Anorgasmia: o que é, causas, tratamento e prevenção

anorgasmia

A anorgasmia é uma perturbação do orgasmo que se insere dentro das disfunções sexuais. Caracteriza-se pela incapacidade ou dificuldade em atingir o orgasmo. As disfunções sexuais podem estar relacionadas com variados fatores, desde questões biológicas até aspetos emocionais.

Assim, e considerando que uma vida sexual satisfatória é fundamental para o bem-estar e qualidade de vida do ser-humano, neste artigo pretendemos explicar em que consiste a anorgasmia, porque acontece, e como pode ser tratada.

O que é a anorgasmia?

A anorgasmia ou perturbação do orgasmo caracteriza-se por um retardo acentuado, infrequência ou ausência de orgasmo, ou então uma intensidade muito reduzida das sensações orgásmicas. Geralmente quando estamos perante um quadro de anorgasmia o problema orgásmico acontece em quase todas ou todas as atividades sexuais (entre 75 a 100% das vezes).

É importante compreender que, sobretudo no caso das mulheres, há uma grande variedade na forma como as sensações orgásmicas são vividas, a sua intensidade e o tipo de estimulação que produz o orgasmo. Ou seja, o orgasmo é experimentado de formas muito diferentes de pessoa para pessoa. Muitas mulheres presenciam de estimulação clitoriana para atingir o orgasmo, enquanto uma proporção relativamente pequena delas afirma que sempre tiveram orgasmo através da penetração. Consequentemente, uma mulher que atinge o orgasmo por meio da estimulação do clitóris, mas não durante a relação sexual, não tem anorgasmia nem problema de orgasmo, apenas precisa de outro tipo de estimulação.

É necessário ter em conta que a mulher pode não atingir o orgasmo por não ter estimulação suficiente, por o ato sexual terminar muito rápido ou por não existirem preliminares. Quando a autoestimulação é pobre, ou seja, há ausência ou falta de masturbação e a mulher não conhece o seu próprio corpo, é mais difícil também compreender a estimulação que lhe permite atingir o orgasmo.

Isto significa que muitas vezes os problemas ao nível da obtenção de prazer sexual e orgasmo não têm necessariamente que ver com uma perturbação ou disfunção sexual como a anorgasmia, mas sim com uma estimulação desadequada.

A quantidade, bem como o tipo de estimulação necessários para que seja possível atingir o orgasmo varia bastante de pessoa para pessoa. Há também um outro dado importante, que é o de que, no caso das mulheres, uma em cada 10 não atinge o orgasmo, no entanto apresenta satisfação com a sua atividade sexual. Por isso, consideramos que existe um quadro de anorgasmia ou perturbação do orgasmo apenas quando a mulher se sente insatisfeita com a situação ou quando as dificuldades ao nível do orgasmo lhe causam sofrimento e incómodo de algum tipo.

A anorgasmia pode estar presente ao longo de toda a vida, ou seja, a pessoa pode nunca ter conseguido atingir o orgasmo de forma plena desde que iniciou a sua vida sexual. Noutros casos, a pessoa tem um período de funcionamento sexual normal, e só depois é que começa a apresentar as queixas relativas ao orgasmo. Falamos assim de anorgasmia primária quando a pessoa nunca experienciou um orgasmo, e anorgasmia secundária quando a pessoa já teve orgasmos com uma certa normalidade e, por algum motivo, deixou de os conseguir ter de forma sistemática.

A anorgasmia pode também ser generalizada, se acontece em todas as situações de índole sexual, ou pode ser situacional, quando só acontece em determinadas circunstâncias, com determinados tipos de estimulação ou com determinados parceiros.

Apesar de a anorgasmia ser mais comum nas mulheres, ela também pode ocorrer nos homens. Quando falamos em anorgasmia ejaculatória, por exemplo, esta refere-se a quando o homem ejacula mas não sente o prazer equivalente ao orgasmo.

