É bastante comum que as empresas possam ultrapassar situações de alguma dificuldade financeira (porque alguns clientes ainda não procederam ao pagamento dos serviços prestados ou porque houve uma quebra nas vendas, por exemplo).
Na maior parte das vezes, essas dificuldades facilmente se revertem e não apresentam grandes problemas para o normal funcionamento das empresas, no entanto, situações existem que as empresas acabam por incumprir algumas das suas obrigações – nomeadamente atrasando o pagamento a alguns fornecedores, a instituições bancárias ou até às finanças, entre outros.
A lei prevê um processo específico que possibilita que as empresas que se encontrem em situação económica difícil possam reagir e reverter a situação, de modo a regularizar os pagamentos em atraso e evitando assim o incumprimento definitivo das suas obrigações. Este processo é designado como processo especial de revitalização.
Neste artigo abordamos o processo especial de revitalização, comummente designado pelo acrónimo PER, procurando responder a algumas das perguntas mais frequentes sobre este tema, nomeadamente em que consiste e como funciona. Boa leitura!
O que é o processo especial de revitalização?
O processo especial de revitalização (PER) é um processo específico que a nossa lei prevê, destinado às empresas que se encontrem em situação económica difícil (ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação). É, assim, um processo que possibilita às empresas estabelecer negociações com os seus credores, de modo a que possa ser formalizado um acordo entre as partes que possibilite a revitalização da empresa, evitando assim a declaração de insolvência.
Este processo reveste de caracter urgente, pelo que é um processo bastante célere, de modo a salvaguardar os interesses tanto da empresa como dos credores.
Quem pode recorrer ao processo especial de revitalização?
A penas podem recorrer ao processo especial de revitalização as empresas. As empresas que pretendam recorrer ao PER devem comprovar que se encontram em situação económica difícil (ou seja, que apresentam sérias dificuldades em cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguirem aceder a linhas de crédito) ou em situação de insolvência eminente mas que ainda seja suscetível de recuperação (quando a empresa está a incumprir as suas obrigações mas ainda é possível recuperar dessa situação de dificuldade económica).
Assim sendo, se estivermos a falar de uma pessoa singular ou de uma pessoa colectiva que não seja uma sociedade comercial (como por exemplo associações humanitárias, entre outras), não poderão recorrer ao PER. Nestes casos, a lei prevê o processo especial de acordo de pagamentos, específico para as pessoas singulares e para as pessoas colectivas que não sejam empresas.
Para que serve o processo especial de revitalização?
O processo especial de revitalização (PER) tem como principal objetivo a realização de um acordo entre a empresa devedora e os seus credores, de modo a que possam ser reestruturadas as dívidas da empresa. A celebração de tal acordo pretende proteger a empresa que se encontra numa situação económica difícil, garantindo que a mesma possa manter a atividade e permitindo a revitalização da empresa (ou seja, que a mesma consiga ultrapassar a situação de crise que se encontra a ultrapassar).
O que é necessário para iniciar PER?
O processo especial de revitalização (PER) inicia-se com um requerimento apresentado em tribunal, sendo obrigatória a constituição de advogado. Tal requerimento deve estar acompanhado por vários documentos, nomeadamente:
- Uma declaração escrita e assinada pela empresa devedora e por, pelo menos, um credor (que seja titular 10% de créditos não subordinados), na qual as partes manifestam vontade de encetarem negociações conducentes à revitalização da empresa devedora;
- Proposta de plano de recuperação e descrição da situação patrimonial, financeira e creditícia da empresa;
- Lista de todos os credores, com a indicação do montante dos créditos, datas de vencimento e eventuais garantias que tais créditos beneficiem;
- Lista de todas as acções e execuções em curso contra a empresa devedora;
- Documento que explique a actividade à qual a empresa se tenha dedicado nos últimos três anos;
- Lista de bens (imóveis ou móveis sujeitos a registo) e direitos que a devedora seja proprietária ou detenha a título de arrendamento, aluguer ou locação financeira);
- Contas anuais relativas aos três últimos anos, assim como relatórios consolidados de gestão, contas anuais consolidadas e demais documentos que se configurem como relevantes;
- Lista de funcionários que exercem funções na empresa.
Como funciona o processo especial de revitalização?
Assim que o tribunal recebe o requerimento a dar início ao processo, procede de imediato com a nomeação do administrador judicial provisório. De seguida, a empresa deve comunicar a todos os seus credores (através de carta registada), o início a negociações para a sua revitalização, convidando-os a participar nas negociações em curso.
Os credores têm 20 dias para reclamar créditos, junto do administrador judicial provisório, que, posteriormente elabora uma lista de créditos, podendo os credores ou a empresa devedora impugnar essa lista, caso entenda que algum dos créditos se encontra indevidamente reconhecido.
Terminado o prazo de impugnação de créditos, inicia-se o prazo de negociações para a aprovação do plano de recuperação, que devem ser realizadas diretamente entre as partes (devedor e credores, com o auxílio do administrador judicial provisório). O período de negociações tem a duração de 60 dias, podendo ser prorrogado, por uma só vez, pelo período de um mês.
Quais os efeitos do processo especial de revitalização?
Assim que é nomeado o administrador judicial provisório e enquanto decorre o período de negociação, o processo especial de revitalização (PER) produz um conjunto de efeitos na esfera jurídica da empresa devedora, nomeadamente:
- Os credores ficam impedidos de dar entrada de ações para cobrança de dívidas contra a empresa devedora.
- Quaisquer ações para cobrança de divida que se encontrem pendentes ficam suspensas, devendo ser extintas com a aprovação e homologação do plano de recuperação.
- Caso tenha sido requerida a insolvência da empresa, o processo suspende-se, devendo ser extinto com a aprovação e homologação do plano de recuperação.
- Suspendem-se todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pela empresa.
- Não pode ser suspensa a prestação de serviços públicos essenciais (como o fornecimento de água, energia elétrica, comunicações eletrónicas, entre outros).
- A empresa devedora carece de autorização do administrador judicial provisório para a prática de atos de especial relevo, como por exemplo:
- Vender a empresa ou estabelecimentos;
- Vender bens necessários à continuação da exploração da empresa;
- Adquirir imóveis;
- Celebrar novos contratos de execução duradoura;
- Assumir obrigações de terceiros e constituir garantias.
O que acontece quando há acordo?
Quando as partes chegam a acordo, empresa devedora deve apresentar ao tribunal o plano de recuperação até ao último dia do prazo das negociações, devendo o tribunal apreciar o mesmo e decidir se aprova ou não o plano. Para que o plano de recuperação possa ser aprovado é necessário que os credores votem favoravelmente.
A decisão do juiz vincula a empresa e os credores (mesmo que não tenham reclamado créditos ou participado nas negociações, desde que os créditos sejam anteriores à data em que foi proferida a decisão de nomeação do administrador judicial).
O que acontece quando não há acordo?
Caso o devedor e os credores não consigam alcançar acordo (ou caso seja ultrapassado o prazo de negociações sem que seja apresentado um plano) o processo negocial é encerrado. Se a empresa devedora ainda não se encontrar em situação de insolvência, o encerramento do processo especial de revitalização apenas determina a extinção de todos os seus efeitos.
Caso se entenda que a empresa já se encontra em situação de insolvência, o encerramento do processo especial de revitalização (PER) determina a declaração de insolvência da empresa devedora.
– artigo redigido por um jurista com base no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (Decreto-Lei n.º 53/2004)
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