Um dos elementos essenciais a constar num contrato de trabalho é o horário de trabalho, ou seja, a previsão do período durante o qual o trabalhador presta o seu trabalho, o qual deverá respeitar os limites definidos na lei.
Acontece, no entanto, que, por vezes, o trabalhador presta horas extraordinárias ou horas extra, também designadas de trabalho suplementar. As horas extraordinárias consistem, pois, na prestação de trabalho fora do horário de trabalho definido.
Neste artigo, pretendemos dar-lhe a conhecer tudo o que precisa de saber sobre esta prestação acrescida de trabalho, nomeadamente em que situações pode existir e que compensação deve receber. Boa leitura!
O que são horas extraordinárias?
As horas extraordinárias, também chamadas “horas extra” ou, no código do trabalho, “trabalho suplementar”, consiste na prestação de trabalho fora do horário definido ao trabalhador.
No entanto, como para cada regra há uma exceção, existem casos em que há prestação de trabalho fora do horário de trabalho, mas que não é considerado trabalho suplementar:
- Quando o trabalhador seja isento de horário de trabalho – em dia normal de trabalho, e desde que, no caso de o acordo sobre a isenção limite a prestação de trabalho a um determinado período, diário ou semanal, não seja excedido esse período;
- Quando é para compensar a suspensão da atividade – independentemente da sua causa e de duração não superior a 48 horas, seguidas ou interpoladas por um dia de descanso ou feriado, mediante acordo entre empregador e trabalhador;
- Quando seja uma tolerância de 15 minutos – para transações, operações ou outras tarefas começadas e não acabadas na hora estabelecida para o termo do período normal de trabalho diário;
- Quando seja para formação profissional – realizada fora do horário de trabalho e que não exceda as 2 horas diárias;
- Quando o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho o permita;
- Quando é para compensar períodos de ausência ao trabalho – efetuada por iniciativa do trabalhador e desde que tenha o acordo do empregador;
- Quando é para compensar o encerramento para férias – em dia que esteja entre um feriado que ocorra à terça-feira ou quinta-feira e um dia de descanso semanal, por decisão do empregador.
Em que situações podem ser prestadas horas extraordinárias?
As horas extraordinárias podem ser prestadas/exigidas pelo empregador:
- quando a empresa tenha de fazer face ao acréscimo eventual e transitório de trabalho (um aumento pontual), mas que não justifique para tal a admissão de trabalhador(es) (novas contratações);
- em caso de força maior ou quando seja indispensável para prevenir ou reparar prejuízo grave para a empresa ou para a sua viabilidade.
Se a empresa exigir a prestação de horas extraordinárias fora destas situações, deve denunciar à ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho), porque o empregador estará a praticar uma contraordenação muito grave.
O trabalhador é obrigado a prestar horas extraordinárias?
Caso se verifique uma das situações (que vimos atrás) em que é permitido que o empregador exija ao trabalhador a prestação de horas extraordinárias, o trabalhador deverá prestá-las, a menos que existam motivos atendíveis para o trabalhador não o puder fazer, caso em que deverá solicitar expressamente ao empregador a dispensa da prestação de horas extraordinárias.
Constituem motivos atendíveis para dispensa da prestação de horas extraordinárias, por exemplo, o facto de tal colocar em risco a saúde do trabalhador ou impedir a assistência a familiares, sendo exemplos concretos de dispensa as pessoas deficientes, grávidas, menores, trabalhadores-estudantes ou com filhos até 1 ano de idade.
Quais os limites aplicados às horas extraordinárias?
O trabalhador pode prestar:
- Diariamente:
- num dia normal de trabalho, até 2 horas extraordinárias; ou
- num dia de descanso, o número de horas normais diárias de trabalho; ou
- em meio dia de descanso complementar (ex.: sábado), um número de horas igual a meio período normal de trabalho diário.
- Semanalmente, até 48 horas extraordinárias.
- Num intervalo de:
- Até 4 meses; ou
- Caso exista instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que regule nesse sentido, o tempo aí previsto, num máximo de 12 meses.
