Pensamentos negativos: como se formam e como os gerir?

pensamentos negativos

A nossa mente está constantemente em atividade, e nunca paramos de pensar. Podemos encarar os pensamentos como a nossa atividade mental ou o discurso e diálogo interno que temos internamente.

Como sabemos, muitas vezes esse discurso é negativo. Os pensamentos negativos são naturais e todos nós os temos. No entanto, nem sempre compreendemos porque é que eles ocorrem ou como é que os podemos gerir, ou pelo menos gerir o impacto que eles têm no nosso estado emocional.

Deste modo, neste artigo pretendemos explicar o que são e como se formam os pensamentos negativos, bem como a forma como os podemos gerir.

O que são os pensamentos e como se formam?

Os pensamentos ou cognições dizem respeito a processos mentais internos, que se formam a partir da nossa interação com o mundo. Começamos a pensar desde que nascemos, primeiro como pequenos observadores que procuram descobrir o mundo à sua volta. À medida que crescemos vamos compreendendo e categorizando o mundo, e criando a nossa própria forma de ver e pensar sobre a realidade. É destas experiências que se formam as nossas cognições, pensamentos e crenças.

Por exemplo, uma criança que é maltratada pelos pais poderá formar a crença de que o mundo é lugar inseguro e de que não pode confiar nos seus cuidadores, o que pode influenciar os pensamentos que terá nas suas relações futuras. Um exemplo simples é, por exemplo, alguém que passou por um processo de traição, e nas relações amorosas seguintes tem tendência a pensar nas atitudes da outra pessoa com desconfiança.

Assim, os pensamentos que vamos tendo no nosso quotidiano estão ligados ao nosso estilo cognitivo ou à forma como vemos o mundo. Mediante uma mesma situação, duas pessoas podem pensar coisas distintas, dependendo do seu padrão de funcionamento cognitivo.

Assim, os pensamentos estão relacionados com o processamento de informação, isto é, a forma como percecionamos e processamos as informações e estímulos que recebemos do meio em que estamos inseridos. O ser humano avalia o ambiente que o circunda e os acontecimentos que ocorrem internamente. Ou seja, nós pensamos não só sobre o que acontece fora de nós, mas também dentro de nós.

Por exemplo, provavelmente se estiver a sentir falta de energia irá pensar alguma coisa sobre essa falta de energia. Pode interpretá-la de forma natural, pensando que descansou pouco nessa noite e precisa de dormir bem hoje, ou pode interpretá-la de forma negativa, pensando que há algo de errado consigo.

Os pensamentos negativos mais não são do que um processamento negativo, muitas vezes enviesado, do que acontece à nossa volta.

Qual a importância dos pensamentos?

Os nossos pensamentos ou cognições são muito importantes. Por um lado, os pensamentos têm uma influência controladora sobre as nossas emoções e comportamentos. Por outro, o modo como agimos ou nos comportamos pode afetar profundamente os nossos padrões de pensamento e as nossas emoções. Quando conseguimos reorientar os nossos pensamentos conseguimos também alterar os nossos estados emocionais e os nossos comportamentos.

Assim, se tivermos pensamentos negativos é bastante provável que o nosso estado emocional seja também negativo e que possamos adotar comportamentos menos adequados. Por exemplo, nas pessoas deprimidas verifica-se um estilo cognitivo negativo em três domínios: pensamentos sobre si mesmo, pensamentos sobre o mundo e pensamentos sobre o futuro. Este estilo cognitivo negativo denomina-se de tríade cognitiva. Ao ter este conjunto de pensamentos negativos, a pessoa deprimida sentir-se-á triste, angustiada, e poderá ter comportamentos de inatividade, desmotivação e desânimo.

Assim, os pensamentos são muito importantes porque eles determinam a forma como nos sentimos e como nos comportamos. Muitas vezes achamos que nos sentimos tristes porque algo de mau aconteceu. No entanto, não é a situação que causa a emoção, mas sim o pensamento. Por exemplo, suponhamos a seguinte situação: receber uma nota negativa num exame. Podemos assumir que qualquer pessoa ficaria triste ou desanimada com esta situação.

No entanto, imaginemos que uma pessoa recebe uma nota negativa no exame e pensa “já sabia que ia ter negativa porque não estudei, só fui ao exame para ver como era a estrutura, agora vou repetir o exame e já sei como vou fazer e vou ter um bom resultado”. Provavelmente, o estado emocional desta pessoa seria diferente.

Assim, os pensamentos são fulcrais porque são eles que determinam a maneira como nos sentimos. Não é a realidade em si que nos deixa tristes ou felizes, mas sim a forma como vemos essa realidade. Como disse Virgílio Ferreira, “o que importa não é o que acontece, mas o que acontece em nós desse acontecer”.

