Multitasking: um perigo para a saúde?

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O multitasking refere-se ao ato de fazermos várias coisas, ou várias tarefas, em simultâneo. Tornou-se um fenómeno cada vez mais presente e falado na sociedade atual, com o advento da tecnologia e a competitividade do mercado de trabalho. Sentimos muitas vezes que se fizermos uma coisa de cada vez, não vamos ter tempo para tudo. Mas será o multitasking algo positivo? Ou algo que nos prejudica?

Neste artigo pretendemos ajudar a responder a estas questões e esclarecer sobre o que é o fenómeno do multitasking. Boa leitura!

O que é o multitasking?

O multitasking consiste em conseguirmos fazer mais do que uma tarefa ao mesmo tempo. É um produto da sociedade moderna, em que temos de fazer várias coisas em simultâneo e correr de um lado para o outro. Parece existir uma valorização do rápido e eficaz, e a perceção de que quanto mais se faz, melhor. Esta é a realidade de muitas pessoas.

Apresentamos infra exemplos de multitasking, dos mais simples aos mais complexos:

  • Cozinhar enquanto se fala ao telefone;
  • Ver televisão e fazer scroll nas redes sociais no telemóvel;
  • Conduzir e falar ao telefone;
  • Estudar e ouvir um podcast ou uma série;
  • Fazer um relatório e falar ao telefone ou ter uma reunião por videoconferência;
  • Dar de comer a uma criança e enviar emails;
  • Conversar com um colega sobre uma questão de trabalho e escrever um relatório;
  • Entre muitas outras.

O multitasking é positivo ou negativo?

Muitas vezes falamos do multitasking como se fosse uma coisa boa, uma qualidade, um super-poder. Isto acontece porque há a perceção social de que fazer muito é fazer bem, e de que devemos estar constantemente a ser produtivos. Assim, se conseguirmos fazer várias coisas ao mesmo tempo, ótimo! Mas será que é mesmo assim?

Na realidade, o multitasking pode ser positivo se falarmos de tarefas simples e rotineiras, como por exemplo pintar as unhas enquanto se ouve música. No entanto, se falarmos em tarefas mais complexas e exigentes, o multitasking é, na realidade, prejudicial e interfere com a nossa produtividade. Assim, embora possamos ouvir falar orgulhosamente da capacidade de multitasking, o que os estudos demonstram é que o multitasking compromete o desempenho.

Um estudo da Universidade de Utah, nos EUA, demonstrou que apenas 2,5% das pessoas conseguem de forma eficaz realizar mais que uma tarefa ao mesmo tempo, com uma qualidade satisfatória. Como vemos, este é um grupo muito minoritário, o que significa que a maioria de nós, ao fazermos multitasking, estaremos a prejudicar o nosso desempenho.

Quais os perigos do multitasking?

Mas afinal, porque é que fazer várias tarefas em simultâneo pode ser prejudicial? Em primeiro lugar, o que acontece quando estamos a fazer várias coisas em simultâneo, é que a nossa atenção se divide, fazendo com que o foco não seja total para nenhuma das tarefas. O nosso cérebro não foi feito para processar várias tarefas complexas ao mesmo tempo, e isso irá gerar uma sobrecarga que diminuirá o rendimento e a produtividade.

Quando estamos a fazer mais do que uma tarefa em simultâneo, o cérebro alterna o foco entre uma coisa e outra, a uma velocidade elevada, e a sensação é de que estamos a fazer tudo ao mesmo tempo, quando na realidade não estamos. Esta atenção dividida exigida pelo multitasking faz com que o processamento da informação seja comprometido, levando a mais erros e a um desempenho inferior.

Quando o cérebro muda o foco, ele perde agilidade e capacidade, aumentando assim o risco de podermos cometer erros. Aumenta também o nível de stress, e o corpo em estado de stress liberta cortisol, o que afeta a nossa capacidade física e mental. O tempo de reação diminui.

Quanto mais frequentemente nos envolvermos em multitasking e fizermos várias tarefas ao mesmo tempo, maiores vão ser os nossos níveis de stress, que se poderão transformar em situações mais graves como por exemplo perturbações de ansiedade. Um estudo da Universidade da Califórnia mediu os batimentos cardíacos de funcionários com e sem acesso a e-mail, verificando que os que recebiam um fluxo constante de emails estavam sempre em estado de “alerta” e tinham frequências cardíacas mais elevadas.

O multitasking também prejudica a criatividade. Isto porque exige muito da nossa memória de trabalho, que é onde armazenamos temporariamente a informação, e que tem uma capacidade limitada. Quando a memória de trabalho está esgotada, isto prejudica a nossa capacidade de pensar de forma criativa e encontrar diferentes alternativas. As soluções criativas tornam-se menos prováveis.

