Orientação sexual: o que é, tipos, formação e preconceito

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A orientação sexual, que diz respeito ao que cada pessoa pensa e sente sobre si própria e sobre a sua afetividade e sexualidade e por quem de facto se sente atraída afetiva e sexualmente, é uma temática que tem sido mais debatida e explorada nos últimos anos.

Sabemos hoje em dia que existem diferentes tipos de orientação sexual, no entanto, por vezes ainda existe pouca compreensão relativamente à diversidade sexual efetivamente existente. Como tal, neste artigo pretendemos explorar o tema da orientação sexual por forma a promover uma maior compreensão sobre o mesmo.

O que é a orientação sexual?

A orientação sexual diz respeito às preferências em termos de atração sexual, ou seja, por quem a pessoa se sente atraída afetiva e sexualmente. Diz respeito, assim, ao envolvimento no plano amoroso, emocional ou da atração sexual.

Neste âmbito, uma pessoa pode sentir-se atraída por pessoas de género diferente, pessoas do mesmo género e pessoas de ambos os géneros. Pode também sentir-se atraída por qualquer pessoa, independentemente da identidade de género (género com o qual a pessoa se identifica).

Neste âmbito encontramos diferentes termos:

TermoSignificado
Heterossexual Alguém que se sente atraído por pessoas de género diferente do eu.
Homossexual Alguém que se sente atraído por pessoas do mesmo género que o seu. Designam-se de lésbicas as mulheres homossexuais, e de gays os homens homossexuais.
Bissexual Alguém que se sente atraído por pessoas de ambos os géneros.
PansexualAlguém que se sente atraído por pessoas independentemente do seu sexo ou identidade de género (isto é, o género não é um fator determinante para a atração por outras pessoas, podendo por isso sentir-se atraídas, por exemplo, por pessoas que se identificam como homens, por pessoas que se identificam como mulheres e por pessoas que não se identificam com nenhum dos géneros, ou pessoas transsexuais, transgénero, etc).

Por vezes pode parecer complexo compreender a diferença entre a bissexualidade e a pansexualidade. A bissexualidade é usada como termo que designa a atração pelos dois géneros.

Quanto à atração a pansexualidade acaba por não se diferenciar da bissexualidade, uma vez que é definida pela capacidade de uma pessoa se sentir atraída por todos os géneros. Embora diferentes, são ambas válidas e a diferença reside essencialmente no contexto histórico e cultural em que cada um dos conceitos surge.

Se antes considerávamos a existência de apenas dois géneros ou identidades de género – masculino e feminino – agora assumimos que podem existir diferentes expressões da identidade de género, e como tal a pansexualidade abrange a atração afetiva e sexual por todas essas variações em termos de identidade de género.

Enquanto que uma pessoa bissexual reconhece os diferentes géneros, uma pessoa pansexual sente atração por todos os géneros sem fazer distinção, ou seja, a pessoa sente-se atraída por outras pessoas independentemente do género, não sendo o género que determina a sua atração afetiva ou sexual.

Como e quando se desenvolve a orientação sexual?

A consciência de que se é homossexual, por exemplo, surge, normalmente, na fase da adolescência. A forma como cada pessoa adquire esta perceção é distinta, mas quase sempre envolve uma fase de dúvida e confusão.

Há pessoas que afirmam que de alguma forma sempre se sentiram diferentes da norma. Quando muitos dos sentimentos confusos são esclarecidos e a pessoa compreende que tem uma orientação sexual diferente da norma, a confusão dá lugar a alguma incerteza e até receio.

Existem também pessoas que só descobrem a sua orientação sexual em períodos de muitas mudanças. Também há quem apenas tenha uma perceção efetiva da sua orientação sexual na idade adulta. Assim, cada caso é diferente e particular.

Em todas as situações há geralmente uma fase de sofrimento, em que, compreendendo que a sua orientação sexual não é normativa (a mesma que a “norma social”), luta muitas vezes contra esse sentimento ou desejo, por ter aprendido que a sociedade não “aprova” esse padrão de relacionamento.

Se pensarmos no processo de desenvolvimento e na elaboração da orientação sexual, podemos desde logo identificar quatro fases distintas:

Primeira fase

A primeira fase diz respeito ao sentir-se diferente, ou seja, a pessoa apercebe-se de que de alguma forma é diferente da “norma”. Isto tem tendência a ocorrer entre os 8 e os 13 anos de idade. É um processo de descoberta que vai sendo progressivo e que é muitas vezes acompanhado de desejos, fantasias, pensamentos e sonhos indicativos das preferências sexuais;

Segunda fase

Esta fase diz respeito a conseguir compreender em que consiste, de facto, esta diferença. Ou seja, é quando a pessoa consegue identificar que a diferença reside no facto de ela não se sentir atraída por pessoas do sexo oposto, como a “maioria2 das pessoas. Há, assim, uma crescente tomada de consciência dos seus próprios sentimentos e preferências no que diz respeito à orientação sexual;

Terceira fase

A terceira fase diz respeito ao reconhecimento de si mesmo como uma pessoa homossexual/bissexual/pansexual, o que tende a acontecer entre os 13 e os 20 anos de idade;

Quarta fase

A última fase diz respeito à aceitação da sua orientação sexual, isto é, a pessoa aceita-se como homossexual/bissexual/pansexual. A altura em que esta aceitação ocorre é altamente variável. Para algumas pessoas pode ocorrer aos 20 anos de idade, para outras aos 30 ou mesmo aos 40.