Quais os níveis de processamento cognitivo?

Existem três níveis básicos de processamento cognitivo. O nível mais alto é o da consciência, um estado de atenção no qual as decisões podem ser tomadas racionalmente. A atenção consciente permite-nos:

  • Monitorizar e avaliar as interações com o meio ambiente;
  • Ligar memórias passadas a experiências presentes;
  • Controlar e planear ações futuras.

Temos depois outros dois níveis de processamento: os pensamentos automáticos e os esquemas. Os pensamentos automáticos são cognições que passam rapidamente pela nossa mente quando estamos no meio de determinadas situações ou a recordar acontecimentos. Estes podem ser pensamentos negativos, por exemplo quando estou a falar com alguém e penso “esta pessoa não quer saber do que eu estou a dizer”.

Temos depois os esquemas, que dizem respeito a crenças nucleares que agem como matrizes ou regras subjacentes para o processamento de informação. Os esquemas servem uma função importante para os seres humanos, a de selecionar, filtrar, codificar e atribuir significado às informações que vêm do meio ambiente.

Pensamentos negativos automáticos

Os pensamentos negativos automáticos atuam a um nível pré-consciente, isto é, são pensamentos que podem ser reconhecidos e entendidos, mas apenas se a nossa atenção for voltada para eles. Por exemplo, de certeza já lhe aconteceu sentir-se mal, triste ou incomodado numa determinada situação, mas não saber dizer exatamente o que estava a pensar nesse momento. Isto porque os pensamentos negativos ocorreram de forma automática e nem sequer se focou neles.

Um dos indícios de que os pensamentos negativos automáticos podem estar a acontecer é a presença de emoções fortes. Por exemplo, imagine que está no trabalho e dá por si a sentir-se ansioso, nervoso. Esta mudança no seu estado de humor é um indicador importante de que um pensamento negativo passou ou está a passar pela sua mente. Talvez tenha pensado sobre o trabalho que tem de entregar, sobre o facto de ainda faltarem horas para ir para casa, ou sobre o facto de ter de ir para casa ter com alguém com quem está zangado.

Estudos científicos mostram que as pessoas com depressão, ansiedade ou outros transtornos apresentam uma elevada frequência de pensamentos negativos automáticos. Na depressão, estes pensamentos negativos centram-se muitas vezes na desesperança, baixa autoestima e fracasso. Na ansiedade as pessoas normalmente têm pensamentos negativos associados a perigo, ameaça, prejuízo, falta de controlo ou incapacidade para lidar com dificuldades.

Todas as pessoas têm pensamentos negativos automáticos, eles não acontecem só em quem tem problemas como a depressão ou ansiedade. Ao reconhecer os seus próprios pensamentos negativos automáticos, pode conseguir perceber as suas principais dificuldades na forma como processa a informação à sua volta e mudar este padrão de funcionamento cognitivo.

Para o ajudar a identificar os seus pensamentos negativos automáticos, pode fazer o seguinte exercício:

  • Desenhe três colunas numa folha de papel e escreva em cada uma delas “situação”, “pensamentos automáticos” e “emoções”;
  • Agora, relembre uma situação recente, que pareceu mexer consigo, deixando-o triste, ansioso, com raiva…
  • Tente imaginar-se novamente na situação, exatamente como ela aconteceu;
  • Quais foram os pensamentos automáticos que ocorreram nessa situação? Escreva a situação, os pensamentos automáticos e as emoções nas três colunas de registo.

Pensamentos negativos distorcidos

Às vezes os pensamentos negativos podem efetivamente ser lógicos e verdadeiros. Por exemplo, se fui despedida é normal que possa ter pensamentos negativos tais como “vou ter mais dificuldade em pagar as contas ao final do mês”. Ou seja, há pensamentos negativos que representam uma perceção adequada da realidade.

No entanto, muitas vezes os pensamentos negativos representam uma forma distorcida de processar a realidade, ou os chamados erros cognitivos. Há uma frequência muita maior de erros cognitivos ou pensamentos negativos distorcidos em pessoas com problemas como ansiedade ou depressão.

Os pensamentos negativos distorcidos constituem, basicamente, uma forma distorcida de interpretar diferentes situações, e estes erros acontecem porque a nossa forma de processar determinadas situações é influenciada pelas nossas vivências passadas e pelo nosso estado emocional. Basta pensar, por exemplo, numa altura em que teve daqueles dias maus, em que estava sem paciência para nada. Provavelmente alguém lhe disse alguma coisa que noutra altura consideraria normal e que naquele momento interpretou como má ou como uma afronta.

