Direito de livre resolução: o que é, prazo e obrigações

Direito de livre resolução do contrato

O direito de livre resolução do contrato resulta de transposição de uma diretiva europeia e da necessidade de proteger os consumidores relativamente aos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial, como por exemplo as vendas porta-a-porta, ou celebrados à distância, nomeadamente por correspondência ou através da internet.

Neste artigo, damos-lhe a conhecer tudo o que precisa de saber sobre este direito, nomeadamente o modo e prazo do seu exercício, bem como as obrigações que dele decorrem. Boa leitura!

O que é o direito de livre resolução?

O direito de livre resolução do contrato consiste na possibilidade de, em determinado prazo, o consumidor resolver/terminar um contrato de compra e venda de bens ou um contrato de prestação de serviços sem apresentar motivo e sem quaisquer custos.

Este direito existe no âmbito dos contratos celebrados à distância ou contratos celebrados fora do estabelecimento comercial.

Qual o prazo para exercer este direito?

O direito de livre resolução do contrato pode ser exercido no prazo de:

  • 14 dias; ou
  • 30 dias no caso de contratos celebrados no domicílio do consumidor ou durante uma deslocação organizada pelo fornecedor de bens ou prestador de serviços ou por seu representante ou mandatário, fora do respetivo estabelecimento comercial.

Estes prazos podem ser alargados por acordo entre as partes. Pode ainda ser alargado em 12 meses se o fornecedor de bens ou prestador de serviços não facultar determinada informação abrangida pelo dever de informação pré-contratual, que explicamos mais à frente.

A partir de que momento é contado o prazo?

O prazo para o exercício do direito de livre resolução do contrato conta-se a partir:

  • Do dia da celebração do contrato – no caso dos contratos de prestação de serviços;
  • Do dia em que o consumidor ou um terceiro, com exceção do transportador, indicado pelo consumidor adquira a posse física dos bens, no caso dos contratos de compra e venda, ou:
    • Do dia em que o consumidor ou um terceiro, com exceção do transportador, indicado pelo consumidor adquira a posse física do último bem, no caso de vários bens encomendados pelo consumidor numa única encomenda e entregues separadamente;
    • Do dia em que o consumidor ou um terceiro, com exceção do transportador, indicado pelo consumidor adquira a posse física do último lote ou elemento, no caso da entrega de um bem que consista em diversos lotes ou elementos;
    • Do dia em que o consumidor ou um terceiro por ele indicado, que não seja o transportador, adquira a posse física do primeiro bem, no caso dos contratos de entrega periódica de bens durante um determinado período;
  • Do dia da celebração do contrato, no caso dos contratos de fornecimento de água, gás ou eletricidade, que não estejam à venda em volume ou quantidade limitados, de aquecimento urbano ou de conteúdos digitais que não sejam fornecidos num suporte material.

O prazo de 12 meses conta-se a partir da data do termo do prazo inicial de 14 ou 30 dias.

Em que consiste o dever de informação pré-contratual?

Como vimos, caso determinada informação abrangida pelo dever de informação pré-contratual não seja prestada pelo fornecedor de bens ou prestador de serviços, o prazo para o exercício do direito de livre resolução do contrato é alargado em 12 meses.

O dever de informação pré-contratual consiste na obrigação do fornecedor de bens ou prestador de serviços, em momento anterior à vinculação do consumidor a um contrato celebrado à distância ou fora do estabelecimento comercial ou a proposta correspondente, facultar, em tempo útil e de forma clara e compreensível, determinadas informações sobre o contrato.

De entre essas várias informações, a que se revela determinante para o alargamento do prazo para o exercício do direito de livre resolução do contrato é a informação de que o preço foi personalizado com base numa decisão automatizada. Informação que, naturalmente, só deverá ser prestada quando se aplique ao caso concreto.

E se informações em falta forem prestadas no decorrer do prazo?

A lei prevê ainda novos prazos para o exercício do direito de livre resolução do contrato para os casos em que o fornecedor de bens ou prestador de serviços preste informações abrangidas pelo dever de informação pré-contratual durante o prazo de 12 meses:

  • No caso de ser prestada a informação de que o consumidor suporta os custos da devolução dos bens em caso de exercício do direito de livre resolução e o montante desses custos, se os bens, pela sua natureza, não puderem ser devolvidos normalmente pelo correio normal – o consumidor dispõe de 14 dias a partir da data da receção dessa informação para exercer o direito de livre resolução do contrato;
  • No caso dos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial, celebrados no domicílio do consumidor ou celebrados durante uma deslocação organizada pelo fornecedor de bens ou prestador de serviços ou por seu representante ou mandatário, fora do respetivo estabelecimento comercial – o consumidor dispõe de 30 dias a partir da data da receção dessa informação para exercer o direito de livre resolução do contrato.