Existem até pessoas que, infelizmente, podem não chegar à fase da aceitação da orientação sexual. Há também casos em que, embora a pessoa tenha percorrido as três primeiras fases durante a adolescência ou juventude, só acaba por se aceitar entre os 45 aos 60 anos de idade. Isto acontece devido à repressão social e cultural existente e, por consequência, à repressão que o indivíduo coloca sobre si próprio.

A orientação sexual é uma escolha?

Muitas vezes surgem as típicas questões e dúvidas: a pessoa escolhe a sua orientação sexual? é uma questão de opção? A orientação sexual não é uma opção, mas sim algo que está claramente imbricado na identidade da pessoa.

Se é heterossexual, pense simplesmente se escolheu sentir-se assim, ou se foi algo que fez parte de si de forma natural. Escolheu apaixonar-se por aquela pessoa ou sentir-se atraído por ela, ou simplesmente apaixonou-se? O mesmo podemos dizer para quem é homossexual, bissexual ou pansexual.

A escolha reside apenas na decisão de viver de acordo com a sua própria identidade e orientação sexual. O que se escolhe não é se se é homossexual ou não, mas se se vive de acordo com aquilo que se é.

Muitas vezes essa escolha, de “sair do armário” e viver livremente de acordo com a sua orientação sexual não-normativa, não é fácil, uma vez que requer do indivíduo a capacidade de não se sujeitar aos processos de normatização que a sociedade acaba por criar e impor e, em vez disso, respeitar a sua identidade, os seus desejos e os seus sentimentos. Isto implica, quase sempre, lidar com preconceitos e com a discriminação.

Este pode, de facto, ser uma outra forma de compreendermos que a orientação sexual não é uma escolha. Se fosse, porque é que as pessoas escolheriam uma orientação sexual que ainda as faz ser vítimas de preconceito e discriminação?

A orientação sexual nasce com a pessoa?

Se por vezes existe a dúvida se a orientação sexual é uma escolha ou não, por outro lado, compreendendo-se não ser uma escolha, há uma tendência a achar que é natureza ou instinto, isto é, que a pessoa nasce heterossexual ou homossexual. Tal também não é verdade. Todos nós, quando nascemos, podemo-nos vir a tornar heterossexuais ou homossexuais.

A nossa identidade sexual, ou seja, se nos identificamos como homem ou como mulher, forma-se nos primeiros anos de vida. Já no caso da orientação sexual, isto é, por que pessoas nos sentimos atraídos, vai-se estruturando ao longo dos anos e até ao início da adolescência ou durante o período da mesma.

Embora todos nós recebamos influências ao longo da nossa infância, é na entrada na adolescência que vamos formando uma perceção mais exata da nossa orientação sexual. Diversos fatores contribuem para o desenvolvimento da orientação sexual, desde fatores sociais, culturais, hormonais ou mesmo genéticos. No entanto, nenhum destes fatores é determinante isoladamente. A nossa orientação sexual não nasce nos genes.

Por outras palavras, a orientação sexual é determinada por múltiplos fatores, sendo que as relações familiares, a história de vida e a cultura e sociedade são fatores de grande peso e importância. Como tal, seria errado que nascemos heterossexuais ou homossexuais. A orientação sexual não é inata, uma vez que envolve um processo de construção pessoal que é influenciado pelo ambiente social, familiar e cultural, bem como fatores biológicos e individuais.

Mais do que compreender como e porque é que a orientação sexual se desenvolve de determinada maneira, devemos sim aceitar a sua existência assim como aceitamos uma série de diferenças na identidade pessoal e global de cada um.

Orientação sexual e identidade de género

Há um estigma bastante presente que consiste em associar automaticamente a orientação sexual com a identidade de género. Esta associação verifica-se por exemplo quando achamos que os homens homossexuais são “afeminados” ou “menos homens” ou quando achamos que as mulheres homossexuais são “masculinas” e “menos femininas”.

É necessário esclarecer que identidade de género ou identidade sexual é diferente de orientação sexual. A identidade de género diz respeito ao género com o qual a pessoa se identifica – se ela se identifica como mulher, homem ou com nenhum dos géneros. Como tal, uma pessoa heterossexual pode ser um homem que gosta de mulheres e, em termos de identidade de género, este homem pode sentir-se homem e identificar-se como tal, ou pode sentir-se mulher e identificar-se com o género feminino.

Da mesma forma, um homem homossexual pode identificar-se e sentir-se como homem. Também uma lésbica se pode identificar como mulher, sentir-se mulher e gostar de ser mulher.

É necessário compreender que a orientação sexual não diz respeito à forma como nos sentimos relativamente ao nosso sexo ou género, apenas àquilo que nos atrai afetiva e sexualmente.