Outro exemplo pode ser o que indicamos acima, de alguém que foi traído no seu relacionamento. Essa pessoa provavelmente irá interpretar pequenas ações dos outros como sendo estranhas ou suspeitas.

Podemos identificar algumas categorias principais de erros cognitivos ou pensamentos negativos distorcidos:

  • Abstração seletiva: consiste em chegarmos a uma conclusão depois de apenas examinarmos uma pequena porção de informações disponíveis ou evidências. Alguns dados importantes são ignorados ou desvalorizados, por forma a confirmarmos a nossa visão tendenciosa da situação. Exemplo: uma pessoa faz anos e um dos seus amigos não lhe dá os parabéns, e a pessoa pensa “ninguém quer saber de mim, não tenho amigos”, ignorando que outras pessoas lhe deram os parabéns, apesar de aquela não ter dado.
  • Inferência arbitrária: consiste em chegarmos a uma conclusão a partir de evidências contraditórias ou na ausência de evidências. Exemplo: uma pessoa tem medo de andar de avião e acha que a probabilidade de o avião cair é de 10%, apesar de lhe tentarem mostrar com dados concretos que a probabilidade é muito mais baixa.
  • Sobregeneralização: consiste em chegar a uma conclusão sobre um acontecimento isolado e depois generalizar essa conclusão para outros acontecimentos. Exemplo: alguém que se sentiu deslocado e desconfortável numa festa, e evita depois ir a outras festas porque acha que se vai sentir sempre assim.
  • Maximização e minimização: consiste em exagerarmos ou minimizarmos a importância de uma determinada situação ou característica. Exemplo: alguém estar a sentir-se muito ansioso e, ao sentir o coração muito acelerado, pensar “vou ter um ataque cardíaco”.
  • Personalização: consiste em associarmos todas as coisas que acontecem a nós próprios, embora não haja nenhum fundamento para isso. Há uma tendência a assumir responsabilidade excessiva ou culpa pelas coisas más que acontecem. Exemplo: está a haver problemas orçamentais na empresa da pessoa, por diversos fatores externos, mas a pessoa pensa logo que a culpa é sua, que devia ter previsto e feito alguma coisa.
  • Pensamento absolutista: consiste em separarmos tudo em duas categorias extremas – totalmente bom ou totalmente mau, fracasso total ou sucesso, cheio de defeitos ou perfeito. Exemplo: ao não ter 100% num exame pensar “fracassei totalmente”; ou alguém ao comparar-se com um amigo que tem um bom casamento dizer “a vida dele é melhor que a minha em tudo”.

Como alterar os pensamentos negativos?

Alterar os pensamentos negativos diz respeito não a passarmos a ver tudo de uma forma super otimista e ilusória, mas sim a conseguirmos processar a realidade de uma maneira mais realista e adequada. No fundo, gerir os pensamentos negativos de forma saudável é conseguirmos compreender quando é que eles são úteis e realistas e quando é que, pelo contrário, apenas representam formas distorcidas e enviesadas de ler a realidade.

De seguida iremos apresentar algumas das principais estratégias para conseguir identificar, questionar e modificar os seus pensamentos negativos. No entanto, queremos chamar a atenção para o facto de se os seus pensamentos negativos são persistentes e associados a alterações emocionais, deve trabalhá-los no âmbito de um processo terapêutico e procurar aconselhamento por parte de um psicólogo.

Identificar os pensamentos negativos automáticos

Para poder questionar e alterar os seus pensamentos negativos primeiro tem de se tornar consciente deles, isto é, tem de conseguir identificá-los. Assim, identificar os seus pensamentos negativos é o primeiro passo do processo. Para identificar os pensamentos pode:

  • Procurar estar atento a quaisquer mudanças do estado de humor que possa ter;
  • Quando sentir uma alteração no seu estado emocional ou estado de humor, parar por um momento e procurar perceber em que está a pensar ou em que estava a pensar no momento anterior;
  • Se necessário, registar esses pensamentos em forma de diálogo interno;
  • Pensar em situações nas quais se tenha sentido alterado emocionalmente, e imaginar que está novamente na situação, procurando identificar os pensamentos negativos associados à situação;
  • Procurar perceber de que forma costuma ser “afetado” por erros cognitivos ou pensamentos distorcidos, e em que situações. Pode por exemplo analisar de que forma costuma pensar estas coisas:
    • A minha vida devia estar a correr melhor;
    • As pessoas não me compreendem;
    • Eu desiludi ou desiludo os outros;
    • Eu sou estranho ou diferente;
    • Não consigo achar piada a nada;
    • Porque sou tão fraco?
    • Não faço nada bem;
    • Estrago sempre tudo;
    • A minha vida está sem rumo;
    • Não consigo lidar com coisas difíceis;
    • Não vou ser capaz;
    • Estou a falhar;
    • Isto é demais para mim;
    • As coisas estão fora do meu controlo;
    • Mais vale desistir / não vale a pena tentar;
    • Alguma coisa de mau vai acontecer.

