Musicoterapia: descubra os benefícios terapêuticos da música

musicoterapia

A música é uma arte que tem a capacidade de impactar nas nossas emoções. A música pode-nos fazer sentir coisas muito diversas e, como tal, pode e é muitas vezes usada como estratégia de gestão emocional.

Ouvimos música para nos animarmos, para expressarmos aquilo que estamos a sentir, para refletirmos… Como tal, a música é o ingrediente principal de um tipo de terapia que é a musicoterapia, indicada para diferentes problemáticas e objetivos. Neste artigo iremos explicar o que é a musicoterapia, quais as suas aplicações e benefícios.

Porque é que a música é tão poderosa?

Produzir ou ouvir música envolve praticamente todas as nossas funções cognitivas e produz mudanças ao nível da bioquímica do organismo. A música tem o poder de projeção, sugestão, catarse, realização de desejos inconscientes, função estruturante do eu e meio de comunicação e expressão. Daí que a musicoterapia tenha surgido e que se tenha percebido os benefícios terapêuticos da música.

Podemos encontrar componentes da música no nosso próprio funcionamento enquanto seres-humanos. Os nossos corpos têm tom, ritmo, pulsação, tensão, ações, intenções, padrões, repetições… No fundo, tal como a música. Cada pessoa pode ser entendida como sendo construída por ritmos, padrões e contornos melódicos únicos.

A música tem uma forte e poderosa capacidade de expressão, evocação e associação. Por isso, pode funcionar como um meio de expressão e uma ferramenta para desenvolvermos a nossa identidade e a comunicação com o mundo e com os outros. Muitas vezes associamos determinadas músicas ou melodias a recordações e momentos da nossa história de vida, assim como nos identificamos com determinadas músicas e elas acabam por refletir a nossa identidade. Quem nunca sentiu como se a música tivesse sido escrita especialmente para si ou comunicasse consigo?

A música tem também o poder de evocar em nós sensações, imagens, pensamentos e emoções, dotando até o espaço e o tempo de uma outra dimensão. É muitas vezes uma espécie de ponte entre o consciente e o inconsciente. É por este poderoso efeito da música que a musicoterapia faz sentido e é amplamente utilizada.

É bom as crianças aprenderem música?

O ensino musical está inserido nos currículos escolares por um motivo. As crianças não precisam de querer ser artistas ou seguir música para beneficiarem da aprendizagem da música.

Aprender música ajuda a desenvolver as capacidades de aprendizagem da criança, a sua criatividade, a capacidade de trabalhar em equipa, a expressão e expressividade, a ultrapassar o medo de desafios, a relaxar, a promover a concentração, a potenciar o desenvolvimento cerebral, a fomentar as capacidades motoras… Também permite aumentar a compreensão e o desempenho noutras áreas, como a matemática.

A nível pessoal aprender música vai ajudar também a criança a ter uma melhor autoestima, relacionamentos mais harmoniosos com os outros, a ser mais responsável e disciplinada e a desenvolver a sua capacidade de imaginação e criatividade.

O que é a musicoterapia?

Apesar de ser um termo algo recente, na realidade a música é usada como ferramenta terapêutica desde a antiguidade. Existiam inclusivamente rituais de cura que incluíam som e música, em diversas culturas. Após a Primeira Guerra Mundial foram usados músicos na intervenção com veteranos de guerra, sendo que a música contribuía para a reabilitação física e mental destes doentes.

A musicoterapia pode ser definida como um processo de intervenção sistemático, no qual o terapeuta auxilia o paciente (cliente ou utente, como queiramos chamar) a atingir determinados resultados e a alcançar níveis mais elevados de bem-estar, por meio de experiências musicais.

No fundo, musicoterapia é o uso da música e dos seus elementos, ou seja, melodia, som, ritmo e harmonia, para efeitos terapêuticos, que podem ser promover e facilitar a comunicação, a reflexão pessoal, a aprendizagem, a expressão, bem como responder a necessidades emocionais, psicológicas, sociais e cognitivas. A musicoterapia procura desenvolver ou restabelecer funções da pessoa para que esta possa alcançar níveis saudáveis de bem-estar e qualidade de vida.

