

Como aumentar a minha literacia em saúde?

Vimos anteriormente diversas estratégias que permitem a promoção da literacia em saúde de uma forma abrangente. No entanto, é também importante referir o papel que cada um de nós pode ter na promoção da literacia.

Se cada um de nós procurar alargar os seus conhecimentos e competências no que à saúde diz respeito, a literacia em saúde de uma forma global aumenta e isso tem repercussões positivas na nossa saúde e bem-estar comunitários e gerais. Assim, algumas coisas que devemos fazer são:

  • Fazer uma utilização responsável dos recursos e serviços de saúde, sabendo que recursos usar para que situação específica (por exemplo, não nos dirigirmos à urgência caso a nossa situação não seja, de facto, urgente);
  • Ser crítico perante a informação que vemos divulgada e capazes de questionar e colocar dúvidas;
  • Falar com os profissionais de saúde, expondo dúvidas, questões e apresentando sugestões, se necessário;
  • Manter-se atento à informação e a par das questões de saúde mais relevantes;
  • Manter o seu registo de saúde em dia e monitorizar os seus dados de saúde (fazendo, por exemplo, check-ups regulares);
  • Saber diferenciar informação fidedigna de informação falsa ou fake news, não divulgando este tipo de informação.

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.