Venda de bens alheios: o que é, validade e consequências

Venda de bens alheios

A venda de bens alheios é uma situação que pode ocorrer especialmente no âmbito de contratos de compra e venda entre particulares. Com a facilidade e consequente aumento deste tipo de compras e vendas, a possibilidade de ocorrência destas situações aumentou também.

Neste âmbito, a nossa lei protege em especial o comprador de boa-fé e, neste artigo, damos-lhe a conhecer quais são os seus direitos e opções caso se veja perante esta situação. Boa leitura!

O que é a venda de bens alheios?

A venda de bens alheios consiste na venda de bens realizada por quem careça de legitimidade para a realizar, por não ser proprietário dos bens em questão nem ter autorização do proprietário para esse fim, e, ainda assim, os vender como se de bens próprios se tratassem.

A venda de bens alheios é válida?

A venda de bens alheios é, por princípio, nula e, portanto, não é válida, não sendo transferida a propriedade para o comprador. No entanto, é preciso ter em atenção as seguintes exceções:

  • o vendedor de bens alheios não pode opor a nulidade a um comprador de boa-fé, isto é, um comprador que acreditava que os bens pertenciam ao vendedor ou que tinha legitimidade para os vender;
  • um comprador doloso, ou seja, que conhecesse a situação de venda de bens alheios, não poderá depois opor a nulidade a um vendedor de boa-fé;
  • quando os bens ainda não são propriedade do vendedor, mas há acordo para que o venham a ser (por exemplo, quando exista um contrato de promessa de compra e venda entre o proprietário e o vendedor). Neste caso, a venda poderá realizar-se considerando vendedor e comprador os bens objeto da venda com a qualidade de bens futuros.

Quais as consequências da venda de bens alheios?

Sendo a venda de bens alheios nula, o comprador de boa-fé tem o direito de exigir a restituição do preço que pagou. E isto mesmo que os bens:

  • se tenham perdido;
  • estejam deteriorados; ou
  • tenham diminuído de valor por qualquer outra causa.

Por outro lado, nas situações em que um dos contraentes tiver procedido de boa-fé e outro dolosamente, o primeiro tem direito a ser indemnizado de todos os prejuízos que não teria sofrido se o contrato fosse válido desde o começo, ou não houvesse sido celebrado.

O vendedor é sempre obrigado a indemnizar o comprador de boa-fé, ainda que tenha agido sem dolo nem culpa, mas, neste caso, a indemnização compreende apenas os danos emergentes que não resultem de despesas voluptuárias.

Ressalve-se ainda que, se o comprador tiver tirado proveito da perda ou diminuição de valor dos bens, esse proveito tem de ser abatido no montante do preço e da indemnização que o vendedor lhe deva pagar.

Há forma de validar a venda de bens alheios?

Sim, existe a convalidação do contrato de compra e venda de bens alheios e a consequente transmissão da propriedade ou direito para o comprador no caso de o vendedor adquirir por algum modo a propriedade da coisa ou do direito vendido.

Esta convalidação é mesmo obrigação do vendedor, de forma a sanar a nulidade da venda de bens alheios, quando o comprador esteja de boa-fé. Se o vendedor for responsável pelo não cumprimento da obrigação de sanar a nulidade da venda ou pela mora no seu cumprimento, a respetiva indemnização acresce à que referimos acima, pela venda de bens alheios, exceto na parte em que o prejuízo seja comum.

No caso de indemnização pela venda de bens alheios dolosa, o comprador escolherá entre a indemnização dos lucros cessantes (aquilo que ele deixou de ganhar) pela celebração do contrato nulo e a dos lucros cessantes pela falta ou retardamento da convalidação.

Não existirá convalidação, no entanto, nos seguintes casos:

  • pedido judicial de declaração de nulidade do contrato, formulado por um dos contraentes, desde que esteja de boa-fé, contra o outro;
  • restituição do preço ou pagamento de indemnização, no todo ou em parte, com aceitação do credor;
  • transação entre os contraentes, na qual se reconheça a nulidade do contrato;
  • declaração escrita, feita por um dos estipulantes, desde que esteja de boa-fé, ao outro, de que não quer que o contrato deixe de ser declarado nulo.

E se o comprador, entretanto, tiver realizado benfeitorias?

Caso o comprador de boa-fé tenha realizado benfeitorias (obras de melhoria) nos bens alheios vendidos, o vendedor e o proprietário devem pagar solidariamente (ou seja, se um não pagar, paga o outro) o reembolso dessas benfeitorias ao comprador.

E caso o contrato for só parcialmente nulo?

Pode acontecer o caso de a venda ser só parcialmente nula porque os bens objeto da mesma são também só parcialmente alheios. O que acontece neste caso é que o contrato é nulo só na parte que respeita à parte alheia, sendo válida no resto, reduzindo-se proporcionalmente o preço.

– artigo redigido com base no Código Civil (Decreto-Lei n.º 47344).

Susana Lima

Sempre com a missão de informar e ajudar as pessoas nesta área tão complicada, licenciou-se em Direito pela Universidade do Porto e abriu um escritório próprio como advogada, acreditando ser um pequeno peso que equilibra mais os pratos da balança da justiça.