Na musicoterapia, os processos musicais são equivalentes aos processos psíquicos e podemos considerar a personalidade e as características psicológicas dos indivíduos como sendo análogas às modalidades de expressão musical. Assim, na musicoterapia o pensamento é traduzido em música, sendo esta uma forma rica de expressão. A música funciona como um estímulo mediador que é capaz de proporcionar respostas não musicais, nomeadamente pensamentos, afetos e processos sensoriomotores.

Quais os objetivos da musicoterapia?

O objetivo global da musicoterapia, tal como qualquer outra terapia, é a promoção do bem-estar do paciente. Podemos ainda identificar objetivos específicos da musicoterapia:

  • Explorar o conhecimento e a consciência do corpo como produtor de sons e movimentos;
  • Trabalhar e explorar o conteúdo e os ritmos da música das canções para identificar e trabalhar aspetos emocionais;
  • Utilizar a música e as suas diferentes possibilidades sonoras para auxiliar a expressão emocional e a expressividade;
  • Estimular o sentido rítmico e a lateralidade;
  • Promover a criatividade;
  • Promover o autoconhecimento e a reflexão interior;
  • Estimular a capacidade de relaxamento e equilíbrio.

Que modelos de musicoterapia existem?

Existem diferentes modelos ou abordagens de musicoterapia, pelo que passaremos a apresentar brevemente os principais:

  • Musicoterapia criativa ou de improvisação – utiliza vários instrumentos ou o canto, recorrendo à improvisação. A improvisação inclui não apenas o paciente, mas também o terapeuta, formando-se assim uma interação entre ambos. Neste tipo de musicoterapia são criados recursos musicais que são usados nas sessões terapêuticas e o paciente é incentivado a fazer música de forma criativa e livre;
  • Modelo GIM – foca-se na capacidade de provocar sinestesia musical como estados alterados de consciência ou usar a música para alcançar diferentes níveis de consciência. Esta abordagem baseia-se, assim, em ouvir música estando num estado relaxado por forma a criar imagens ou emoções. Trabalha com o relaxamento profundo e diferentes estados de consciência como forma de facilitar a transformação pessoal;
  • Modelo analítico – através da música como símbolo e ferramenta criativa, o paciente explora a sua história de vida e aumenta o seu autoconhecimento;
  • Modelo Benenzon – utiliza expressões sonoras, corporais e não-verbais para estabelecer uma ligação e dinâmica entre o terapeuta e o paciente;
  • Modelo Behaviorista – para esta abordagem a música funciona como um reforço para o comportamento. Nesta abordagem, através da análise de padrões do comportamento da pessoa, é definida uma intervenção personalizada com recurso à música.

A quem se aplica a musicoterapia?

Todas as pessoas podem beneficiar de um processo de musicoterapia já que a música traz benefícios diversos e transversais. No entanto, enquanto programa de intervenção, a musicoterapia é especialmente aplicada a alguns grupos populacionais e a algumas problemáticas:

