A liberdade condicional é um incidente da execução das penas de prisão, que suscita opiniões opostas, tanto por parte de cidadãos comuns, como por parte de juristas. A verdade é que a liberdade condicional surgiu, por influência francesa, em reação ao aumento significativo da reincidência (praticar crimes novamente), verificada no segundo quartel do século XIX.
Chegou-se à conclusão que a reclusão do delinquente, por efeito da prisão, provocava um enfraquecimento do sentido de orientação social, que precisava de ser restabelecido antes de ele voltar a viver livremente em sociedade. Assim surgiu o instituto da liberdade condicional: um período de transição entre a prisão e a liberdade.
Neste artigo, pretendemos dar-lhe a conhecer tudo o que precisa de saber sobre a liberdade condicional. Boa leitura!
O que é a liberdade condicional?
A liberdade condicional consiste numa antecipação da liberdade de um condenado a pena de prisão, concedida mediante o preenchimento de determinados pressupostos legais, os quais veremos em seguida.
Quando pode ser concedida?
A liberdade condicional pode ser concedida quando esteja cumprida:
- Metade da pena de prisão e no mínimo 6 meses;
- Dois terços da pena de prisão e no mínimo 6 meses; ou
- Cinco sextos da pena de prisão, no caso da pena ser superior a 6 anos.
A liberdade condicional pode ainda ser antecipada pelo Tribunal por um período máximo de 1 ano, ficando o recluso em prisão domiciliária com pulseira eletrónica.
Quais os pressupostos para ser concedida?
Os pressupostos para a concessão da liberdade condicional dependem do tempo de cumprimento da pena de prisão. Assim:
- Caso estejam cumpridos cinco sextos da pena de prisão, no caso da pena ser superior a 6 anos, apenas é necessário o consentimento do recluso para que a liberdade condicional seja concedida;
- Caso estejam cumpridos dois terços da pena, além do consentimento do recluso, é necessário que seja expectável que o recluso conduzirá a sua vida de forma socialmente responsável, sem cometer crimes – avaliação que se faz tomando em conta:
- As circunstâncias do caso;
- A vida anterior do recluso;
- A personalidade do recluso;
- O bom comportamento do recluso.
- Caso esteja cumprida metade da pena, além do consentimento do recluso e da avaliação do recluso, será necessário que a sua liberdade seja compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
Qual a duração da liberdade condicional?
A liberdade condicional tem a duração do tempo de prisão que falta cumprir e até ao limite máximo de 5 anos. Por esse motivo é que, por vezes, não é cumprido todo o tempo de prisão (mesmo em liberdade condicional) a que se é condenado: o tempo excedente da pena considera-se extinto. Concretizando num exemplo: um arguido é condenado a 11 anos de prisão. Cumprida metade da pena (5 anos e 6 meses), é-lhe concedida liberdade condicional. Como só pode durar 5 anos (e não 5 anos e 6 meses), os 6 meses remanescentes de pena de prisão consideram-se extintos. Isto, claro, a menos que, entretanto, a liberdade condicional seja revogada, o que veremos mais à frente.
Quais os tipos de liberdade condicional?
A liberdade condicional pode ser:
- Simples: estando o recluso simplesmente obrigado a adotar uma conduta socialmente responsável, não cometendo novos crimes;
- Subordinada ao cumprimento de regras de conduta: estando o recluso sujeito, além de a um bom comportamento, ao cumprimento de determinadas regras de conduta, ou seja, certos comportamentos que deve adotar e certas proibições – a título de exemplo:
- Residir em determinado lugar;
- Frequentar certos programas ou atividades;
- Cumprir determinadas obrigações;
- Não exercer determinada profissão;
- Não frequentar certos meios ou lugares;
- Não residir em certos lugares ou regiões;
- Não acompanhar, alojar ou receber determinadas pessoas;
- Não frequentar certas associações ou não participar em determinadas reuniões;
- Não ter em seu poder objetos capazes de facilitar a prática de crimes;
- Com o consentimento prévio do condenado, a sujeição a tratamento médico ou cura em instituição adequada.
- Com regime de prova: este caso aplica-se quando o tribunal considere conveniente e adequado promover a reintegração do condenado na sociedade, estando o recluso sujeito, além do bom comportamento e cumprimento de regras de conduta, a um plano de reinserção social, dado a conhecer sempre ao condenado e, sempre que possível, com o seu acordo prévio. Este plano é executado com vigilância e apoio dos serviços de reinserção social, durante o período da liberdade condicional, e deve conter:
- Os objetivos de ressocialização a atingir pelo condenado;
- As atividades a desenvolver pelo condenado;
- O faseamento dessas atividades a desenvolver pelo condenado;
- As medidas de apoio e vigilância a adotar pelos serviços de reinserção social.
