Síndrome de Asperger: o que é, sintomas e causas

Síndrome de Asperger

A síndrome de Asperger é uma síndrome que se insere dentro das perturbações do espectro do autismo. Como tal, muitas vezes surgem dificuldades em distinguir os diferentes graus de autismo e especificamente a síndrome de Asperger.

Neste artigo pretendemos esclarecer o que é a síndrome de Asperger, quais os seus sinais e sintomas, bem como as formas de intervenção e dicas para lidar com crianças com esta síndrome.

O que é a síndrome de Asperger?

A síndrome de Asperger é uma perturbação do neurodesenvolvimento, que afeta sobretudo a área das relações interpessoais e da comunicação. É um transtorno neurobiológico que se enquadra dentro dos transtornos globais do desenvolvimento.

A esta síndrome estão associadas características como os interesses e habilidades específicas e circunscritas, o comportamento estereotipado e repetitivo e os distúrbios motores.

Atualmente a síndrome de Asperger deixou de surgir como uma perturbação em separado, para passar a integrar o conjunto das chamadas perturbações do espetro do autismo. A síndrome de Asperger é, dentro das perturbações do espectro do autismo, a perturbação menos grave.

No que diz respeito à sua prevalência, verifica-se que é mais comum em pessoas do sexo masculino do que feminino, numa proporção de 4 para 1.

É importante salientar que, embora a síndrome de Asperger seja caracterizada por sintomas e manifestações específicas, elas podem ser altamente variáveis de pessoa para pessoa. Muitas pessoas com esta síndrome podem ter uma vida perfeitamente normal, tanto a nível familiar como social ou profissional, de acordo com as suas limitações e necessidades individuais.

Devido às dificuldades ao nível da socialização e ao facto de apresentarem alguma excentricidade, as crianças com síndrome de Asperger muitas vezes acabam por preferir relacionar-se com adultos do que com os seus pares.

Embora em muitas crianças as manifestações da síndrome de Asperger surjam por volta dos 3 anos de idade, na maioria o diagnóstico só ocorre entre os 5 e os 9 anos de idade.

Sinais e sintomas da síndrome de Asperger

Alguns sinais diferenciadores estão presentes na síndrome de Asperger, pelo que constituem sinais de alerta importantes aos quais os pais e outros cuidadores devem estar especialmente atentos:

  • Solitário, tendência ao isolamento e a “estar no próprio mundo”;
  • Não se verificam atrasos na linguagem nem problemas significativos ao nível da fala;
  • Pouca imaginação e fantasia limitada nas brincadeiras típicas da idade;
  • Não brinca, ou brinca pouco, ao faz-de-conta;
  • Dificuldade em seguir as regras nas brincadeiras de grupo, pois existe a tendência a determinar sempre a mesma regra;
  • Pouco interesse noutras crianças, exceto quando estão na órbita do seu interesse específico;
  • Interesses restritos e muito específicos (por exemplo, só gostar de carros ou de dinossauros e focar-se excessivamente nisso, não tendo interesse por outras coisas). O interesse é tão específico e circunscrito que chega a parecer-se como uma obsessão;
  • Os interesses são muitas vezes focados em coisas, como aparelhos mecânicos ou eletrónicos, e não em pessoas;
  • Faz perguntas inadequadas a pessoas não conhecidas ou pouco familiares, parecendo  não ter “filtro” ou ter pouca noção das regras sociais;
  • Forma de andar “desajeitada” ou pouca coordenação;
  • Postura bizarra, nomeadamente ao nível dos braços e das mãos;
  • Mímica facial e corporal pobre e dissociada do diálogo e da interação;
  • Afetividade superficial, pode não expressar emoções em situações em que é esperado que o faça;
  • Voz robotizada, com pouca entoação;
  • Persistir muito num único assunto do seu interesse;
  • Dificuldade em compreender piadas, ironia ou sarcasmo;
  • Compreensão superficial de significados abstratos, por exemplo dificuldade em perceber a diferença entre um colega e um amigo;
  • Dificuldade em compreender o significado de uma frase quando o que distingue é o tom de voz;
  • Dificuldade em estabelecer contacto visual ao falar com alguém;
  • Preocupações ilógicas e sem sentido;
  • Perceção de que é diferente das outras pessoas da sua idade;
  • Conhecimento desproporcional em determinados assuntos, por exemplo, perceber demasiado sobre comboios;
  • Sintomas obsessivos e rituais, sendo comum as crianças com síndrome de Asperger desenvolverem rituais e terem muita dificuldade em alterá-los. Estes rituais podem ir desde tomar banho lavando sempre as partes do corpo na mesma ordem até vestir-se sempre na mesma sequência, por exemplo;
  • Comportamento repetitivo ou atípico, por exemplo movimentos como estalar os dedos repetidamente;
  • Humor deprimido;
  • Memória excelente, por vezes fotográfica;
  • Dificuldade em narrar coisas que aconteceram e experiências vividas.

Quais as causas da síndrome de Asperger?

