Perder o emprego é um momento particularmente difícil para qualquer trabalhador. No entanto, se ser despedido envolve sofrimento, despedir também. Para além do constrangimento natural do momento, surgem sentimentos de culpa, frustração ou impotência. E em momentos como estes, se de facto são inevitáveis, não vale a pena “dourar a pílula”. Não há formas agradáveis e indolores de despedir alguém. No entanto, se não podemos melhorar a situação, podemos usar determinadas estratégias que nos permitam, pelo menos, não piorá-la.
Conheça a legislação e pondere alternativas ao despedimento
Parece um pressuposto óbvio, mas nem sempre é cumprido. Um despedimento é uma decisão difícil que deve ser devidamente ponderada, não apenas do ponto de vista legal, mas também do ponto de vista humano. Para isso é preciso analisar as razões que levam o empregador a despedir, explorando todas as alternativas. Se o despedimento se prende com razões financeiras, é pertinente analisar se existem alternativas possíveis, apoios previstos para a empresa. Se a razão é o mau desempenho do trabalhador, é preciso analisar a situação em toda a sua dimensão, verificar se se trata de um despedimento com justa causa, e não tomar decisões precipitadas.
Em suma, questione-se a si mesmo se tem mesmo de despedir o trabalhador, e se é possível colocar outras alternativas como a recolocação, a realização de outra função, uma transferência ou mesmo alocação a um projeto ou departamento diferente.
A pessoa que vai realizar o despedimento deve estar devidamente informada sobre a legislação laboral e as características específicas do contrato do trabalhador. Isto evitará situações desagradáveis e prejuízos para a empresa e para o funcionário. Adicionalmente, ajuda também a informar o trabalhador de forma clara acerca dos seus direitos e possíveis apoios.
Conhecimento e informação são instrumentos de poder e, quando estamos informados, é mais provável que a situação decorra com menos imprevistos e prejuízos para ambas as partes.
Se tiver que se aconselhar, fale apenas com quem tem de falar
É natural que perante uma decisão difícil precise de se aconselhar, quer em termos legais e laborais, para reunir toda a informação, quer para que alguém o ajude no processo de difícil tomada de decisão. No entanto, deve ser tido especial cuidado nesta procura por aconselhamento, sob pena de a informação se difundir. Não há nada pior do que receber uma má notícia por outra pessoa, ou nos sentirmos alvo de comentários ou olhares de compaixão. Por isso, evite esta possibilidade, falando da situação a um pequeno número de pessoas e apenas às que sejam estritamente necessárias para o ajudar a tomar a decisão.
Coloque-se no lugar da outra pessoa e analise a situação
A empatia é uma capacidade humana fundamental em qualquer circunstância, mas sobretudo nas circunstâncias difíceis. Embora não vá, em termos práticos, melhorar a situação, sentirmos que a pessoa que nos está a comunicar algo negativo compreende o nosso lado e procura ajudar-nos pode ser benéfico. Por isso, para se conseguir pôr na pele do trabalhador, é importante que conheça a sua situação: tem qualificações e facilidade de encontrar outro emprego? Ajudaria se lhe pudesse dar uma recomendação? Tem família e necessidades económicas? Conhecer a situação do trabalhador poderá ajudá-lo a colocar-se na sua pele e, eventualmente, informá-lo ou mesmo ativar apoios que lhe possam ser úteis.
Não vale a pena adiar o momento
Quando estamos perante uma decisão ou momento difícil, é natural que exista uma tendência para o adiamento. Não nos queremos confrontar com a situação penosa, e vamos adiando o inevitável. No entanto, isso só trará mais prejuízo, quer para si quer para o trabalhador. No que lhe diz respeito, só aumentará o seu nível de frustração e irá minar o seu bem-estar e capacidade de concentração. O pensamento permanece lá, persistente, como um barulho incómodo que não cessa. Por outro lado, adiar a decisão poderá fazer com que prejudique ainda mais o trabalhador, não lhe dando a oportunidade de programar a sua vida e procurar um novo projeto profissional. Além disso, o trabalhador estará a despender tempo, energia e expectativas num trabalho inócuo.