As regras de conduta podem ser modificadas?
Sim. Quando ocorram circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só teve conhecimento posteriormente, e até ao fim do período de liberdade condicional, o tribunal pode modificar as regras de conduta aplicadas. Estas regras de conduta têm sempre de ser obrigações cujo cumprimento seja razoável exigir e esse cumprimento pode ser apoiado e fiscalizado pelos serviços de reinserção social, se o tribunal assim o determinar.
Como se inicia o processo?
O processo de concessão (ou não) da liberdade condicional inicia-se com uma fase de instrução, em que o juiz do tribunal de execução de penas, 90 dias antes da data admissível para a liberdade condicional, solicita:
- Aos serviços prisionais, um relatório que contém a avaliação:
- Da evolução da personalidade do recluso;
- Das competências adquiridas;
- Do comportamento prisional;
- Da relação do recluso com o crime cometido.
- Aos serviços de reinserção social, um relatório que contém a avaliação:
- Das necessidades subsistentes de reinserção social;
- Das perspetivas de enquadramento familiar, social e profissional do recluso;
- Das condições a que deve estar sujeita a concessão da liberdade condicional, ponderada a necessidade de proteção da vítima.
O que acontece após a apresentação dos relatórios?
Após a apresentação dos relatórios, e até 60 dias antes da data admissível para a liberdade condicional, o juiz profere despacho em que convoca uma reunião do conselho técnico para um dos 20 dias seguintes, a qual será seguida da audição do recluso. Este despacho é comunicado ao estabelecimento prisional e aos serviços de reinserção social e notificado ao Ministério Público, ao recluso e ao seu defensor (caso exista).
E após a audição do recluso?
Após a audição do recluso, o Ministério Público emite parecer, no prazo de 5 dias, quanto à concessão da liberdade condicional e às condições a que deva ficar sujeita. Sendo concedida, o juiz determina a data do fim da liberdade condicional, fixa as condições a que fica sujeita e aprova o plano de reinserção social (caso fique sujeito a regime de prova). A decisão do juiz é notificada ao recluso, ao defensor (se existir) e ao Ministério Público.
Pode-se recorrer da decisão de não concessão?
Sim. Da decisão de não concessão da liberdade condicional podem recorrer o recluso e o Ministério Público. O Ministério Público pode recorrer também da decisão de concessão da liberdade condicional. Depois da decisão não ser mais suscetível de recurso, é comunicada aos serviços prisionais e de reinserção social.
Caso a liberdade condicional seja concedida, devem também ser notificados os demais serviços ou entidades que devam intervir na execução da liberdade condicional e os serviços de identidade criminal.
Se não for concedida, tenho outra oportunidade?
Se não for concedida a liberdade condicional e a prisão haja de prosseguir por pelo menos mais um ano, a regra é que a instância se renova de 12 em 12 meses desde a última decisão. Ou seja, dali a um ano terá nova oportunidade de lhe ser concedida liberdade condicional.
E se o recluso não cumprir os termos?
Se o recluso incumprir com as regras de conduta ou com o plano de reinserção social culposamente, os serviços de reinserção social ou os demais serviços ou entidades que intervenham na execução da liberdade condicional comunicam-no ao tribunal da execução de penas, que aplicará as devidas consequências:
- Faz solene advertência; ou;
- Exige garantias de cumprimento; ou;
- Impõe novas regras de conduta ou introduz exigências acrescidas no plano de reinserção.
Se, por outro lado, o recluso cometer um novo crime e for condenado, tal será comunicado ao tribunal de execução de penas, juntando-se a cópia da decisão condenatória. Nesse caso, em que o recluso cometa crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades que estavam na base da liberdade condicional não puderam, por meio dela, ser alcançadas ou ainda no caso em que incumpra grosseira e repetidamente as regras de conduta impostas ou o plano de reinserção social, o tribunal revoga a liberdade condicional, sendo executada a pena de prisão não cumprida, o que não impede, no entanto, que, posteriormente, seja concedida nova liberdade condicional.
E se não houver motivos para ser revogada?
Se, decorrido o período da liberdade condicional, não houver motivos para ser revogada, a pena de prisão extingue-se. No entanto, se se encontrar pendente processo por crime ou incidente por falta de cumprimento de regras de conduta ou do plano de reinserção, a pena de prisão só é declarada extinta quando o processo ou o incidente acabarem sem que haja lugar à revogação da liberdade condicional.
– este artigo foi redigido por uma Jurista com base no Código Penal e no Código de Execução das Penas e das Medidas Privativas da Liberdade.