Isenção de horário de trabalho: quais os direitos e deveres?

isenção de horário de trabalho

Antes de mais, é importante referir que a legislação do trabalho estabelece que o horário de trabalho consiste no período temporal compreendido entre a hora de início e a hora de fim do período normal de trabalho diário. O horário de trabalho inclui o intervalo de descanso e o período de descanso semanal. Regra geral, o período normal de trabalho não pode ultrapassar as 8 horas diárias e as 40 horas semanais.

A generalidade dos trabalhadores do setor privado e da função pública tem um horário de trabalho definido – sempre com a mesma hora de início e fim. Todavia, há um conjunto de trabalhadores que, pela natureza das funções que exerce, está isenta de horário de trabalho.

Neste artigo, abordamos o regime da isenção de horário de trabalho, procurando dar resposta às perguntas mais frequentes sobre este tema, nomeadamente em que consiste, como se processa o acesso a este regime e quais as suas particularidades. Boa leitura!

O que é a isenção de horário de trabalho?

Referir que a isenção de horário de trabalho encontra-se regulada no Código do Trabalho (trabalhadores do setor privado) e na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (funcionários públicos). A isenção de horário é uma modalidade de flexibilização do tempo de trabalho e não é o mesmo que o regime do horário flexível, que abordamos noutro artigo.

Mas afinal o que é a isenção de horário? A isenção de horário de trabalho é uma “ferramenta” que a lei coloca à disposição da entidade patronal e do trabalhador, permitindo que os trabalhadores não estejam sujeitos a um horário de trabalho predeterminado.

Isenção de horário de trabalho no privado

isenção de horário dos trabalhadores do setor privado
Alguns trabalhadores podem estar isentos de horário de trabalho

A legislação do trabalho estabelece que, mediante acordo escrito, entre o trabalhador e a entidade empregadora, podem ser isentos de horário os trabalhadores que se encontrem numa das seguintes situações:

  • Trabalhadores que exerçam cargos de administração ou direção, bem como trabalhadores com funções de confiança ou fiscalização;
  • Trabalhadores de apoio a cargos de administração ou direção (secretariado, por exemplo);
  • Execução de trabalhos preparatórios ou complementares, que só possam ser realizados fora dos limites do horário de trabalho;
  • Trabalhadores em regime de teletrabalho;
  • Trabalhadores que regularmente prestem atividade fora do estabelecimento (escritórios) da entidade patronal.

No caso de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (acordos entre a organização sindical de um determinado setor e as entidades patronais ou associações que as representem) podem ser estabelecidas outras situações em que é admissível a isenção de horário de trabalho.

Quais as modalidades de isenção de horário?

Listamos as várias modalidades de isenção de horário:

  • Isenção total – quando o trabalhador não está sujeito aos limites máximos do período normal de trabalho (8 horas diárias e 40 horas semanais);
  • Isenção parcial ou limitada – possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana;
  • Isenção modelada ou relativa – observância do período normal de trabalho acordado.

A isenção de horário retira a obrigação de “picar o ponto”?

Não. Estar sob esta isenção implica manter o registo dos tempos de trabalho, ou seja, o registo das entradas e saídas. Este registo permite guardar a indicação das horas de início e de fim do tempo de trabalho, por forma a possibilitar apurar-se o número de horas de trabalho prestadas por trabalhador sujeito à isenção, diária e semanalmente.

Assim, a isenção de horário não implica que o trabalhador que beneficie dela acabe por trabalhar menos horas, apenas permite flexibilidade no uso do tempo de trabalho.

A isenção de horário retira o direito ao descanso?

Não. A isenção de horário não invalida o direito do trabalhador ao dia de descanso, obrigatório ou complementar, a feriado ou a descanso diário. Não sendo respeitado o direito de descanso pela entidade empregadora, esta incorre em contraordenação grave.

Também ao nível diário e semanal, a isenção de horário obedece a certos limites: o alargamento da prestação de trabalho não pode, regra geral, ser superior a duas horas por dia ou dez por semana.

A legislação determina ainda que, em caso de acordo de horário de trabalho que limite a prestação de trabalho a um determinado período de tempo (diário ou semanal), todo o trabalho que excede o período estipulado é considerado trabalho suplementar.

O trabalhador com isenção de horário ganha mais?

Sim. O trabalhador com isenção de horário tem direito a um complemento remuneratório, podendo este ser estabelecido por instrumento de regulamentação coletiva (acordos entre a organização sindical de um determinado setor e as entidades patronais ou associações que as representem).

A legislação do trabalho determina que o complemento remuneratório pela isenção de horário de trabalho não pode ser inferior a:

  • Uma hora de trabalho suplementar por dia;
  • Duas horas de trabalho suplementar por semana, quando se trate de regime de isenção de horário com observância do período normal de trabalho.

A lei estabelece ainda que o trabalhador que desempenhe cargos de direção ou de administração pode renunciar ao acréscimo remuneratório pela isenção de horário.

Minuta de acordo de isenção de horário

ACORDO DE ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO

Entre:

(nome do empregador), pessoa colectiva nº (XXXXX), com sede na (morada completa), representada por (nome do representante legal), adiante designada por primeira contraente ou empregador;

e

(nome completo do trabalhador), (estado civil), (profissão), residente na (morada completa), titular do cartão de cidadão nº (XXXXX), válido até (XX/XX/XXXX), contribuinte fiscal nº(XXXXX), adiante designado por segundo contraente ou trabalhador.

É acordada, de boa fé, a isenção de horário, com as seguintes cláusulas:

Cláusula 1.ª
(Funções)

O segundo contraente vem exercendo o cargo de (nome do cargo) desde o dia (XX/XX/XXXX).

