A psicologia positiva é uma das correntes ou abordagens da psicologia positiva, que tem vindo a assistir a um crescimento e expansão. Por, no quadro da história, ser relativamente recente, que carece ainda se uma base científica robusta, é uma abordagem que pode ainda gerar dúvidas ou não ser tão conhecida por todos. Com este objetivo, iremos neste artigo explicar o que é a psicologia positiva.
O que é a psicologia positiva?
A psicologia positiva é uma abordagem da psicologia que se foca nos aspetos positivos da mente humana, valorizando o que há do bom no indivíduo, sem ainda assim minimizar o seu sofrimento, e usando essas forças como alavancas para a cura.
A psicologia positiva estuda os processos e as condições que permitem que as pessoas, grupos e comunidades prosperem. Quando aplicada em termos terapêuticos, a psicologia positiva não é um “tipo” ou “género” de psicoterapia, mas antes uma reorientação terapêutica que complementa a abordagem usada pelo psicoterapeuta.
Se olharmos o curso da história da psicologia, podemos perceber que ela evoluiu num sentido que permitiu abarcar abordagens como a psicologia positiva. Evoluiu de uma ciência sobretudo curativa que se preocupava essencialmente no tratamento de problemas psicológicos, para uma ciência abrangente preocupada com o bem-estar, a qualidade de vida, as emoções positivas e o propósito de vida.
Outras abordagens de tratamento da psicologia têm-se focado sobretudo na exploração e intervenção dos problemas que os pacientes apresentam. Estas abordagens terapêuticas baseiam-se muitas vezes em explorar traumas do passado, pensamentos ou crenças negativos e limitadores, padrões de comportamento disfuncionais… Há, portanto, um maior foco nos aspetos negativos, o que pode criar o risco de que os aspetos positivos sejam negligenciados.
A psicologia positiva vem colocar a ênfase nesses aspetos positivos pretendendo que as pessoas não deixem apenas de estar menos ansiosas ou menos deprimidas, mas que passem a ter maior bem-estar. Assim, o foco está na promoção e em potenciar aspetos positivos, mais do que em eliminar ou minimizar aspetos negativos.
De facto, a psicologia positiva preconiza que as pessoas podem ser melhor compreendidas se se focarem e aprenderem a usar os seus pontos fortes e os seus recursos positivos para enfrentar os desafios e obstáculos. Assim, alguns dos objetivos importantes da psicologia positiva, designadamente quando aplicada ao processo terapêutico:
- Conhecer e identificar os pontos fortes individuais;
- Adquirir competências necessárias para o cultivo das emoções positivas;
- Promover e fortalecer relações saudáveis;
- Encontrar e incluir significado e propósito na vida de uma forma empoderadora, motivadora e terapêutica.
Porque é a psicologia positiva tão importante?
A psicologia positiva é importante, em primeiro lugar, pois permite-nos melhor compreender o ser-humano do ponto de vista do seu potencial, descobrindo e investigando o seu funcionamento e os fatores que contribuem para potenciar a felicidade, a qualidade de vida e o bem-estar. Se nos focarmos apenas no que está mal, no sofrimento psicológico ou no mal-estar, teremos dificuldade em compreender de forma completa e abrangente como promover o bem-estar em todas as pessoas, mesmo aquelas que não estejam especificamente a atravessar um período difícil.
Além disso, em termos terapêuticos, os estudos científicos demonstram que a psicoterapia apresenta sim eficácia comprovada, no entanto essa eficácia não é sempre de 100%, e um dos motivos poderá ser porque o foco nos problemas não servirá a todas as pessoas. Assim, a psicologia positiva permite expandir e reforçar a eficácia da psicoterapia, melhorando os seus resultados.
Com a psicologia positiva, a psicoterapia pode passar a incluir e a focar-se em objetivos como o desenvolvimento pessoal dos pacientes (ou utentes / clientes, como se preferir designar), estejam estes ou não numa fase de maior desafio psicológico. E qualquer pessoa pode beneficiar de um processo de desenvolvimento pessoal com vista à melhoria da sua qualidade de vida e ao desenvolvimento do seu potencial. A psicologia positiva procura avaliar e fortalecer os pontos fortes, capacidades, competências, aptidões e talentos.
Ao serem focadas e potenciadas as forças e os recursos positivos das pessoas, isso permitirá prevenir o surgimento de sofrimento psicológico no futuro e também o surgimento de uma possível perturbação psicológica. Ao potenciar o que a pessoa tem de mais positivo, esta torna-se mais resiliente, mais capaz de enfrentar as adversidades, e incrementam também os seus níveis de bem-estar e de qualidade de vida.
As virtudes e forças defendidas pela psicologia positiva
Como vimos, a psicologia positiva foca-se sobretudo nos pontos fortes, ou forças, das pessoas com o objetivo de potenciá-las e utilizá-las para ajudar a pessoa a atingir maiores níveis de bem-estar, felicidade e qualidade de vida.