Questionar os pensamentos negativos

Após se tornar capaz de identificar os seus pensamentos negativos em diversas situações, pode então começar a questioná-los. Questionar os pensamentos negativos diz respeito a confrontar esses pensamentos e crenças com a lógica. De uma forma muito básica o questionamento envolve: identificar os erros cognitivos presentes no seu pensamento; examinar as provas e evidências que tem de que o pensamento é verdade; gerar alternativas racionais e mais realistas.

Vamos então à primeira parte: identificar os erros cognitivos presentes no seu pensamento. Depois de ter compreendido o que são erros cognitivos ou pensamentos negativos distorcidos, pode observar o seu pensamento e perceber se algum erro cognitivo está presente. Por exemplo, imagine que algo lhe correu mal no trabalho e está a pensar “não faço nada bem”. A palavra “nada” aqui dá-nos uma pista de que está a cometer uma sobregeneralização: porque algo não correu bem, está a assumir que tudo corre mal. Provavelmente, há várias coisas na sua vida que faz bem, ou que já fez bem.

Depois de identificar o erro cognitivo, pode então colocar várias questões que irão colocar à prova a veracidade desse pensamento:

  • Quais são as evidências / provas que apoiam este pensamento?
  • Quais são as evidências contra este pensamento?
  • Existe uma explicação alternativa?
  • Qual é o pior que poderia acontecer? Eu poderia superar isso?
  • O que é o melhor que poderia acontecer?
  • Qual é o resultado mais realista?
  • Qual é a consequência de eu pensar desta forma?
  • O que eu deveria fazer em relação a isso?
  • O que eu diria a um amigo/a se ele ou ela estivesse na mesma situação?

Gerar pensamentos mais realistas e racionais

Após ter questionado os seus pensamentos negativos, está pronto para conseguir gerar alternativas mais realistas e racionais. Mediante a resposta às perguntas anteriores, provavelmente já percebeu que o pensamento negativo é pouco lógico e racional, e consegue pensar de uma maneira mais lógica e realista. Por exemplo, pegando no pensamento “não sei fazer nada bem” que surgiu por um problema no trabalho, se calhar após responder às perguntas acima consegue gerar uma alternativa racional tal como “esta tarefa não me correu bem, realmente não consegui fazer como queria.

No entanto, sei que há outras coisas que faço bem, ajudo a minha família e sou bom amigo, além de que faço ótimos cozinhados. Mesmo no trabalho sou responsável e cumpro sempre o que me pedem. Em relação a esta tarefa vou pensar em soluções para emendar o meu erro e para perceber como posso fazer melhor”.

Algumas coisas que o podem ajudar a gerar alternativas racionais ao seu pensamento negativo:

  • Comece por se perguntar-se a si mesmo: que conselho daria se fosse um amigo a ter o mesmo pensamento negativo?
  • Abrir a sua mente para outras possibilidades, pensando num leque de opções variado. Procure pensar como um cientista ou um detetive, alguém que evita tirar conclusões precipitadas e que procura todas as provas e evidências;
  • Pense em como pensava antes de estar triste ou frustrado – lembre-se de situações semelhantes que encarou de outra forma, situações em que resolveu um problema ou dificuldade, e procure perceber como pensou na altura e de que forma esse pensamento se pode aplicar agora;
  • Faça um brainstorming, fazendo uma lista de todas as ideias possíveis, examinando as possibilidades e vendo quais são as alternativas mais lógicas;
  • Aprenda com os outros – confira a sua forma de pensar com alguém da sua confiança, procure perceber se está a pensar da forma mais correta e lógica e que outras alternativas os outros o conseguem ajudar a ponderar.

Os pensamentos negativos são algo que afeta todos nós e que se relaciona com a maneira como encaramos as diversas situações de vida. Apesar de naturais, os pensamentos negativos também podem tornar-se intensos e prejudicar o nosso estado emocional e o nosso comportamento e desempenho.

Por isso, aprender a questionar e gerir os pensamentos negativos pode ser muito importante e útil para o ajudar a sentir-se mais tranquilo e feliz! Gerir os pensamentos negativos não é acreditar que o mundo é perfeito e passar a ser sempre otimista: é apenas aprender a ver a realidade com clareza, sem o olhar distorcido muitas vezes imposto pelo nosso padrão de funcionamento desajustado.

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.