  • Pessoas que apresentam dificuldades sensoriomotoras;
  • Dor crónica – um estudo científico realizado nos EUA demonstrou que os pacientes que participaram num programa de musicoterapia tiveram uma redução de 21% nas suas dores por comparação àqueles que não participaram no programa;
  • Pessoas com deficiência mental – a musicoterapia é útil nestes casos, promovendo as competências sociais, estimulando funções cognitivas como a memória e promovendo a plasticidade cognitiva;
  • Recuperação após cirurgia – a música pode exercer efeitos sedativos e relaxantes. Num estudo científico verificou-se que pacientes em recuperação após cirurgia, ao ouvirem música e passarem por um processo de musicoterapia, tinham uma acentuação dos efeitos sedativos, com menor necessidade de recorrer a analgésicos e diminuição de hormonas do stress;
  • Autismo;
  • Dificuldades ou problemas de linguagem – a utilização do canto na musicoterapia é uma forma de combater problemas de linguagem. O canto é por exemplo usado na gaguez, uma vez que liberta a pessoa da ansiedade normalmente sentida ao falar ou comunicar;
  • Doentes com paralisia cerebral;
  • Problemas psiquiátricos – ansiedade, depressão, entre outros;
  • Pessoas com diversas dificuldades emocionais;
  • Crianças com hiperatividade ou com problemas de comportamento;
  • Gravidez – a musicoterapia pode ser um dos métodos usados como suporte na gravidez, já que este é um período de vida marcado por mudanças físicas, hormonais e também emocionais. A musicoterapia pode trazer benefícios para o parto e o pós-parto, nomeadamente relaxamento, alívio da dor, maior capacidade de adaptação e redução da ansiedade. Também na relação entre a mãe e o bebé a musicoterapia pode apresentar benefícios, para o bem-estar de ambos e para a vinculação.
  • Idosos – a musicoterapia nos idosos ajuda a promover e manter as funções cognitivas, prevenindo os efeitos adversos do envelhecimento e a perda de capacidades;
  • Casos de demência – a musicoterapia apresenta benefícios ao nível da estimulação cerebral, potenciando funções cognitivas diversas e melhorando capacidades de atenção, perceção, memória, linguagem…

Quais os benefícios da musicoterapia?

Como vimos, a música tem impacto na forma como nos sentimos e pode ser benéfica para o nosso bem-estar e qualidade de vida. Existem diversos benefícios específicos da musicoterapia:

  • Diminuição do stress e da ansiedade;
  • Melhoria do humor e dos níveis de energia;
  • Promoção do equilíbrio e da homeostase;
  • Melhoria da coordenação e resistência física;
  • Indução do relaxamento;
  • Melhoria da concentração e de outras funções cognitivas;
  • Apuramento dos sentidos, nomeadamente de sensações táteis, auditivas, visuais, olfativas ou gustativas;
  • Alívio de dores e queixas somáticas;
  • Estimulação da capacidade de aprendizagem;
  • Melhoria da memória;
  • Fomentar competências sociais e de relacionamento interpessoal;
  • Fortalecimento do sistema imunitário.

A música tem influência em diversos sistemas e órgãos do nosso corpo. Estudos científicos revelam que a música influencia positivamente o nosso sistema nervoso central, o sistema nervoso autónomo, o sistema endócrino e as funções de diversos órgãos internos. Esta influência revela-se nas alterações que a música provoca a nível de: ritmo cardíaco, tonicidade muscular, pressão arterial, metabolismo, equilíbrio término…

Que profissionais aplicam a musicoterapia?

A musicoterapia pode ser aplicada por diferentes profissionais com formação base em saúde ou educação, tais como médicos, psicólogos, terapeutas da fala, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas ou professores / educadores. Para além da formação base, é importante que estes profissionais façam formação complementar especializada em musicoterapia para que estejam aptos a aplicar a musicoterapia como forma de intervenção.

Existem formações específicas e pós-graduações na área da musicoterapia. Geralmente esta formação incluirá conhecimentos específicos de música, já que o musicoterapeuta deve dominar alguns conhecimentos musicais para poder implementar de forma eficaz a musicoterapia.

A musicoterapia pode ser desenvolvida de forma multidisciplinar em equipas de saúde, mas também pode ser aplicada de forma autónoma pelo profissional na sua prática clínica.

Como funciona um processo de musicoterapia?

A musicoterapia é um programa terapêutico, de intervenção, que pode ser aplicada de formas distintas mediante a abordagem, o contexto e os objetivos específicos.

A musicoterapia pode ser aplicada em modalidade individual e em grupo, tendo cada uma destas modalidades as suas vantagens e desvantagens. Na modalidade individual é possível um trabalho mais personalizado e adaptado às necessidades específicas do paciente. Por outro lado, na modalidade em grupo é possível reforçar as competências sociais e promover a comunicação e os relacionamentos com os outros.

A musicoterapia pode ser feita através de uma abordagem mais passiva ou mais ativa. Se o processo de musicoterapia for mais passivo, o paciente geralmente ouve música ou sons, enquanto que num processo de musicoterapia mais ativo o paciente pode interagir com instrumentos musicais e ser ele a produzir sons ou música.