Pondere bem quem deve dar a notícia
Não só o que se diz tem impacto, mas também quem o diz. Quando um funcionário é despedido é fundamental que o despedimento seja feito por alguém que se sinta capaz de o fazer, possua toda a informação necessária, seja empático, tenha credibilidade para o trabalhador e possua a função necessária para o fazer. Não passa uma boa imagem da empresa que seja alguém “dar o recado”, mas sim que a pessoa envolvida no processo de tomada de decisão possa conversar de forma honesta com o trabalhador, por forma a apresentar-lhe todas as razões inerentes ao despedimento. Se é o patrão que toma a decisão do despedimento mas existe um supervisor direto do trabalhador, é recomendável que este supervisor esteja presente na comunicação desta notícia, pois tem mais proximidade com o funcionário e pode informá-lo de forma mais esclarecida.
Uma alternativa pode também ser a contratação de uma consultora externa especializada em outplacement, que não despede propriamente as pessoas mas ajuda-as a reformular a sua vida profissional e encontrar um novo emprego.
Escolha o momento certo
O momento em que o despedimento é feito é também um fator que pode ter impacto e, para compreendermos isto, é necessário mais uma vez sermos empáticos e capazes de nos colocarmos no lugar do trabalhador que vai ser despedido. Não é agradável receber esta notícia ao princípio do dia de trabalho, quando existe ainda um dia inteiro de tarefas pela frente, ou quando temos de nos cruzar com os restantes colegas depois de um momento difícil. Se possível, programe este momento para uma sexta-feira e/ou para o final do dia. Garanta que é um momento em que o trabalhador tem disponibilidade e, se possível, em que não esteja sobrecarregado com outras questões (laborais ou pessoais). É ainda importante que seja o momento certo também para quem vai despedir, e que se encontre – dentro do possível – preparado emocionalmente, informado, sem questões pendentes que tenha de resolver e sem interrupções.
Escolha o local adequado
O espaço onde vamos comunicar uma notícia difícil deve garantir privacidade, conforto e ausência de distrações. Nada mais desagradável do que estar a ter esta conversa com o telefone constantemente a tocar ou com pessoas a olhar ou a ouvir a conversa. Garantir privacidade e proximidade com a outra pessoa demonstra respeito e consideração por ela. Por isso, escolha um local onde não sejam interrompidos, onde possa existir privacidade e onde o trabalhador se sinta o mais à vontade possível. Não dê a notícia de pé, no corredor ou noutros locais que retirem ao momento a seriedade que ele deve ter.
Explique as razões do despedimento
Despedir alguém sem dar qualquer justificação ou sem permitir à pessoa compreender as razões do seu despedimento gera uma frustração desnecessária. O trabalhador, independentemente de ter tido um bom desempenho durante o seu percurso na empresa ou não, merece compreender as razões que levam à sua saída, quer por uma questão de respeito quer porque isto lhe permitirá evoluir. Por isso, apresente de forma clara as razões que conduziram ao seu despedimento e esteja aberto para eventuais esclarecimentos.
Esteja preparado para a reação que receberá
Dependendo da situação específica e do trabalhador, as reações à comunicação do despedimento podem ser variadas. Cada pessoa reage de forma diferente e por isso é fundamental que esteja preparado para diversas reações. A pessoa pode reagir de forma mais agressiva ou mais emotiva, por exemplo. No momento em que recebemos uma notícia difícil não temos tempo para assimilarmos e gerirmos a informação racionalmente, pelo que é natural que as emoções comandem estes momentos. Deve por isso estar preparado e saber como deve agir.
Não existem receitas universais para agir nestas situações, a regra é ser empático e genuíno, compreendendo as necessidades do outro. Se o trabalhador reage com agressividade, é necessário, num primeiro momento, compreender que a agressividade pode ser uma reação defensiva e natural face à notícia que está a receber. Procura validar esses sentimentos, dizendo, por exemplo “compreendo que se sinta zangado”. Depois, procure perceber se essa agressividade é uma mera reação instintiva ou se acontece porque o trabalhador tem uma perceção errada das razões do seu despedimento.
Procure, o mais possível, colocar-se no lugar da outra pessoa e entender as suas necessidades. Valide as emoções do outro, seja compreensivo e dê espaço à pessoa para se expressar. Pode mesmo questionar se a pessoa tem questões ou dúvidas, se há algum aspeto que gostasse de falar, se há alguma coisa que não entendeu. Mostre-se disponível para ajudar na situação futura do trabalhador.