As causas da síndrome de asperger são multifatoriais e ainda não são totalmente conhecidas. A investigação científica tem demonstrado qua a síndrome de asperger parece estar associada a alterações ou anormalidades a nível cerebral.

Verificam-se diferenças na estrutura e no funcionamento de determinadas áreas do cérebro em pessoas com síndrome de asperger.

A síndrome de asperger parece ter também uma componente hereditária, o que significa que crianças que tenham familiares com esta síndrome têm maior risco de a desenvolver. Há transtornos psiquiátricos que parecem estar, de alguma forma, ligados à síndrome de asperger, tais como o transtorno bipolar ou a depressão. A combinação entre fatores genéticos e fatores ambientais parece determinar o risco de desenvolvimento desta síndrome.

Diagnóstico da síndrome de Asperger

A síndrome de Asperger, ou as suas primeiras manifestações, surge desde cedo. No entanto, pode haver dificuldade por parte dos pais ou outros cuidadores em identificar os sinais, pois estes inicialmente podem ser confundidos com o temperamento da criança ou outras questões, acabando por ser desvalorizados.

Além disso, as crianças tendem a conseguir funcionar adequadamente em muitos aspetos e contextos, pelo que alguns comportamentos acabam por ser interpretados apenas como atitudes estranhas mas sem maior importância.

É geralmente no pré-escolar que começam a surgir as maiores suspeitas, quando o contexto escolar começa a exigir que haja uma interação e socialização com outras crianças, e a criança apresenta uma dificuldade aparentemente inultrapassável em fazê-lo.

Geralmente, os pais começam por consultar um pediatra, que por sua vez encaminhada para um especialista para um diagnóstico mais preciso da síndrome de asperger.

O diagnóstico da síndrome de asperger passa sobretudo pela realização de provas de avaliação neuropsicológica. Nestas provas é possível observar vários aspetos do comportamento da criança, assim como avaliar o funcionamento cognitivo e domínios cognitivos como a atenção, a memória, entre outros.

O diagnóstico da síndrome de Asperger segue as recomendações dos manuais e protocolos de diagnóstico das perturbações mentais e do desenvolvimento. Atualmente é necessária a presença dos seguintes dois grupos diferentes de sintomas para que seja estabelecido o diagnóstico:

  • Apresentação de um padrão repetitivo e limitado de atitudes, comportamentos e interesses, o que se manifesta por atividades muito focadas, demasiado apego a determinadas rotinas e padrões, estereotipias, interesses muito específicos e por vezes incomuns e hipersensibilidade a determinados estímulos sensoriais;
  • Dificuldade ao nível da comunicação e interação social, que se manifestam em questões como dificuldade em iniciar e manter um diálogo, dificuldade em compreender as regras que regem as interações sociais, entre outras.

Qual o tratamento para a síndrome de Asperger?

O tratamento para a síndrome de Asperger deve ter em conta, primeiramente, possíveis comorbilidades neurológicas, psiquiátricas ou psicológicas. Em segundo lugar, deve dirigir-se não apenas à pessoa que sofre de síndrome de Asperger em particular e não intervir apenas de um ponto de vista clínico, mas também pedagógico, auxiliando na família e na escola.

O objetivo do tratamento na síndrome de Asperger é sempre o de otimizar o funcionamento e as capacidades da pessoa, e não tanto “curar” ou reverter os sintomas, já que estes são inatos e persistentes. Para isso, é muito importante que antes da intervenção, seja feita uma avaliação pormenorizada e compreensiva, onde se possam identificar potencialidades e limitações específicas da pessoa.

A avaliação traça um perfil, nomeadamente em termos de QI executivo e verbal, bem como a nível do desempenho em áreas como a memória, a atenção, o planeamento, entre outros. Esta avaliação e perfil deve também identificar as dificuldades que a criança ou jovem apresenta na escola, no mundo social e ao nível da comunicação, assim como as dificuldades que a sua rede familiar apresenta em lidar com a situação.

Dentro dos objetivos de intervenção na síndrome de Asperger, destacam-se os seguintes:

  • Melhorar a capacidade de comunicação e interação social (saber, por exemplo, como iniciar uma conversa, como abordar outras pessoas, compreender a importância de dar a vez, do contacto ocular, como fazer perguntas adequadas);
  • Aprender a lidar com a ansiedade e a frustração, evitando comportamentos disfuncionais;
  • Ser capaz de identificar e lidar com situações novas e imprevisíveis;
  • Desenvolver estratégias para a resolução de problemas do dia-a-dia;
  • Desenvolver autonomia;
  • Promover a capacidade crítica do seu desempenho;
  • Promover uma autoestima saudável.

A família deve ser sempre parte do processo de intervenção na síndrome de Asperger. A família deve tomar conhecimento dos pontos frágeis e das potencialidades da criança, de acordo com o perfil delineado na avaliação.

