A solidão é algo assustador e que pode estar na origem de diversos medos e, consequentemente, desencadear vários comportamentos para a evitar. No entanto, nem sempre estar sozinho é uma coisa má. O medo de estar sozinho pode ser comum e limitador, chegando ao extremo de não conseguirmos estar na nossa própria companhia.
Neste artigo pretendemos explorar porque é que o medo de estar sozinho acontece, quando é normativo e quando pode ser um problema, e como o podemos gerir.
Porque temos medo da solidão?
O ser-humano é um ser social por natureza, pelo que é natural que a solidão seja algo negativo e que tendemos a evitar. Assim, é comum termos medo da solidão, que por sua vez faz emergir sentimentos de insegurança, receio e tristeza.
O medo de estar sozinho é assim comum à experiência humana, e não é algo novo nem raro. Acontece em todas as fases da vida, embora possa ser especialmente marcado em fases como a velhice ou a adolescência. A solidão também não é algo raro e incomum, já que todos podemos sentir solidão em algum momento da vida.
É importante compreender que é diferente estar só e sentir-se só. Ou seja, o medo de estar sozinho pode não advir diretamente de estar literalmente sozinho, sem pessoas à volta, mas sim da sensação de falta de conexão com outras pessoas. Podemos estar acompanhados e sentirmo-nos sós, quando por exemplo não sentimos identificação, compreensão ou conexão com as pessoas que nos rodeiam. Por outro lado, também podemos estar sem pessoas à nossa volta e sentirmo-nos bem, porque sabemos que há pessoas que nos amam e com as quais temos uma conexão e um vínculo.
As causas para o medo de estar sozinho podem ser diversas, mas parece claro que a era digital em que vivemos tende a acentuar este medo de estar sozinho. As redes sociais mostram-nos vidas preenchidas onde toda a gente parece ter sempre muitos amigos ou eventos interessantes, quando na realidade cada um só mostra a parte mais bonita e interessante da sua vida. Isto pode cultivar um sentimento de comparação constante e uma sensação de solidão bem como o medo de estar sozinho. Além disso, o distanciamento físico derivado do uso dos meios de comunicação virtuais pode também acentuar o medo de estar sozinho.
É mais comum sentir o medo de estar sozinho em momentos de mudança, em que muitas coisas se alteram na sua vida – por exemplo, fim de uma relação, mudança de emprego, mudança de cidade – e isso pode abalar a autoconfiança e trazer receios.
Outros fatores que podem estar na origem do medo de estar sozinho podem ser traumas ou experiências adversas ao longo da vida, como por exemplo ter estado distanciado ou afastado dos pais, o abandono parental e situações de abuso, negligência ou violência psicológica durante a vida.
Quais os sinais de que tem medo de estar sozinho?
Por vezes podemos não ter total consciência de que temos medo de estar sozinhos, e é importante identificarmos que este medo está presente para o podermos aprender a gerir. Assim, alguns sinais que podem indicar que tem medo de estar sozinho são:
- Encher a sua agenda de forma a não ter nenhum momento “vazio” ou parado;
- Estar sempre a marcar coisas, saídas e eventos, para evitar estar em casa ou ficar “sem nada para fazer”;
- Envolver-se em relações vazias só para “tapar buracos”;
- Tornar-se excessivamente dependente nas relações amorosas ou de amizade;
- Não estar praticamente tempo nenhum solteiro, entre relações, passando de uma relação para a outra;
- Fazer de tudo para não perder as relações, mesmo que elas sejam negativas para si;
- Sentir-se mal consigo mesmo se não tem planos combinados com ninguém;
- Sofrer excessivamente com uma zanga, conflito ou com o fim de uma relação;
- Não conseguir resolver problemas ou desafios sem ser com a ajuda de outra pessoa.
Quando é que o medo de estar sozinho é um problema?
Como vimos, o medo de estar sozinho pode ser algo natural e comum a todos os seres humanos em determinada altura. Todos podemos, em determinadas circunstâncias, sentir medo de estar sozinho. No entanto, é importante distinguir quando é que este medo pode ser algo normativo que podemos gerir e ultrapassar, ou quando constitui um problema que pode requerer ajuda profissional, nomeadamente de um psicólogo.
Quando o medo de estar sozinho evolui para um quadro persistente e doentio, pode assumir a forma de fobia. O medo de estar sozinho ou a fobia da solidão designa-se de emerofobia. Nestes casos, há uma necessidade persistente e contínua de estar com alguém como forma de aliviar o mal-estar e o sofrimento emocional. Pode até existir, associado ao medo de estar sozinho, uma sensação de ansiedade intensa ou mesmo de pânico, que impede a pessoa de estar sozinha nem que seja por breves períodos de tempo.
Os sintomas que a pessoa pode sentir quando está sozinha ou quando tem medo de estar sozinha são:
- aceleração cardíaca;
- dificuldade em respirar e tonturas;
- aumento da sudorese;
- tremores;
- dores de cabeça;
- pensamentos obsessivos;
- dificuldade em dormir;
- confusão mental.