- Anualmente:
- Em caso de microempresa ou pequena empresa (49 ou menos trabalhadores), até 175 horas extraordinárias por ano – este limite pode ser aumentado até 200 horas extraordinárias por ano, por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho;
- Em caso de média ou grande empresa (50 ou mais trabalhadores), até 150 horas extraordinárias por ano – este limite pode ser aumentado até 200 horas extraordinárias por ano, por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho;
- No caso de trabalho a tempo parcial, até 80 horas extraordinárias por ano ou o número de horas correspondente à proporção entre o respetivo período normal de trabalho e o de trabalho a tempo completo em situação comparável, quando superior – este limite pode ser aumentado até 130 horas extraordinárias por ano, por acordo escrito entre trabalhador e empregador ou até 200 horas extraordinárias por ano, por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
Qual a compensação pela prestação de horas extraordinárias?
O trabalhador que presta horas extraordinárias que o impedem de descansar, terá direito a:
- um descanso compensatório, que deverá ser gozado nos 3 dias úteis seguintes, marcado por acordo entre o trabalhador e o empregador e, na falta de acordo, pelo empregador;
- uma remuneração, a qual varia de acordo com os dias em que as horas extraordinárias são prestadas (conforme seja dia de trabalho ou dia de descanso).
Para calcular o valor de remuneração que lhe é devido pela prestação de horas extraordinárias, deverá, em primeiro lugar, saber que montante aufere normalmente à hora, através do seguinte cálculo:
1 hora = (retribuição mensal bruta x 12) ÷ (52 x horas de trabalho semanal)
Depois, ao montante obtido, deverá acrescentar as seguintes percentagens:
Percentagem | Condição |
---|---|
25% | Primeira hora extraordinária prestada em dia normal de trabalho |
37,5% | Horas extraordinárias seguintes prestadas em dia normal de trabalho |
50% | Horas extraordinárias prestadas em dia de descanso ou feriado |
Exemplo prático: O João aufere uma retribuição mensal bruta de € 1.000,00 e tem um horário normal de trabalho de 40 horas semanais. Trabalhou 12 horas extraordinárias – 4 horas extraordinárias em dias normais de trabalho, sendo que 2 horas foram prestadas no mesmo dia, e 8 horas num feriado.
O João aufere normalmente à hora € 5,77 [(€1000x12)÷(52x40)]. Por cada primeira hora extraordinária trabalhada em dia normal de trabalho (+25%), deverá receber € 7,21 (x3). Pelas horas extraordinárias seguintes prestadas em dia normal de trabalho (+37,5%), deverá receber € 7,93 por hora. Pelas horas extraordinárias trabalhadas no feriado (+50%), deverá receber € 8,66 por hora (x8). No total, o João, além do descanso compensatório, terá direito a auferir a remuneração de € 98,84.
As horas extraordinárias prestadas têm de ser registadas?
Sim. O empregador deve manter um registo das horas extraordinárias prestadas pelos trabalhadores, no qual, antes do início da prestação e logo após o seu termo, são anotadas as horas em que cada uma das situações ocorre.
Se o trabalhador realizar as horas extraordinárias fora da empresa, o registo deve ser visado pelo trabalhador imediatamente após o seu regresso à empresa ou mediante envio do mesmo devidamente visado, sendo que, em qualquer caso, o empregador deve dispor do registo visado no prazo de 15 dias a contar da prestação.
O registo deve ser efetuado em suporte documental adequado, nomeadamente impressos adaptados ao sistema de controlo de assiduidade existente na empresa, que permita a consulta e impressão imediata e que deve estar permanentemente atualizado, sem emendas nem rasuras não ressalvadas.
Do registo deve constar:
- A indicação expressa do fundamento da prestação das horas extraordinárias;
- Os períodos de descanso compensatório gozados; e
- Outros elementos indicados no modelo oficial deste documento.
O empregador deve comunicar à ACT a relação nominal de trabalhadores que prestaram horas extraordinárias durante o ano civil anterior, visada pela comissão de trabalhadores ou pelo sindicato, e com a discriminação do número de horas prestadas e a indicação de gozo dos correspondentes descansos compensatórios, a qual deve ser mantida pelo empregador durante 5 anos.
Caso o empregador não efetue este registo, o trabalhador tem direito, por cada dia em que tenha prestado atividade fora do horário de trabalho, a uma retribuição correspondente a 2 horas extraordinárias.
– este artigo foi redigido por uma jurista com base no Código do Trabalho (Lei n.º 7/2009).