E se os serviços forem prestados durante o prazo?

Se estivermos perante o caso de um contrato de prestação de serviços e o consumidor pretenda que a prestação dos serviços se inicie durante o prazo em que pode ser exercido o direito de livre resolução do contrato, o prestador de serviços deve exigir que o consumidor apresente um pedido expresso através de suporte duradouro.

Se, ainda assim, o consumidor vier a exercer o direito de livre resolução do contrato, então terá de pagar o montante proporcional ao que for efetivamente prestado.

Como se exerce o direito de livre resolução?

O direito de livre resolução do contrato pode ser exercido através de:

  • Envio do modelo de “livre resolução” constante da parte B do anexo ao Decreto-Lei n.º 24/2014; ou
  • Qualquer outra declaração inequívoca de resolução do contrato – isto é, a comunicação feita pelo consumidor, por palavras suas, da decisão de resolver o contrato, designadamente por carta, contacto telefónico, devolução do bem ou outro meio suscetível de prova.

E se a carta chegar depois de terminado o prazo?

Mesmo que a comunicação de livre resolução chegue às mãos do fornecedor de bens ou prestador de serviços após o termo do prazo para o exercício do direito de livre resolução do contrato, considera-se cumprido o prazo se a comunicação foi enviada antes do termo do prazo.

Caso, no sítio na Internet do fornecedor de bens ou prestador de serviços, seja possibilitada a livre resolução por via eletrónica e o consumidor utilize essa via, o fornecedor de bens ou prestador de serviços, acusa, no prazo de 24 horas, ao consumidor a receção da declaração de resolução em suporte duradouro.

Quais as consequências da livre resolução?

O exercício do direito de livre resolução do contrato tem por consequência a extinção das obrigações de execução do contrato e toda a eficácia da proposta contratual, quando o consumidor tenha feito tal proposta.

Por outro lado, não podem existir custos associados ao exercício desse direito, sendo nulas as cláusulas contratuais que imponham ao consumidor uma penalização pelo exercício do direito de livre resolução ou estabeleçam a renúncia ao mesmo.

Quais as obrigações do fornecedor ou prestador?

Pelo exercício do direito de livre resolução do contrato por parte do consumidor, o fornecedor de bens ou prestador de serviços, no prazo de 14 dias a contar da data em que foi informado da livre resolução, deve reembolsar o consumidor de todos os pagamentos recebidos, incluindo os custos de entrega do bem.

O reembolso dos pagamentos deve ser feito através do mesmo meio de pagamento que tiver sido utilizado pelo consumidor na transação inicial, salvo acordo expresso em contrário e desde que o consumidor não incorra em quaisquer custos como consequência do reembolso.

E se o fornecedor não proceder ao reembolso?

Antes de mais, diga-se que o fornecedor do bem não é obrigado a reembolsar os custos adicionais de entrega quando o consumidor solicitar, expressamente, uma modalidade de entrega diferente e mais onerosa do que a modalidade comummente aceite e menos onerosa proposta pelo fornecedor do bem.

Por outro lado, é permitido que o fornecedor retenha o reembolso enquanto os bens não forem recebidos ou enquanto o consumidor não apresentar prova da devolução do bem, exceto se o fornecedor se oferecer para recolher ele próprio o bem.

Fora dessas situações, o incumprimento da obrigação de reembolso dentro do prazo previsto, obriga o fornecedor de bens ou prestador de serviços a devolver em dobro, no prazo de 15 dias úteis, os montantes pagos pelo consumidor, sem prejuízo do direito do consumidor a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.

Quais as obrigações do consumidor?

Se o fornecedor de bens não se oferecer para recolher ele próprio o bem, o consumidor deve, no prazo de 14 dias a contar da data em que tiver comunicado a sua decisão de resolução do contrato, devolver ou entregar o bem ao fornecedor de bens ou a uma pessoa autorizada para o efeito.

Incumbe ao consumidor suportar o custo da devolução do bem, exceto nos seguintes casos:

  • Quando o fornecedor acordar em suportar esse custo; ou
  • Quando o consumidor não tiver sido previamente informado pelo fornecedor do bem que tem o dever de pagar os custos de devolução.

Quando o bem entregue no domicílio do consumidor no momento da celebração do contrato não puder, pela sua natureza ou dimensão, ser devolvido por correio, incumbe ao fornecedor recolher o bem e suportar o respetivo custo.

– artigo redigido com base no Decreto-lei n.º 24/2014

Susana Lima

Sempre com a missão de informar e ajudar as pessoas nesta área tão complicada, licenciou-se em Direito pela Universidade do Porto e abriu um escritório próprio como advogada, acreditando ser um pequeno peso que equilibra mais os pratos da balança da justiça.