O conflito é um fenómeno comum em todas as áreas da vida social incluindo, naturalmente, o trabalho. É parte integrante da existência humana e essencial para o processo evolutivo da humanidade e para a transformação social. Mas se o conflito é tão premente e natural no contexto social e de trabalho, como evitar que se torne negativo e destrutivo? Como trabalhar (s)em conflito?
Conflito: como defini-lo?
O conflito ocorre sempre que há uma situação de oposição entre indivíduos ou grupos devido ao confronto de opiniões, conflitos de interesses ou aspirações divergentes. Basicamente, a diferença é a base através do qual o conflito nasce. E a diferença é também inerentemente humana, porque não existem duas pessoas iguais. Assim, conflito não é sinónimo de discussão ou desavença, nem tem uma necessária conotação negativa. Define, simplesmente, a divergência. E sabemos que no contexto laboral existem necessariamente divergências, não só pessoais como também relativas à própria natureza do trabalho.
Importa ainda compreender o conflito como algo subjetivo, que resulta das perceções dos indivíduos e não de factos reais. O conflito emerge do facto de existirem diferentes modos de ler e interpretar a realidade.
Quando surge o conflito nas organizações?
Numa sociedade cada vez mais complexa e um mercado de trabalho competitivo e multifacetado, os conflitos são fenómenos naturais que surgem frequentemente. Pode ocorrer em diversas circunstâncias, destacando-se as seguintes:
- É exigido ao trabalhador ou grupo que se envolva numa atividade que é incongruente com os seus interesses ou necessidades (ex: é pedido a um funcionário contratado para realizar trabalho contabilístico que todos os dias limpe o escritório);
- A satisfação das preferências de uma parte é incompatível com a satisfação das preferências de outra pessoa ou grupo (ex: as exigências feitas pelo departamento de projetos são incompatíveis com o orçamento definido pelo departamento financeiro);
- Um indivíduo ou grupo deseja um recurso ambicionado por todos, mas cuja escassez faz com que não seja possível satisfazer plenamente as necessidades (ex: a empresa quer contratar um novo contabilista, no entanto o valor que têm disponível para pagar ao trabalhador não permite que ele tenha as qualificações pretendidas);
- As atitudes, valores, competências e objetivos de uma parte são percebidas como excluindo as atitudes, valores, competências e objetivos de outrem (ex: a entrada de um novo gestor faz com que os trabalhadores se sintam ameaçados);
- Dois indivíduos ou grupos revelam diferentes preferências a respeito de atividades conjuntas (ex: num restaurante, os empregados de mesa discordam quanto à forma como deve ser dividido o atendimento das mesas).
Pode o conflito ser positivo?
A palavra “conflito” faz emergir, frequentemente, um imaginário tendencialmente negativo. Evoca imagens de discussões, agressividade, emoções fortes. No entanto, não tem necessariamente de ser assim. O conflito pode ser positivo e, até, necessário.
A existência de conflito permite o debate de perspetivas distintas, e é neste debate e através da contribuição de diferentes visões da realidade que surge a criatividade.
Nas empresas, as equipas que melhor sabem lidar com conflitos, são equipas que operam num contexto de crescimento e mudança de forma positiva e que por isso obtêm resultados positivos. Em situações de mudança e crescimento, o conflito é um catalisador positivo para o processo. A inexistência de conflito pode levar à estagnação e funcionar como uma barreira à inovação, porque não se discutem nem debatem novas perspetivas.
Destacam-se assim diversas vantagens do conflito, quando este é funcional e construtivo:
- Melhoria do desempenho;
- Criatividade, gerada através do confronto e debate de ideias;
- Entusiasmo e motivação para o trabalho e para a produção de resultados inovadores;
- Crescimento dos trabalhadores e da própria organização;
- Competição saudável;
- Permite a análise de situações e problemas com maior clareza e profundidade, porque se tem em conta diversos pontos de vista que não tinham antes sido considerados;
- Permite o desenvolvimento pessoal e o autoconhecimento;
- Incentiva à mudança e ao crescimento.
Então, se no conflito pode residir a base da criatividade e se este pode ser positivo e transformador, porque é que é tantas vezes causador de efeitos negativos e demolidores? Porque não é, afinal, o conflito que é negativo em si mesmo, mas a sua má gestão, e a incapacidade de gestão emocional que lhe surge associada.
Quando o conflito é negativamente gerido, tornando-se disfuncional e destrutivo, verificam-se diversas consequências: crescente tensão que impede o foco nas tarefas; deterioração das relações laborais; stress e ansiedade; diminuição do desempenho e da produtividade; desmotivação; clima de desconfiança; deterioração do clima de trabalho.
Como gerir os conflitos?
Face à importância de gerir adequadamente o conflito, importa conhecer algumas estratégias que permitem que este se torne funcional e positivo:
- Compreender que cada pessoa tem o seu próprio estilo de gestão de conflito e procurar ser capaz de identificar a sua própria forma de reagir, como primeiro passo para a mudança positiva. Por exemplo, há pessoas mais impulsivas, outras que evitam tendencialmente o conflito, e outras ainda que agem de forma passiva. Compreender estas características permite realizar alterações no comportamento e, no caso de gestores e responsáveis por equipas, conciliar diferentes estilos de gestão de conflitos.
- Procurar construir uma adequada gestão emocional, sendo capaz de não reagir a provocações e pensando antes de agir. As estratégias de gestão emocional são diferentes para cada pessoa, mas podem passar por respirar fundo, afastar-se do local por momentos, visualização de imagens positivas, contar até 10, entre outras.
- Envolver-se nos objetivos de forma positiva, olhando para o conflito como um desafio a superar em conjunto, e não como uma competição. Isto exige um equilíbrio entre a firmeza aos nossos objetivos e a flexibilidade aos objetivos do outro.
- Analisar os prós e contras da sua posição pessoal e da posição da outra parte, procurando estimular a reflexão e análise conjunta. Em vez de optarem por uma das duas posições, podem fazer surgir uma nova.
- Ao invés de impor, procurar propor soluções utilizando argumentos plausíveis, permitindo também ao outro apresentar os seus argumentos.
- Ser assertivo e comunicar com clareza aspetos que lhe desagradam, bem como dar feedback face a aspetos positivos. Isto cria um clima de comunicação aberta e eficaz que permite uma melhor resolução de conflitos.
- Utilizar a escuta ativa, que consiste em ouvir o outro de forma empática e com interesse genuíno, sem interromper nem emitir juízos de valor, colocando questões pertinentes e procurando colocar-se no lugar dele enquanto o ouve.
- Separe as pessoas dos problemas, compreendendo que o problema não é a outra pessoa, mas sim a discórdia de opiniões ou posições. Isto implica também compreender que a diferença é natural e legítima e que, geralmente, nenhuma parte está mais certa que a outra, apenas interpretam de forma diferente a realidade.
- Utilize mais frases começadas por “eu” em vez de “tu”. Desta forma evita formular acusações e, em vez disso, formula a sua própria posição, opinião e sentimentos (ex: “Eu senti que não te envolveste a 100% neste trabalho” em vez de “Tu não fizeste nada”).
- Ser capaz de compreender e analisar de forma objetiva a natureza do conflito, tomando depois uma decisão quanto à melhor forma de o gerir. Por exemplo, há situações em que é preferível ceder ou não agir face ao conflito (por este ser desprovido de importância) e outras em que é necessário negociar.
Em suma, ser capaz de gerir eficazmente conflitos é sinónimo de um contexto laboral mais saudável e positivo, e impede a estagnação. Porque um conflito não resolvido é como um disco riscado: impede-nos de passar à próxima música.
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