Adapte a sua comunicação
Por vezes a forma como comunicamos é mais importante do que aquilo que comunicamos. Por isso, a forma como irá dar a notícia será fundamental. Para isso, deve ter atenção quer a aspetos verbais quer a aspetos não-verbais:
- Evite frases cliché que transmitem uma imagem de pouca empatia e genuinidade, tais como “de certeza que vai encontrar outro trabalho” ou “se pudesse não o despedia”;
- Seja sincero, não minta e não procure dar informações que não tem. Se não sabe, diga simplesmente “não sei”;
- Use o nome da pessoa ou a forma como ela habitualmente é tratada;
- Mantenha o contacto ocular e evite desviar o olhar ou ficar a olhar para baixo;
- Seja simples e direto, mas compreensivo, evitando rodeios desnecessários;
- Tenha uma postura de abertura à comunicação, evitando por exemplo cruzar os braços ou pôr as mãos à frente da boca;
- Mantenha uma proximidade adequada, sem estar demasiado perto da pessoa pois pode ser intrusivo, nem estar demasiado longe para não tornar a comunicação impessoal e fria;
- Inicie permitindo à pessoa preparar-se, dizendo, por exemplo “infelizmente tenho más notícias para lhe dar” ou “infelizmente o motivo para o chamar aqui não é o melhor”;
- Não culpabilize a pessoa. Mesmo que a razão do despedimento esteja relacionada com o mau desempenho do trabalhador, basta que comunique este aspeto, não é necessário que utilize acusações ou culpabilizações;
- Não desvalorize as dificuldades ou os sentimentos do trabalhador;
- Não queira ser o único a falar, dê espaço à pessoa para se expressar e transmitir a sua perspetiva e as suas preocupações;
- Garanta que a informação passou para o outro lado de forma clara e precisa e que não existiram mal-entendidos. Para isso, questione se a pessoa compreendeu e faça uma breve síntese ou resumo daquilo que esteve a dizer.
Promova as competências futuras do trabalhador
Se possível, ajude o trabalhador na transição que terá de viver. Procure dar-lhe apoio e ajudá-lo a reformular um projeto profissional. Dê feedback ao trabalhador acerca dos aspetos positivos do seu trabalho durante o tempo que permaneceu na empresa, bem como dos pontos a desenvolver e a forma como poderá desenvolvê-los. Como alguém mais experiente pode ajudar o trabalhador a adquirir experiência e um maior entendimento sobre como pode gerir a sua progressão de carreira.
Informe ainda sobre apoios existentes, formas de definir objetivos e iniciar uma procura ativa de emprego. Se possível mostre-se também disponível para lhe escrever uma carta de recomendação. No entanto, lembre-se sempre que é fundamental ser sincero e genuíno, e não agir movido por pena ou compaixão.
Procure conhecer a opinião e obter o feedback do trabalhador
Uma empresa bem-sucedida é aquela que tem em conta as opiniões e considerações dos seus colaboradores. Por isso, mostre abertura e valorize a opinião do trabalhador, e procure recolher o seu feedback antes de ele se ir embora. O feedback ajuda a empresa a reformular-se e a melhor continuamente. Pergunte ao trabalhador que aspetos foram mais positivos durante o seu percurso na empresa e quais foram os aspetos negativos, permitindo que ele ofereça também sugestões.
Não se culpabilize
Se procurou cumprir todas estas estratégias e, acima de tudo, agiu de forma empática e correta com o trabalhador, não se culpabilize. Despedir alguém e ter uma interferência potencialmente negativa, num dado momento, em alguém, é sempre difícil. No entanto, posições de grande responsabilidade envolvem a capacidade de tomar decisões difíceis, e deve vê-las como parte do trabalho. Se tomou uma decisão ponderada, certamente fez o necessário pela empresa mas, também, pelo trabalhador. Manter um trabalhador por pena é aprisioná-lo e impedi-lo de procurar projetos profissionais mais adequados para si. Despedir pode ser, nesse aspeto, libertar!
Boa sorte!
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