Em suma, para fazermos qualquer que seja a tarefa de forma bem feita e eficaz, precisamos de estar focados nela e no objetivo que queremos cumprir. Se estivermos a fazer várias coisas em simultâneo, o nosso foco vai naturalmente dispersar-se, existindo perda de tempo e esforço.

Porque fazemos multitasking?

Se o multitasking aumenta o nosso stress e diminui a produtividade, porque o fazemos? A razão prende-se com o facto de muitas vezes nos sobrecarregarmos com tarefas e, como tal, termos necessidade de fazermos muita coisa, queremos adiantar trabalho e fazer tudo “para ontem”. Além disso, se tivermos um padrão de funcionamento perfeccionista, em que queremos fazer tudo perfeito e rápido, para provar a nós mesmos ou aos outros a nossa eficiência, pior será e poderemos sentirmo-nos mais impulsionados para o multitasking.

Uma outra razão para praticarmos o multitasking é que ele funciona como uma ilusão. Ou seja, apesar de fazer com que o nosso desempenho seja inferior, a perceção que temos é a de que estamos a conseguir fazer tudo. Como tal, da próxima vez teremos tendência a recorrer ao multitasking pois acreditamos que ele nos está a fazer ser mais produtivos.

As próprias empresas e organizações contribuem muitas vezes para a perpetuação de padrões de multitasking, considerando que um funcionário que consegue fazer multitasking é mais polivalente e produtivo, o que na verdade depois não se verifica. Infelizmente, o multitasking continua muitas vezes a ser uma “competência” valorizada no mercado de trabalho.

É importante aqui não confundirmos multitasking com flexibilidade e polivalência. Podemos ser capazes de nos adaptar a diferentes situações, sem que isso signifique que tenhamos de ser multitasking. É bom e positivo sermos flexíveis para lidarmos com diferentes situações e tarefas, mas devemos fazê-lo uma de cada vez e de forma focada.

Convém ainda referir que o multitasking é exacerbado e surge de mão dada com o advento e a evolução da tecnologia. Hoje em dia temos diversos estímulos em simultâneo a concorrer pela nossa atenção: o telemóvel que toca com notificações, a música a tocar, os e-mails a cair… É difícil gerir a nossa atenção. Por este mesmo motivo, as gerações atuais têm uma maior tendência ao multitasking e parecem ter maior agilidade em acompanhar várias atividades ao mesmo tempo. No entanto, isto não significa que seja algo positivo. Na realidade, o que se verifica é que os jovens das gerações mais novas têm mais dificuldades em termos de atenção e concentração. Estabelecer um foco de atenção é uma tarefa difícil para os jovens, que se aborrecem com mais frequência com as tarefas rotineiras.

Assim, controlar o impulso e a tendência para o multitasking não é fácil, mas é possível e requer, em primeira instância, que consigamos compreender porque é que esta forma de funcionar não é benéfica.

Como quebrar o padrão de multitasking?

Depois de ganharmos consciência de que o multitasking é prejudicial e não está, de forma nenhuma, a ajudar-nos, podemos então procurar quebrar este padrão. Para isso, é importante que criemos um sistema de organização e planeamento das nossas tarefas. Esse planeamento inclui não apenas listar e definir as tarefas que temos para fazer, mas também ser capaz de definir prioridades, ou seja, perceber que tarefas devem ser feitas primeiro e quais devem ser feitas depois.

O nosso planeamento de tarefas deve ter em conta não só o que temos para fazer e o tempo disponível, mas também o facto de que precisamos de descansar e fazer pausas. Ninguém é produtivo se estiver cansado, sobrecarregado e stressado. Por isso, precisamos de tempo para nós, tempo para permitir ao nosso cérebro reestabelecer-se. Pequenas pausas entre tarefas são úteis também para manter a atenção e concentração e fomentar o desempenho. Por isso, entre tarefas deve tentar fazer uma pausa de pelo menos 5 minutos.

A alternativa ao multitasking é fazermos uma coisa de cada vez, de forma focada, atenta e objetiva. Quando temos um objetivo em mente, o nosso esforço é dirigido especificamente a esse objetivo, o que aumenta a probabilidade de sermos bem-sucedidos. Apesar da sensação de que fazer várias coisas ao mesmo tempo é mais rápido, na realidade o foco individual numa tarefa torna a sua execução mais rápida e eficaz. De facto, um estudo demonstrou que o multitasking pode fazer com que o tempo de realização de uma tarefa aumente em 40%.

Assim, em alternativa ao multitasking devemos realizar tarefas de forma sequencial, ou seja, definir um planeamento por prioridades e realizar as tarefas numa sequência lógica, de forma objetiva e focada.

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.