Para atingir os objetivos referidos, diferentes abordagens de intervenção podem ser utilizadas, tais como:

  • Treino de competências sociais;
  • Terapia da fala;
  • Educação especializada;
  • Integração sensorial e terapia ocupacional;
  • Terapia cognitiva e psicoterapia cognitivo-comportamental (geralmente para crianças mais velhas, adolescentes e jovens).

Importa referir que o tratamento para a síndrome de Asperger deve ser multidisciplinar, já que esta é uma síndrome que afeta diferentes domínios. Na equipa podem ser integrados profissionais como psicólogos, neuropsicólogos, terapeutas da fala, pediatras, psicopedagogos, terapeutas ocupacionais, entre outros. Tudo dependerá das necessidades individuais de cada criança.

O tratamento da síndrome de Asperger deve ser personalizado, pensado a longo prazo, já que esta é uma perturbação crónica e que aquilo que se pretende é ensinar competências e habilidades à criança e dotá-la dos recursos necessários para que possa ter uma maior funcionalidade, bem-estar e qualidade de vida.

Também pode ser necessário o recurso à medicação, não para tratar a síndrome de Asperger em si, mas algum dos seus sintomas e manifestações, como pode ser a irritabilidade, a ansiedade ou a depressão.

O que fazer perante suspeita desta síndrome?

Se as manifestações ou sinais apresentados por determinada criança o fazem suspeitar da presença de uma possível síndrome de Asperger, é fundamental procurar ajuda profissional.

Deve procurar um profissional da área da saúde mental ou um médico da área do desenvolvimento. Desta forma, a criança passará por um processo de avaliação que irá ajudar a determinar o diagnóstico e também a definir um perfil compreensivo das potencialidades e limitações da criança. Esta avaliação irá incluir uma recolha de informação rigorosa acerca do histórico dos sintomas, do desenvolvimento da criança, bem como outros aspetos do seu funcionamento e comportamento.

A principal ênfase neste processo de avaliação será o desenvolvimento social e as competências sociais da criança, incluindo problemas passados e presentes.

É importante encarar a situação com a maior tranquilidade possível e procurar a avaliação e consequente acompanhamento, se necessário, da forma mais breve possível. Uma avaliação e intervenção precoces serão fundamentais para garantir uma maior eficácia dos resultados.

Lidar com uma criança com síndrome de Asperger

Quando o diagnóstico é estabelecido e sabemos que estamos perante uma criança com síndrome de Asperger, o ideal é sempre seguir as orientações dos profissionais que a acompanham. Ainda assim, algumas dicas gerais podem ser úteis:

  • Procurar promover a autonomia da criança com síndrome de Asperger, proporcionando-lhe situações onde ela tenha de colocar em prática determinadas competências e, com a devida supervisão, tenha de lidar com situações novas;
  • Esclarecer pessoas que contactam com a criança, como por exemplo professores, do diagnóstico existente e articular com a escola no sentido de serem aplicadas medidas adequadas às necessidades individuais da criança;
  • Perceber que a criança, apesar de ter síndrome de Asperger, não é definida pela síndrome, e tem muitas outras características, assim como diversas competências e talentos, que não devem ser menosprezados. Deve ser dado espaço à criança para fazer coisas que ela gosta e nas quais é particularmente competente;
  • Procurar diversificar os focos de interesse da criança, apresentando-lhe materiais, brinquedos e temas variados, por forma a diminuir o seu comportamento repetitivo e restrito;
  • Não criticar nem menosprezar os interesses da criança, mas apresentar-lhe opções diversificadas;
  • Estimular na criança a capacidade de ela compreender diferentes estados emocionais e expressões faciais. Isto pode ser feito, por exemplo, com livros, histórias, desenhos animados, estimulando o diálogo e perguntando à criança, por exemplo, o que é que a personagem está a sentir;
  • Promover o diálogo e a comunicação com a criança;
  • Não assumir que a criança sabe exatamente como falar ou agir em determinada situação e, em vez disso, ensinar explicitamente algumas normas e regras que a maioria das pessoas capta de uma maneira intuitiva. Regras como, por exemplo, como cumprimentar, a importância de ceder a vez, etc;
  • Ter rotinas estruturadas e preparar ou avisar a criança quando existirem alterações de rotina, para ela se poder preparar com antecedência;
  • Permitir que a criança comece a participar em ambientes que a deixam mais desconfortável de uma forma gradual, isto é, começando por pequenos níveis de contacto e indo aumentando o grau de contacto com estes ambientes à medida que a criança vai ficando mais confortável;
  • Usar estímulos visuais para temas ou questões mais abstratas;
  • Usar frases simples, breves e diretas, que são mais fáceis para a criança perceber;
  • Dar comportamentos alternativos para que a criança diminua os movimentos repetitivos e estereotipias, por exemplo, segurar algo nas mãos;
  • Usar recompensas e reforços positivos para os progressos da criança;
  • Ensinar à criança estratégias de relaxamento;
  • Procurar o apoio e o suporte de grupos de pais, que passam pela mesma situação e cuja partilha de experiências pode ser muito importante;

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.