Cláusula 2.ª
(Modalidade)

O segundo contraente não ficará sujeito aos limites máximos do período normal de trabalho enquanto se mantiver no exercício das funções de direção.

Cláusula 3.ª
(Descanso, feriados e férias)

A presente isenção de horário de trabalho não poderá prejudicar o direito do segundo contraente ao descanso diário e semanal nem os feriados e férias.

Cláusula 4.ª
(Retribuição específica)

A primeira contraente pagará ao segundo contraente a retribuição específica de (XXX€) pela presente isenção de horário de trabalho.

Feito em duplicado, ficando cada um dos contraentes na posse de um exemplar.

(localidade)(dia) de (mês) de (ano)

______________________
Primeira Contraente

______________________
Segundo Contraente

Isenção de horário dos funcionários públicos

isenção de horário dos funcionários públicos
Alguns funcionários do setor público também podem estar isentos de horário de trabalho

A isenção de horário de trabalho não é exclusiva aos trabalhadores do setor privado, podendo ser aplicada a alguns funcionários públicos (trabalhadores com vínculo de emprego público). No caso dos funcionários públicos, o diploma legal aplicável é a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 35/2014).

Que funcionários públicos estão sujeitos à isenção de horário?

A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas estabelece que os trabalhadores titulares de cargos dirigentes (cargos de direção, gestão, coordenação e controlo dos serviços e organismos públicos) e que chefiem equipas multidisciplinares gozam de isenção de horário, nos termos dos respetivos estatutos.

De acordo com a Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), são considerados cargos dirigentes:

Direção superior de 1.º grau Direção superior de 2.º grauDireção intermédia
Diretor-GeralSubdiretor-GeralDiretor de serviços – 1.º grau
Secretário-GeralSecretário-Geral-adjuntoChefe de divisão – 2.º grau
Inspetor-GeralSubinspetor-GeralOutros 3.º grau ou inferior
PresidenteVice-Presidente
Cargos dirigentes da função pública – DGAEP

Mediante acordo escrito com o empregador público, podem ainda ser sujeitos a isenção de horário de trabalho outros trabalhadores com vínculo de emprego público, desde que a isenção seja admitida pela legislação ou por instrumento de regulamentação coletiva do trabalho (acordo entre a organização sindical de um determinado setor e as entidades patronais do mesmo setor de atividade).

Referir, ainda, que a isenção de horário não dispensa a observância do dever geral de assiduidade, nem o cumprimento da duração semanal de trabalho legalmente estabelecida (35 horas para a generalidade dos funcionários públicos).

Quais as modalidades da isenção de horário no público?

  • Isenção total – quando o trabalhador não está sujeito aos limites máximos do período normal de trabalho (7 horas diárias e 35 horas semanais);
  • Isenção parcial ou limitada – possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana;
  • Isenção modelada ou relativa – observância do período normal de trabalho acordado.

A legislação estabelece que os funcionários públicos titulares de cargos dirigentes (cargos de direção, gestão, coordenação e controlo dos serviços e organismos públicos) não estão sujeitos aos limites máximos do período normal de trabalho (7 horas por dia e as 35 por semana).

No caso dos restantes trabalhadores, com vínculo de emprego público, que gozam de isenção de horário, a escolha da modalidade de isenção de horário de trabalho obedece ao disposto na lei ou em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

Na falta destas ou de estipulação entre o funcionário e o empregador públicos, a isenção de horário é parcial ou limitada, isto é, existe a possibilidade de um aumento do período normal de trabalho por dia ou semana, mas nunca superior às 2 horas diárias e às 10 horas semanais.

Os funcionários públicos isentos de horário mantém o direito ao descanso?

Regra geral, a isenção de horário de trabalho não pode prejudicar o direito aos dias de descanso semanal obrigatório, aos feriados obrigatórios e aos dias e meios dias de descanso complementar, nem ao descanso diário de 11 horas consecutivas entre dois períodos diários de trabalho consecutivos.

Excetuam-se os casos dos trabalhadores dirigentes que chefiem equipas multidisciplinares e os casos em que seja necessária a prestação de trabalho suplementar por motivo de força maior (por exemplo: prevenir ou reparar prejuízos graves para o serviço devidos a acidente – ou risco de). Nestes casos, deve ser observado um período de descanso que permita a recuperação do trabalhador entre dois períodos diários de trabalho consecutivos.

Os funcionários públicos com isenção de horário recebem mais?

A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas estabelece que têm direito a suplemento remuneratório os funcionários públicos que gozam de isenção de horário nas seguintes modalidades:

  • Isenção total – quando o trabalhador não está sujeito aos limites máximos do período normal de trabalho (7 horas diárias e 35 horas semanais);
  • Isenção parcial ou limitada – possibilidade de determinado aumento do período normal de trabalho, por dia ou por semana;

O direito a suplemento remuneratório pela isenção de horário não se aplica a carreiras especiais e cargos em que o regime de isenção de horário de trabalho constitua o regime normal de prestação do trabalho.

– artigo redigido por um licenciado em Direito com base nos artigos 218.º e 219.º do Código do Trabalho (Lei n.º 7/2009) e artigos 117.º a 119.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 35/2014)

Susana Lima

Sempre com a missão de informar e ajudar as pessoas nesta área tão complicada, licenciou-se em Direito pela Universidade do Porto e abriu um escritório próprio como advogada, acreditando ser um pequeno peso que equilibra mais os pratos da balança da justiça.

1 comment

  • Bom dia, trabalhei na anacom, em isencao de horário mais de 15 anos.
    Agora estou reformado desde 2020,
    Tenho direito a receber mais alguma percentagem na aposentação do que em relação ao vencimento que recebia.
    Trabalhei cerca de 37 anos sempre a descontar para a cga.
    Obrigado João Nunes