O repúdio da herança é a situação em que um herdeiro não aceita ou recusa uma herança a que teria direito. À primeira vista, parece estranho recusar algo a que se tem direito, mas existem inúmeras razões que podem levar alguém a repudiar uma herança. Pense-se, desde logo, que o falecido (autor da sucessão), ao tempo da morte, poderia ter dívidas em montante superior aos seus bens.
Neste artigo, pretendemos dar-lhe a conhecer tudo o que precisa saber sobre o repúdio da herança, nomeadamente as suas caraterísticas e procedimento. Boa leitura!
O que é o repúdio da herança?
O repúdio da herança é um direito que todo e qualquer herdeiro tem e que consubstancia no facto de alguém decidir afastar-se da sucessão, não estando obrigado a revelar o motivo do repúdio.
Repudiar a herança é, assim, um ato livre, motivado inúmeras vezes por razões de ordem pessoal (ex.: uma questão de orgulho), familiar (ex.: evitar conflitos com outros herdeiros) ou mesmo económico-financeiras (ex.: evitar o cumprimento de encargos ou obrigações decorrentes dessa herança).
O repúdio da herança é absoluto?
Sim, a partir do momento em que se repudia, os seus efeitos da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, ou seja, é como se o sucessível não fosse chamado à sucessão e, a partir desse momento, é irrevogável (não se pode voltar atrás).
Por outro lado, o repúdio não pode ser feito sob condição ou a termo, ou seja, não se pode definir a hipótese de, sob determinada condição ou decorrido determinado tempo, ser aceite a herança. Além disso, o repúdio é feito em relação à totalidade da herança, ou seja, a herança não pode ser repudiada só em parte (por exemplo, a parte das dívidas), sendo aceite outra parte.
Ressalve-se, no entanto, a hipótese de dolo ou coação no repúdio da herança (ex.: um filho ser forçado pelo irmão a repudiar a herança da mãe) – nestas situações, o repúdio é anulável. O simples erro, no entanto, não é fundamento para anular o repúdio da herança.
Como repudiar a herança de alguém?
O repúdio da herança é um ato efetuado após a abertura da sucessão (o falecimento da pessoa que dá lugar à herança) e é obrigatoriamente escrito, devendo obedecer às regras de alienação da herança. Isto significa que, se a herança a repudiar compreender bens imóveis, é necessário que o repudiante o faça por escritura pública ou documento particular autenticado, porquanto sempre seria este modo de vender ou partilhar tais bens.
Por outro lado, caso a herança seja composta somente por bens móveis, basta que o repudiante expresse tal pretensão num documento particular.
É ainda necessário que o cônjuge dê o seu consentimento para se avançar com o repúdio, exceto se o matrimónio tiver sido celebrado à luz do regime da separação de bens. Ressalva-se que o documento de repúdio da herança deve ainda fazer menção à existência de descendentes do repudiante que, por força do direito de representação, podem aceitar a herança repudiada pelo respetivo ascendente.
Estes documentos poderão ser lavrados num Cartório Notarial, num escritório de advogado ou solicitador.
O que acontece à parte da herança repudiada?
Como vimos, os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, ou seja, é como se o sucessível não fosse chamado à sucessão. Assim sendo, tudo se processa como se aquele herdeiro não existisse: a herança é distribuída aos outros herdeiros até ao 4.º grau da linha colateral ou, em caso de falecimento antecipado destes, aos seus representantes. Caso o herdeiro repudiante fosse o único familiar sucessível, a herança caberá ao Estado.
O que fazer se é credor de um repudiante?
De modo a salvaguardar eventuais credores do renunciante, a lei possibilita que os seus credores possam aceitar a herança em seu nome. A isto chamamos sub-rogação. Os credores dispõem de um prazo de seis meses, a contar do conhecimento do repúdio da herança, para lançarem mão de tal faculdade. Pagos os credores do repudiante, o remanescente da herança não aproveita ao repudiante, mas sim aos herdeiros imediatos.
Em que difere da renúncia de herança?
Embora tanto o repúdio da herança como a renúncia à herança sejam formas de alguém se afastar da sucessão aberta por óbito de um sujeito, deixando, por conseguinte, de ser herdeiro naquela herança, trata-se de situações distintas.
Assim, como vimos, o repúdio da herança é a situação em que um herdeiro recusa/não aceita uma herança. A renúncia à herança, por sua vez, é a situação em que os cônjuges acordam entre si, antes do casamento, que não serão herdeiros um do outro. Neste último caso, não existe um repúdio de herança porque só um herdeiro (coisa que não chegam a ser) pode repudiar a herança.
– artigo redigido por com base no Código Civil (Decreto-Lei n.º 47344/66).