Os autores que primeiramente desenvolveram esta abordagem defendem a existência de 6 virtudes, dentro das quais se inserem 24 forças de caráter:
- Sabedoria e conhecimento – diz respeito a capacidades cognitivas relacionadas com a aquisição e o uso do conhecimento. Dentro desta virtude inserem-se as seguintes forças:
- Criatividade – diz respeito à capacidade para pensarmos de uma forma nova e produtiva, a conseguirmos encontrar um comportamento diferente ou uma solução nova e adequada para os nossos objetivos;
- Curiosidade – corresponde ao interesse pelas diversas experiências e acontecimentos, à procura pela novidade e à abertura à experiência. É o interesse intrínseca que temos por conhecer o mundo, os outros e a nós mesmos;
- Originalidade – é a capacidade de pensar nas coisas por meio de novas perspetivas;
- Gosto pela aprendizagem – implica dominar novos assuntos, temas e competências e gostar de aprofundar o conhecimento;
- Empatia – é a capacidade de se colocar no lugar do outro e compreendê-lo de forma genuína.
- Coragem – engloba as forças emocionais implicadas no exercício da vontade para atingir objetivos e metas, para seguir em frente apesar das dificuldades e para não evitar situações que geram mais medo ou desconforto, e inclui as seguintes forças:
- Autenticidade – dizer a verdade e apresentar-se de uma forma genuína;
- Ousadia – ser capaz de aceitar e confrontar-se com desafios e obstáculos;
- Persistência – persistir naquilo que se pretende alcançar e levar até ao fim determinada tarefa ou objetivo;
- Entusiasmo – viver de uma forma entusiástica e enérgica.
- Bondade – diz respeito a capacidades interpessoais que incluem colaborar e cooperar com os outros e agir de forma positiva perante estes, incluindo as seguintes forças:
- Amor – valorização da aproximação afetiva dos outros;
- Inteligência social – consciência das motivações e emoções das outras pessoas.
- Justiça – engloba as seguintes forças:
- Equidade – ser capaz de tratar os outros de forma justa de acordo com as noções de justiça e lealdade;
- Liderança – ser capaz de organizar e liderar atividades grupais;
- Trabalho de equipa – ser capaz de cooperar com outras pessoas na concretização de um objetivo em comum.
- Moderação – diz respeito às capacidades que permitem evitar os excessos e incluem as seguintes forças:
- Perdão – conseguir perdoar as pessoas quando erram;
- Modéstia;
- Prudência – fazer escolhas ponderadas e pensadas, em vez de impulsivas;
- Autocontrolo – conseguir controlar de forma saudável os comportamentos e ações.
- Transcendência – inclui as seguintes forças:
- Apreciar a beleza e a excelência;
- Gratidão – estar consciente dos aspetos positivos da vida e agradecer por eles;
- Esperança – esperar o melhor e procurar alcançá-lo;
- Humor – manter um ânimo e humor positivo e conseguir enfrentar as situações com humor;
- Espiritualidade – crenças que fazem sentido para a pessoa em termos de propósito e significado da vida.
O método PERMA na psicologia positiva
Para além das virtudes e forças, um outro conceito importante dentro da psicologia é o método PERMA, um modelo que organiza o bem-estar em cinco componentes que são mensuráveis. Estas cinco componentes ou elementos são considerados essenciais para que a pessoa possa usufruir de um bem-estar mais duradouro. Estas cinco componentes são:
- Emoções positivas – diz respeito à capacidade de sentir emoções positivas como alegria, felicidade, satisfação, orgulho, serenidade, confiança, otimismo, gratidão ou segurança. Para que a pessoa possa experienciar estas emoções deve cultivar hábitos e comportamentos específicos na sua vida. As emoções positivas têm um papel muito importante para sermos capazes de pensar de forma mais flexível e criativa. Além disso, as emoções positivas permitem uma maior resiliência, maior longevidade, melhor qualidade de vida…
- Envolvimento – diz respeito à capacidade para nos mantermos atentos e conscientes no presente e naquilo que estamos a fazer. Envolver imergir de forma profunda nas atividades para experimentarmos uma sensação de flow, ou seja, um estado ideal onde se verifica uma concentração precisa, um foco ativo e uma motivação interior. Podemos começar por praticar esta capacidade através de atividades intensas e positivas, tais como desporto, dança, xadrez, arte, música, literatura, atividades espirituais, cozinhar, brincar com uma criança, interações sociais…
- Relações – corresponde à quantidade e qualidade de relações que estabelecemos com os outros, sendo fundamental para o nosso bem-estar que tenhamos relações positivas e seguras. O ser-humano é um ser social e, por isso, precisa de ter contacto com outras pessoas e tem uma necessidade de pertença. Nesta dimensão é mais importante a qualidade das relações que temos, do que propriamente a quantidade;
- Significado – corresponde ao uso das nossas qualidades e características individuais para atingir um significado e propósito. Ou seja, agirmos em prol de um propósito pessoal, dos nossos valores e princípios. Quando procuramos o sucesso através de atividades ou tarefas que nos conectam com os nossos objetivos superiores, vivemos uma vida mais significativa e, por consequência, mais satisfatória. Isto pode ser atingido por meio das relações interpessoais, pelo trabalho, pela espiritualidade, pela criatividade, pela meditação…
- Realizações – é a capacidade de atingirmos metas e objetivos e analisarmos o que conseguimos alcançar, alcançando um sentido de orgulho pessoal e de gratidão. É a procura de sucesso, competência e domínio. O sentimento de realização requer que utilizemos ativamente as nossas forças pessoais e procuremos oportunidades.
Os estudos científicos têm demonstrado que o cumprimento das dimensões do método PERMA está associado a níveis mais baixos de sintomatologia e a níveis mais elevados de satisfação com a vida.
A psicologia positiva no processo terapêutico
Como vimos anteriormente, a abordagem da psicologia positiva pode ser aplicada no processo terapêutico, não sendo uma forma de terapia específica, mas uma abordagem e um redireccionamento do foco do terapeuta. Pode complementar a abordagem que o psicólogo já utilizada.
A psicoterapia no âmbito da psicologia positiva é composta por práticas específicas validadas empiricamente, ou seja, por estudos científicos. Estas práticas validadas deram origem a um protocolo terapêutico.
Estas práticas advindas da psicologia positiva têm sido cada vez mais divulgadas e também aplicadas, compreendendo-se a sua eficácia e o benefício que traz ao processo terapêutico na promoção do bem-estar. Há alguns tratamentos baseados na psicologia positiva, como a terapia de bem-estar e a terapia da qualidade de vida. Outras abordagens mais tradicionais, como a terapia de aceitação e compromisso, têm incorporado os princípios e as contribuições da psicologia positiva.
A prática terapêutica da psicologia positiva tem sido testada em diversas problemáticas, com resultados positivos, nomeadamente com doentes com problemas cardíacos, cuidadores informais com stress e ansiedade, depressão, ansiedade, lesão cerebral, ideação suicida, abuso de substâncias, diabetes, problemas de comportamento e delinquência, perturbações do comportamento alimentar, reabilitação após AVC, dor crónica…
Técnicas terapêuticas da psicologia positiva
Para melhor compreensão da aplicação prática da psicologia positiva, apresentamos algumas técnicas ou estratégias terapêuticas relevantes neste âmbito.
Apresentação positiva
Consiste em a pessoa recordar e contar experiências ou memórias da sua vida significativas e que tiveram um resultado positivo. Recordar eventos positivos tem um papel importante na regulação do nosso humor e pode gerar emoções positivas. As experiências ou recordações podem ser contadas ou também escritas, já que a escrita em si mesma pode ter um potencial terapêutico importante.
Também pode ser pedido à pessoa para recordar um momento em que lidou com uma situação positiva de uma forma eficaz e positiva.
Para introduzir maior criatividade, pode ser pedido à pessoa que introduza objetos, fotografias, lembranças como prémios ou certificados para ilustrar a sua história. A pessoa também pode fazer uma montagem de fotos ou mesmo um vídeo.
Diário de gratidão
O diário da gratidão consiste em a pessoa manter um registo diário de coisas positivas que acontecem a cada dia. Ou seja, todos os dias a pessoa vai registar: coisas positivas que aconteceram; significado que tiveram; de que forma contribuiu para que isso acontecesse; o que esse acontecimento diz de positivo sobre si ou sobre outras pessoas.
Também aqui pode ser introduzida a criatividade, podendo a pessoa ilustrar o seu diário, partilhar os seus registos com outra pessoa ou com o terapeuta, registar coisas pelas quais está grata por categorias (família, trabalho, saúde, lazer…).
Pode introduzir-se variações ajustadas à pessoa, por exemplo completar frases como “hoje notei que…”, “hoje experimentei uma coisa boa, que foi…”, “hoje fiz uma coisa bem, que foi…”, “hoje alguém me fez sentir…”, etc.
Avaliação das forças individuais
Consiste em pedir à pessoa para identificar as suas forças ou pontes fortes principais. Para isso é importante que o terapeuta explique ao paciente em que consistem as forças individuais e que o ajude a refletir sobre ações e aspetos da sua vida para chegar à identificação das mesmas. Também podem ser usados questionários.
Comunicação eficaz
Esta prática consiste em explicar e demonstrar à pessoa os diferentes estilos de comunicação existentes e ajudá-la a identificar de que forma comunica com os outros em diferentes circunstâncias. Depois de fazer esta autoavaliação, a pessoa pratica diferentes estratégias para construir uma forma de comunicação mais eficaz e assertiva.
Estes são alguns exemplos de técnicas dentro da psicologia positiva, existindo muitas outras, sempre com o propósito de manter o foco no positivo e no potencial da pessoa, como forma de promover o seu bem-estar, qualidade de vida e felicidade.