Todos nós já ouvimos falar da palavra “estereótipo” ao longo da nossa vida. Muitas vezes, é-nos apresentado de forma um pouco imprecisa, pelo que utilizamos esta palavra sem saber, ao certo, do que se trata.
Neste artigo, vamos compreender um pouco melhor em que consiste este conceito da psicologia social, passando por distingui-lo de outros aparentemente semelhantes.
O que é um estereótipo?
“Os portugueses são hospitaleiros”, “Os ingleses são snobs” – no nosso dia-a-dia, já ouvimos ou recorremos a expressões deste género. Facilmente nos apercebemos que correspondem a generalizações, atalhos mentais que nos ajudam a agrupar, neste caso, um conjunto de indivíduos com determinada nacionalidade e associá-los a uma determinada característica de personalidade. Daí corresponderem a uma forma de categorização social, isto é, divisão do mundo em categorias.
Existem diversas propostas de definição deste conceito, mas algumas das mais consensuais são “um conjunto de crenças partilhadas por várias pessoas acerca de um grupo social”, de acordo com Jones e outros investigadores ou “a organização psicológica do ambiente social em termos de grupos de pessoas consideradas idênticas ou equivalentes”, na perspetiva do autor Allport.
Qual a diferença entre estereótipo, preconceito e discriminação?
Como vimos, os estereótipos correspondem a crenças que fornecem uma imagem simplificada das características de um grupo ou membros de um grupo. A diferença mais relevante entre o conceito de estereótipo e o de preconceito é que, no primeiro, estas crenças podem ser positivas ou negativas, enquanto que, no segundo, são apenas negativas.
Deste modo, um exemplo de estereótipo positivo seria “Os japoneses são inteligentes”, tal como foi determinado num estudo levado a cabo por Katz e Braly em 1933, onde foram analisados diversos estereótipos culturais. No mesmo estudo, surgiram respostas como “Os turcos são cruéis”, “Os italianos são impulsivos” ou “Os judeus são avarentos”, o que corresponde a estereótipos negativos. E aqui podemos fazer a ponte para o conceito de preconceito: atitude que envolve um pré-juízo, um pré-julgamento, na maior parte das vezes negativo, relativamente a pessoas ou grupos sociais. O preconceito é, portanto, um pré-conceito: chegamos prontamente a conclusões sobre determinado grupo social sem que estejamos na posse de toda a informação.
Muitas vezes, a existência de preconceitos conduz à adoção de posições radicais contra grupos sociais. Enquanto falamos de preconceitos, referimo-nos apenas à sua componente atitudinal, isto é, “eu considero que o grupo social x é isto e aquilo, mas não vou fazer ativamente nada com esta informação”. Já quando esta atitude se traduz num comportamento, ou seja, quando passamos para uma expressão mais ativa de um preconceito, então passamos a falar de atos de discriminação.
Deste modo, a discriminação consiste num comportamento que decorre do preconceito. No limite, pode conduzir à eliminação física do objeto da discriminação. Na base da discriminação, está o preconceito que a fundamenta: racial, sexista, religioso, étnico, entre outros.
Infelizmente, temos vários exemplos práticos de estereótipos negativos que conduziram à consolidação de preconceitos que, por sua vez, levaram a atos discriminatórios com consequências chocantes, como é o caso do Holocausto.
Mas afinal, por que recorremos a estereótipos?
Se já nos apercebemos que muitos estereótipos, especialmente os negativos, conduziram a consequências negativas, por que recorremos a eles? A verdade é que, apreendidos ao longo de um processo de socialização, os estereótipos podem ajudar-
-nos a organizar o mundo. São heurísticas, isto é, atalhos cognitivos que passam a funcionar como quadros de referência, de forma a ajudar-nos a interpretar pessoas e acontecimentos que vão surgindo no quotidiano.
Somos, a todo o momento, bombardeados com quantidades colossais de informação: na rua, nas redes sociais, na televisão, etc. Não temos, mesmo que quiséssemos, capacidade cognitiva para processar toda a informação, pelo que temos de afunilar a informação que processamos. Neste processo de afunilamento, há muita informação relevante que se perde devido à nossa necessidade de a estreitarmos. Assim, muitas vezes, “não nos damos ao trabalho” de tentar perceber aprofundadamente as características de determinado grupo social, ou melhor, de cada um dos elementos desse grupo social – porque cada pessoa desempenha vários papéis sociais e, na definição de quem é, importa analisar outras formas de contextualização que não apenas o seu background cultural – e limitamo-nos a aceitar as informações que nos são veiculadas ou que decorrem da nossa própria história pessoal.
Concretizemos: uma pessoa pode até desenvolver ativamente sentido crítico e não aceitar prontamente estereótipos como “os negros são preguiçosos” (outro dos estereótipos obtidos no estudo de Katz e Braly, em 1933), por mais que os oiça ao longo da sua vida. Agora, o que é que muito provavelmente acontecerá se essa pessoa contratar, entre outros trabalhadores, duas pessoas negras que, ao longo da sua presença naquela empresa, mostrarem pouca capacidade de trabalho? Podem acontecer uma de duas coisas, sendo que a primeira é mais provável: a pessoa reativa o estereótipo com que foi socializada e volta a acreditar que “os negros são preguiçosos” com base na experiência direta com apenas duas pessoas daquela etnia ou, por outro lado, consegue manter o sentido crítico e compreende que o facto de aquelas duas pessoas serem de etnia negra e não mostrarem um bom trabalho não significa que todas as pessoas de etnia negra serão preguiçosas.
O efeito da primeira hipótese será, obviamente, tanto mais forte se a pessoa que contrata for de outra etnia que não a negra, visto que mais facilmente percecionará os negros como “exogrupo”, ou seja, que pertencem a outro grupo que não o dela. E nós, como seres humanos, tendemos a repelir tudo o que é diferente e a dividir o mundo entre “endogrupo” (o que nós somos) e “exogrupo” (o que os outros são).
Acima de tudo, o que é essencial é conseguirmos desenvolver e manter sentido crítico e estarmos dispostos a não aceitar apenas o que nos é dito, sem filtros. Desta forma, conseguiremos ver as pessoas além de categorias dicotómicas, “os bons” e “os maus”.
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