A musicoterapia pode recorrer a diversos recursos e objetos distintos. Podem ser utilizados instrumentos musicais, objetos musicais para fazer ritmos, locais para as pessoas se deitarem por forma a induzir o relaxamento, objetos de emissão de som, aparelhos de canto e gravação… Enfim, há uma multiplicidade de recursos que podem ou não ser utilizados mediante os objetivos, as necessidades do paciente e a abordagem do terapeuta na musicoterapia.

Exemplos de técnicas usadas em musicoterapia

Para compreendermos melhor como funciona a musicoterapia, podemos explorar algumas técnicas utilizadas, o que nos permite ter uma perceção mais clara de um processo ou de uma sessão de musicoterapia.

Para promover a empatia e competências de interação com o outro, que pode ser um objetivo em si mesmo ou uma forma de reforçar a relação terapêutica, entre o musicoterapeuta e o paciente, podem usar-se técnicas como:

  • Imitar, por exemplo imitando ou reproduzindo o som emitido pela outra pessoa;
  • Incorporar: o terapeuta usa um comportamento musical do paciente para fazer uma improvisação;
  • Sincronizar: terapeuta e paciente fazem o mesmo padrão sonoro ao mesmo tempo;
  • Reflexão: o terapeuta procura encontrar elementos musicais que reflitam o estado emocional do paciente;
  • Regulação: regular a música, a sua intensidade e velocidade, aos níveis de energia do paciente;
  • Partilhar instrumentos ou tocar um instrumento de forma cooperativa.

Para promover e facilitar a expressão ou expressividade do paciente, podem ser usadas técnicas como:

  • Criação de espaços: deixar espaços na estrutura musical ou na improvisação para que o paciente complete esses espaços;
  • Estender: adicional algo ao final da resposta do paciente para complementá-la;
  • Criação: incentivar o paciente a criar um padrão musical ou mesmo uma música que se reflita a si mesmo e seja uma espécie de autorretrato musical;
  • Improviso: incentivar o paciente a improvisar de acordo com o se estado emocional ou com algum tema da sua vida;
  • Usar a analogia: após uma improvisação pedir ao paciente que identifique uma situação da sua vida que seja análoga à experiência de improvisação;
  • Simbolizar: pedir para o paciente utilizar algo musical, como uma música ou um instrumento, para representar algo pessoal, como um acontecimento ou uma pessoa;
  • Associação livre: pedir ao paciente para dizer o que lhe vier à mente ao ouvir um som ou música;
  • Projeção: pedir ao paciente para improvisar uma música que represente uma situação, um sentimento, uma recordação…
  • Fantasiar: pedir ao paciente para improvisar uma história, fantasia ou sonho.

Posso usar a música como terapia?

Embora a musicoterapia seja um método terapêutico específico que carece de um profissional especializado e de um plano de intervenção, todos podemos colher os benefícios da música de uma forma relativamente simples, incluindo-a no nosso dia-a-dia.

Algumas dicas que pode utilizar para obter os benefícios da música:

  • Reserve uns minutos todos os dias para se deitar ou sentar numa posição confortável, colocar uma música que o deixe especialmente relaxado ou lhe traga emoções positivas, e dedique-se a focar toda a sua atenção apenas na música, enquanto controla a sua respiração e realiza algumas respirações profundas;
  • Explore e descubra os seus gostos musicais, descubra diferentes músicas, estilos musicais, cantores, compositores…
  • Explore diferentes sons, por exemplo, quando estiver a caminhar ou na natureza, feche os olhos e procure identificar e conectar-se com os diferentes sons que consegue captar;
  • Faça uma lista de músicas e associe a cada uma delas uma emoção diferente que essa música o faz sentir;
  • Procure aprender um novo instrumento;
  • Da próxima vez que ouvir música, foque realmente a sua atenção na música, como se a estivesse a ouvir pela primeira vez, e tente captar ritmos, alterações, padrões…

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.