Como intervir e tratar o medo de estar sozinho?
Quando o medo de estar sozinho é um problema e se torna patológico, verificando-se a presença de um quadro de emerofobia, a ajuda profissional é fundamental e deve existir um acompanhamento por parte de um psicólogo. Quanto mais precocemente se iniciar a intervenção, melhores serão os resultados.
Na intervenção psicológica inicialmente serão identificadas as causas deste medo de estar sozinho e os mecanismos que mantém o medo, por forma a poder depois introduzir a mudança e dotar a pessoa de mecanismos e estratégias para regular o medo e readquirir o controlo emocional.
Como ultrapassar o medo de estar sozinho?
Ultrapassar o medo de estar sozinho implica, por um lado, o manter relações positivas com outras pessoas e, por outro, o desenvolvimento da capacidade de apreciar a própria companhia. Assim, apresentamos algumas dicas importantes:
- Compreenda a origem do seu medo de estar sozinho: todos somos diferentes e o nosso medo da solidão pode ser motivado por questões distintas. Assim, é importante que procure compreender porque sente este medo, o que está na sua origem. Se for difícil compreender ou se algum trauma ou situação adversa estiver na base do seu medo de estar sozinho, pode ser importante procurar psicoterapia;
- Distinga o seu estado emocional: nomeadamente, procure compreender que não é a mesma coisa estar sozinho ou sentir-se sozinho. Assim, procure ter em consideração se o que está a sentir é necessidade de ter relações significativas e conexão emocional, ou apenas tem receio de estar sozinho fisicamente por algum outro medo. Compreenda que estar sozinho fisicamente é algo temporário e que não tem de ser mau, pois nesses momentos pode aproveitar para fazer coisas de que gosta e que até podem ser melhor desfrutadas estando na sua companhia;
- Não idealize as outras pessoas e a companhia delas: ou seja, perceba que as outras pessoas não são perfeitas, que há relações que não são positivas e que às vezes, como diz o ditado, “mais vale só que mal-acompanhado”;
- Confie em si e nas suas capacidades: muitas vezes o medo de estar sozinho advém do facto de se sentir inseguro ou achar que não é capaz de formar novas relações ou que não é interessante o suficiente para que alguém goste de si e queira estar na sua companhia. Assim, é importante que acredite mais em si, que confie mais no seu valor e nas suas capacidades;
- Aprenda a apreciar a sua própria companhia: não está só porque tem a sua própria companhia, e é muito importante que a saiba apreciar, já que é consigo que estará para toda a vida. Assim, compreenda que estar sozinho não é o mesmo que estar só, e que saber apreciar a sua companhia é muito importante e pode ser bastante libertador. Escolha atividades de que gosta e aprecie na sua própria companhia, seja passear, caminhar pela cidade, ir ao cinema, ler um livro, assistir a um filme, viajar, almoçar num bom restaurante, ver o pôr-do-sol… Além disso, aproveite os momentos em que está consigo mesmo para praticar a reflexão e a introspeção, para se descobrir, para se conectar consigo mesmo;
- Não se isole: por vezes quando nos sentimos mais deprimidos ou menos bem, podemos ter tendência ao isolamento. O isolamento constitui um fator de risco para problemas emocionais, como a depressão. Assim, tente encontrar um equilíbrio. Não precisa de estar sempre rodeado de pessoas, mas também não se deve isolar de forma recorrente;
- Seja útil: ou seja, procure ajudar e contribuir positivamente para os outros e para a sociedade de forma geral, seja através do seu trabalho ou das relações pessoais, ajudando um amigo ou a sua família, ou mesmo fazendo voluntariado;
- Adote hábitos de vida saudáveis: como em qualquer medo, também o medo de estar sozinho é influenciado pelos hábitos de vida que adotamos. Assim, se tivermos hábitos de vida saudáveis, em termos de sono, atividade física, alimentação, sentir-nos-emos melhores connosco próprios;
- Envolva-se em atividades sociais positivas: sejam atividades de grupo, ou um jantar ou café com amigos, é importante que a nossa vida social exista e seja saudável e equilibrada. Como vimos, somos seres sociais por natureza, pelo que o domínio social é uma parte importante da nossa vida;
- Reconecte-se com pessoas com as quais não fala há algum tempo: uma forma positiva de gerir e ultrapassar o medo de estar sozinho é a recuperação de contactos e relações que, por via das circunstâncias, por vezes descuramos. Muitas vezes afastamo-nos de pessoas não porque nos zangamos com elas, mas porque as circunstâncias da vida conduziram a um certo afastamento. Tente ligar a um amigo que já não fala há algum tempo, ou combinar um jantar para juntar o seu antigo grupo de amigos da faculdade, por exemplo;
- Procure focar-se e viver mais centrado no presente: o medo de estar sozinho é um medo mais voltado para o futuro, a antecipação de uma solidão que receamos existir. Assim, o foco no momento presente e o mindfulness são estratégias importantes para aprender a gerir este medo. Procure viver um dia de cada vez: