Terapia sexual: quando recorrer a um sexólogo?

terapia sexual

A terapia sexual é uma intervenção levada a cabo por um sexólogo, geralmente com formação base em psicologia e especialização em sexologia, que tem como objetivo intervir nos problemas do domínio da sexualidade. Neste artigo pretendemos explicar de forma mais completa o que é a terapia sexual, como funciona e para o que é indicada.

O que é a sexualidade?

A sexualidade é uma importante dimensão da vida de qualquer ser-humano. Ela é construída ao longo da vida, influenciada pela educação que recebemos na família, aquilo que aprendemos com o grupo de pares, o que captamos através dos meios de comunicação, etc. Tudo vai contribuindo para a construção da nossa perceção e vivência da sexualidade. Cada indivíduo tem crenças, expectativas e vivências próprias no âmbito da sexualidade.

A sexualidade pode ser definida como uma energia que nos motiva a procurar amor, contacto, ternura, intimidade; que se integra no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados; a sexualidade influencia os nossos pensamentos, sentimentos, ações e interações e influencia também a nossa saúde física e mental. A sexualidade é a atividade, a expressão, a disposição ou o potencial dos impulsos sexuais da pessoa.

A sexualidade é um conceito altamente complexo, pelo que não pode ser definida apenas de um único ponto de vista ou de uma única dimensão. Temos de considerar a dimensão biológica, uma vez que a sexualidade depende do exercício de diferentes órgãos e funções corporais, dependendo de questões hormonais, de idade, de saúde e do estado físico geral. A própria atividade sexual produz alterações fisiológicas.

No que diz respeito à dimensão psicológica ou afetiva, o nosso comportamento sexual é influenciado pelos nossos pensamentos, desejos, sentimentos, pela forma como encaramos o sexo e a sexualidade, as nossas perceções e estereótipos. Ao nível sociocultural também há um impacto importante na sexualidade, uma vez que desde que nascemos nos é atribuído um género e essa construção acarreta consigo formas distintas de viver a identidade sexual e a vida sexual de um modo global. A forma como o sexo e a sexualidade são vividos na nossa cultura também terão grande influência na nossa sexualidade.

Assim, a sexualidade é complexa e implica diversas variáveis, pelo que os problemas que surgem neste domínio são também complexos e a terapia sexual deve tê-los em conta.

O que são as disfunções ou dificuldades sexuais?

Um dos principais focos da terapia sexual são as disfunções sexuais. Ou seja, a terapia sexual muitas vezes é dirigida à intervenção nas disfunções sexuais, que podem ser definidas como a perda ou diminuição do padrão normal de interesse ou resposta sexual. Na terapia sexual também podem ser trabalhadas dificuldades sexuais, que são diferentes das disfunções. As dificuldades sexuais são um grupo de queixas distintas que podem ir desde a dificuldade ou incapacidade em relaxar, a ausência de carinho após o ato sexual, o medo da intimidade, a dificuldade de comunicação entre os parceiros e consequente insatisfação com a vida sexual do casal… Ou seja, são questões nas quais não tem de existir necessariamente uma falha no desempenho sexual, mas sim uma insatisfação específica, e que também podem ser trabalhadas na terapia sexual.

Dentro das disfunções sexuais podemos ter as que se relacionam com o desejo (ausência de desejo sexual, por exemplo), as que se relacionam com a excitação (por exemplo a disfunção erétil, em que o homem não consegue obter uma ereção) e as que se relacionam com o orgasmo (por exemplo não conseguir atingir o orgasmo).

O que é a sexologia?

A sexologia é a ciência que fornece as bases para a terapia sexual. De uma forma global a sexologia é o estudo científico de temáticas ligadas à sexualidade e ao sexo. Assim, a sexologia pode ser considerada a área do conhecimento que se ocupa do comportamento sexual e da sexualidade.

Esta área do conhecimento ou ciência estuda as múltiplas facetas da sexualidade humana, que vão desde o desenvolvimento sexual até ao comportamento sexual, às disfunções sexuais e mecanismos envolvidos na resposta sexual. Como tal, o estudo da sexualidade inclui aspetos psicológicos, médicos, fisiológicos, culturais, sociais… Isto porque, como vimos anteriormente, a sexualidade é ampla e complexa.

Embora a sexualidade exista desde que existem seres humanos e o interesse pelo seu entendimento seja antigo, o estabelecimento da sexologia enquanto ciência é relativamente recente.

Assim, a sexologia dá as bases teóricas para a terapia sexual, que será a aplicação dos conhecimentos da sexologia para fins clínicos ou terapêuticos.

O que é um sexólogo ou terapeuta sexual?

O sexólogo é alguém especializado em sexologia ou por outras palavras, que estudou as várias áreas e componentes da sexualidade, incluindo aspetos como o desenvolvimento sexual, a anatomia e fisiologia da sexualidade, a dinâmica das relações afetivas e sexuais, a orientação sexual, os mecanismos e fatores que interferem na resposta sexual, etc.

Com este conhecimento, o sexólogo aplica muitas vezes os seus saberes tornando-se terapeuta sexual, ou seja, intervindo com pessoas no âmbito da sexualidade e em diversas problemáticas.

Geralmente o terapeuta sexual é alguém que tem formação base em psicologia clínica e especialização ou formação em sexologia, o que lhe permite ter conhecimento de técnicas psicoterapêuticas mais vastas e conhecimentos e técnicas específicas para abordar e trabalhar a sexualidade.

O terapeuta sexual deve ter uma abordagem flexível, sendo capaz de se ajustar a cada indivíduo ou casal, ajustando a terapia sexual de acordo com cada caso específico e com a complexidade inerente à sexualidade humana, que é diferente de indivíduo para indivíduo. Os terapeutas sexuais estão preparados quer para intervir e ajudar em questões sexuais mais específicas, quer para trabalhar questões relacionadas com o relacionamento geral dos casais.

O que é a terapia sexual?

A terapia sexual é um processo de intervenção dirigido a dificuldades diversas no âmbito da sexualidade. A terapia sexual consiste numa combinação de estratégias de intervenção comportamentais, cognitivas, orientadoras e educacionais. O processo em si é semelhante a qualquer outra intervenção psicoterapêutica, isto é, é um processo conduzido por um psicoterapeuta que tem por objetivo trabalhar e gerir preocupações e problemas no âmbito sexual, procurando atingir objetivos terapêuticos previamente definidos colaborativamente entre terapeuta e cliente(s). A diferença entre um processo terapêutico normal e a terapia sexual é que aqui o foco centra-se essencialmente em preocupações ou dificuldades no âmbito sexual.

O objetivo da terapia sexual é restabelecer a saúde e o bem-estar sexual. Pode ser feita de forma individual, ou em casal, quando existe um casal e os problemas se verificam na interação entre os seus elementos. Geralmente as sessões têm a duração de cerca de uma hora se forem individuais, e se forem em casal podem ser mais prolongadas, por exemplo entre 90 a 120 minutos. Quando é feita terapia com um casal é comum que existam depois sessões individuais paralelas com cada um dos elementos do casal, com o objetivo de ouvir e compreender as necessidades de cada um dos membros do casal e perceber se estas são ou não partilhadas pelo casal como um todo.

A terapia sexual tem sempre de ser iniciada pela avaliação clínica, que procurará compreender de forma completa e aprofundada o problema que traz a pessoa ou o casal à terapia. Esta avaliação focar-se-á em variados aspetos, tais como: história de desenvolvimento, características individuais, sintomatologia presente, desenvolvimento da sexualidade, problemas ao nível do desempenho sexual e análise aprofundada desses problemas (quando ocorrem, de que forma, fatores que interferem…). Caso se trate de um casal são avaliados também aspetos referentes ao casal, por exemplo a história da sua relação, dinâmica da relação entre o casal, satisfação com a relação, comprometimento com o relacionamento, padrões de comunicação entre o casal…

Após a avaliação clínica é apresentado ao indivíduo ou ao casal a formulação e o plano de intervenção, que tem por objetivo ajudar a compreender as dificuldades, ressaltar os fatores que contribuem para a manutenção do problema, permitir a expressão de expectativas e delinear o plano de intervenção adequado para a terapia sexual.

Quais os objetivos da terapia sexual?

Após a avaliação são estabelecidos os objetivos terapêuticos e delineado o plano de intervenção. Quando se trabalha em casal o objetivo da terapia sexual consiste em modificar as transações sexuais do casal para que a excitação e a gratificação sejam maximizadas e o medo, a ansiedade e a culpa sejam eliminados ou diminuídos. A qualidade do relacionamento entre o casal será um importante preditor do sucesso da terapia sexual. Isto é, quando o casal é unido e estão ambos disponíveis e motivados para a mudança, a probabilidade de o resultado ser positivo e de se conseguirem os ganhos terapêuticos pretendidos é muito maior.

Na terapia sexual são aplicadas diferentes estratégias terapêuticas que têm por vários objetivos:

  • Relaxar em situações de contacto íntimo;
  • Compreender o parceiro e as suas preferências;
  • Aprender a sentir prazer com o contacto físico não-erótico;
  • Ser capaz de comunicar os seus sentimentos e preferências sexuais com o parceiro;
  • Aumentar as interações positivas entre o casal;
  • Aumentar o reportório sexual;
  • Sentir-se mais confiante e seguro no domínio sexual;
  • Promoção da autoestima e da aceitação da imagem corporal;
  • Assumir mais responsabilidade pelo seu próprio prazer;
  • Desconstruir mitos associados à sexualidade;
  • Compreender melhor o próprio corpo e o corpo do parceiro.

Quais as técnicas utilizadas na terapia sexual?

Nas sessões de terapia sexual são geridas e trabalhadas as diferentes dificuldades, quer através do diálogo quer mediante a prescrição de exercícios e estratégias práticas para casa. As estratégias utilizadas na terapia sexual podem incluir:

  • Educação sobre a sexualidade, que pode ocorrer de forma informal ao longo de toda a terapia sexual, ou também pode ser feita de forma mais formal recomendando-se ao indivíduo ou ao casal materiais sobre sexualidade. Esta educação sobre a sexualidade inclui conhecimentos sobre a anatomia e função sexual, desconstrução de mitos associados à sexualidade, efeitos do envelhecimento na sexualidade, etc.
  • Focalização sensorial – consiste em o casal focar-se apenas na estimulação do corpo um do outro, que pode ser ou não nos genitais, sem existir penetração. O objetivo é eliminar a ansiedade de desempenho e haver um foco apenas no outro e na exploração sensorial. A evidência clínica sugere que a estimulação suave e recíproca pode também aumentar o vínculo entre o casal;
  • Incentivar o casal a conversar sobre fantasias e preferências sexuais, podendo ser usado material erótico como literatura, fotos ou filmes;
  • Ajudar o casal a alterar o ambiente e o contexto para conseguir criar situações estimulantes (ex: planear um jantar romântico);
  • Exercícios pélvicos para a mulher;
  • Treino de masturbação (sobretudo usado em disfunções associados ao orgasmo, por exemplo uma mulher que nunca atingiu o orgasmo, mas também nos casos de disfunção erétil no homem);
  • Treino de controlo ejaculatório (técnica de start-stop, aperto);
  • Biofeedback;
  • Técnicas de redução da ansiedade ou relaxamento;
  • Técnicas e estratégias específicas de comunicação e gestão de conflitos entre o casal.

Por vezes, para tratar determinadas disfunções sexuais, poderá necessário combinar a terapia sexual com tratamento farmacológico. Nesse caso o terapeuta sexual poderá orientar o indivíduo ou o casal para avaliação médica.

Para que situações é indicada a terapia sexual?

Como vimos, a terapia sexual é indicada para uma ampla gama de dificuldades e preocupações a nível da sexualidade. Podemos ainda assim referir algumas das principais problemáticas que devem ser intervencionadas em terapia sexual:

  • Parafilias (são padrões de comportamento sexual desviantes, que são muitas vezes considerados perversão ou anormalidade, por exemplo a pedofilia, voyeurismo, masoquismo…);
  • Ansiedade associada ao desempenho sexual;
  • Baixo desejo sexual ou falta de libido;
  • Desejo sexual ou libido irregular;
  • Disfunção erétil;
  • Ejaculação precoce ou tardia;
  • Dificuldade ou incapacidade em atingir o orgasmo;
  • Saúde reprodutiva;
  • Sexualidade no envelhecimento;
  • Vítimas de abuso ou agressão sexual;
  • Doenças sexualmente transmissíveis;
  • Vício ou compulsão sexual;
  • Dificuldades associadas à identidade sexual ou orientação sexual;
  • Dificuldades no relacionamento e na vida sexual em casal;
  • Aversão sexual;
  • Vaginismo e dispareunia;
  • Insatisfação global com a vida sexual.

Como saber se preciso de terapia sexual?

Como vimos, a terapia sexual pode ser indicada para variadas dificuldades, problemas e preocupações do foro sexual. Assim, alguns sinais podem ajudá-lo a perceber se poderá ser indicada a terapia sexual e se deverá contactar um terapeuta sexual para um melhor aconselhamento:

  • Sentir dor durante o ato sexual;
  • Alterações na sua vida sexual ou na sexualidade associadas a stress a nível pessoal e profissional;
  • Falta de desejo sexual;
  • Sentir ansiedade face ao ato sexual;
  • Dificuldade em sentir prazer ou atingir o orgasmo;
  • Insatisfação com a vida sexual do casal;
  • Vivência de traumas como abuso sexual ou outros episódios marcantes;
  • Dificuldades de comunicação entre o casal.

O que fazer para iniciar terapia sexual?

Se considera que a terapia sexual poderia ser benéfica ou indicada para si de forma individual ou em casal, existem diversas formas de o poder fazer. Pode sempre pedir aconselhamento junto do seu médico assistente que o poderá melhor encaminhar neste sentido. Também pode consultar onde se realizam consultas de terapia sexual ou sexologia clínica, bem como a lista de terapeutas sexuais que fazem consulta privada, através da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica, no site www.spsc.pt.

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.