O preconceito em função da orientação sexual

Não é raro ouvirmos frases como “hoje em dia toda a gente já aceita isso”, “já não há discriminação”, no entanto, isto é claramente uma falácia. É verdade que a luta e o progresso têm existido, no entanto o caminho está longe de estar concluído.

Muitos adolescentes com uma orientação sexual não normativa pensam em suicídio, por exemplo. Entre os 13 e 18 anos são muito mais os adolescentes homossexuais que cometem suicídio do que os heterossexuais. Se a orientação sexual não normativa fosse de facto plenamente aceite e não existisse qualquer tipo de preconceito, não existiria este sofrimento associado.

Durante muito tempo a orientação sexual não normativa, sobretudo a homossexualidade, foi considerada como uma doença, o que claramente criou mais estigmatização e preconceito.

Apenas em 1984 a Organização Mundial de Saúde proibiu a classificação da homossexualidade como desvio ou doença, e só em 1990 é que a homossexualidade foi retirada da Classificação Internacional de Doenças.

Até esse processo de despatologização da homossexualidade, muitos atos atrozes foram feitos. Praticavam-se inclusive terapias de conversão, que consistia em utilizar terapia aversiva com eletrochoques para “converter” a pessoa em heterossexual. Utilizou-se ainda outras formas de conversão, como recondicionamento, tratamentos hormonais e até castração e lobotomia.

Existe de facto um conceito que reflete a discriminação face à homossexualidade, que é o conceito de homofobia. A homofobia refere-se à aversão existente face a pessoas homossexuais, sendo por isso um sentimento essencialmente negativo que acaba por se manifestar em atitudes de preconceito, discriminação e exclusão e em comportamentos de desprezo face ao outro ou mesmo de violência e agressão. Por outras palavras, a homofobia pode ser considerada como o ódio ou a intolerância face a pessoas com orientação sexual não normativa.

A discriminação é real e persiste. Se analisarmos dados de Portugal, em 2012, 55% dos portugueses acreditavam que a discriminação baseada na orientação sexual era bastante frequente no país.

O preconceito torna-se ainda mais visível e proeminente se falarmos em parentalidade, ou seja, na possibilidade de pessoas com orientação sexual não normativa serem pais ou mães. Em 2007 apenas 19% da população portuguesa concordava com a adoção por parte de casais do mesmo sexo. Em 2013 verificou-se que 51% das pessoas LGBTQIA+ disseram sentir-se discriminadas com base na sua orientação sexual, 59% evitavam dar a mão em público ao/à seu/sua companheiro/a por medo de serem humilhados ou maltratados.

Como diminuir o preconceito face à orientação sexual?

Combater o preconceito e promover a tolerância e o respeito é uma função de todos os indivíduos e da sociedade como um todo. Como vimos, apesar de terem vindo a ser implementados esforços nesse sentido, há ainda muito por fazer.

Como medidas importantes, podemos considerar:

  • Ações dos governos e de organismos como a ONU no combate a práticas discriminatórios e sobretudo a uma série de violações de direitos humanos associados à orientação sexual não normativa;
  • Legislação não-discriminatória e mudanças das normas sociais no sentido de uma maior aceitação e inclusão, protegendo os direitos de todas as pessoas;
  • Penalizar legalmente todos os crimes de ódio;
  • Denunciar situações de discriminação em função da orientação sexual, seja no emprego, na saúde, na escola ou em outros espaços comunitários e sociais;
  • Promover a informação e ajudar a que todas as pessoas compreendam melhor a diversidade sexual, eliminando estereótipos e informações erradas;
  • Não aceitar nenhum tipo de piada, insulto ou comentário homofóbico e um discurso de ódio e explicar porque é que estas atitudes não são aceitáveis;
  • Respeitar a forma como as pessoas querem ser tratadas e tratá-las de acordo com isso e não com base nos nossos próprios preconceitos;
  • Não assumir, não supor que as pessoas têm determinada preferência (ex: perguntar “então, tens namorada?” supondo dessa forma a orientação sexual da pessoa);
  • Não colocar entraves à participação das pessoas com base na sua orientação sexual;
  • Caso sejamos vítimas de discriminação ou conheçamos alguém que o é, reportar essas práticas;
  • Ser compreensivo face aos efeitos que o estigma pode ter em pessoas com orientação sexual não normativa;
  • Compreender que expressões, atrações, sentimentos e comportamentos dirigidos a pessoas do mesmo sexo são expressões da diversidade da sexualidade humana;
  • Compreender e aceitar que pode ser difícil para a pessoa com orientação sexual não normativa passar pelo processo de descoberta e aceitação, não forçando nem impingindo nada na outra pessoa;
  • Não assumir e achar que sabemos tudo, procurando, antes de mais, informarmo-nos e dotarmos de conhecimento antes de emitirmos juízos;
  • Promover e favorecer a desconstrução de crenças, atitudes e comportamentos de discriminação contra as pessoas com orientação sexual não normativa.

Conheça recursos úteis de apoio e conhecimento sobre o tema:

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.