Fases da resposta sexual feminina

Considerando que a anorgasmia é mais frequente nas mulheres, é importante para a sua compreensão compreender também a resposta sexual feminina. A resposta sexual pode ser caracterizada por quatro fases ou estágios:

  • Fase do desejo: é a fase em que surgem as fantasias, pensamentos e mecanismos psicológicos que levam a sentir desejo para a prática da atividade sexual, que se caracteriza por sensações que levam a que exista uma recetividade para a experiência sexual;
  • Fase da excitação: consiste na conjugação de fatores psicológicos e fisiológicos, como por exemplo a expansão do canal vaginal;
  • Fase do orgasmo: consiste no ápice ou ponto máximo de prazer, no qual ocorre uma descarga de energia que ocasiona uma sensação de libertação da tensão sexual, com contração da musculatura pélvica e genital, para além do ânus que se contrai de forma rítmica;
  • Fase da resolução: consiste numa sensação de relaxamento generalizado por todo o corpo e também a nível emocional, através de um sentimento de leveza e bem-estar, o que pode durar alguns minutos ou até horas.

Quando olhamos para o ciclo da resposta sexual feminina compreendemos que a anorgasmia se situa sobretudo na fase do orgasmo. No entanto, embora o problema resida essencialmente neste estágio, podem verificar-se dificuldades também noutros estágios. Se a fase do desejo ou da excitação estiverem comprometidas, ou seja, se a mulher não sentir desejo sexual ou não ficar excitada, é pouco provável que consiga atingir o orgasmo.

Por outro lado, se não existir o orgasmo e perante um quadro de anorgasmia, a fase de resolução não se vai caracterizar pela sensação de relaxamento e bem-estar generalizados.

Quais as causas da anorgasmia?

Muitos fatores e causas diversas podem estar associadas à anorgasmia. Estes fatores podem ser físicos ou biológicos, mas também emocionais e psicológicos.

Muitas vezes as crenças e pensamentos associados ao sexo tornam-se altamente limitadores e interferem com o orgasmo. Na mulher, por exemplo, o medo de engravidar pode dificultar a capacidade de desfrutar o ato sexual e do prazer que lhe sucede.

Por outro lado, outros medos, como o medo de rejeição por parte do parceiro sexual ou sentimentos de culpa face ao sexo, frequentemente fruto de uma educação sexual repressora, também podem estar na origem da anorgasmia e dos problemas ao nível do orgasmo. Estados depressivos, ansiosos ou outros problemas emocionais também causam frequentemente problemas ao nível do orgasmo e anorgasmia.

Verifica-se também, nas mulheres, uma forte associação entre problemas de relacionamento, saúde física e saúde mental e dificuldades para atingir o orgasmo. Assim, muitas vezes a anorgasmia ocorre por questões relacionadas com estas diferentes dimensões. Muitas mulheres reportam por exemplo o facto de o ato sexual terminar antes de que se sintam suficientemente excitadas como uma razão para a dificuldade em atingirem o orgasmo.

Também a ausência de preliminares e uma estimulação insuficiente ou desadequada podem estar na origem do problema de anorgasmia. Problemas no relacionamento, como por exemplo conflitos, falta de segurança, comunicação pobre, podem também dificultar a obtenção do orgasmo. Quando há uma forte ansiedade com o desempenho sexual e a atividade sexual em si, isso dificultará a capacidade de desfrutar da atividade sexual e, consequentemente, de obter prazer e atingir o orgasmo.

Os fatores socioculturais, como as expectativas sobre os papéis de género ou as normas religiosas, também são influências importantes para as dificuldades orgásmicas e podem por isso estar na base de um quadro de anorgasmia. Se a mulher tem pudor do próprio corpo ou possui crenças enraizadas de que não deve ter a iniciativa ou deve ser mais passiva no ato sexual, isto poderá limitar o seu prazer e a expressão do mesmo.

O desconhecimento do próprio corpo e da sexualidade, os problemas pessoais ou relacionais, sobretudo os problemas ao nível do casal, podem também desencadear problemas emocionais que por sua vez causarão prejuízo na resposta sexual, nomeadamente no orgasmo, podendo causar quadros de anorgasmia.

Também algumas condições médicas ou o uso de determinados medicamentos pode estar na base da anorgasmia. Doenças tais como diabetes, esclerose múltipla, lesões no nervo pélvico por histerectomia, lesões na medula espinal, entre outras, podem exercer uma influência direta sobre o funcionamento do orgasmo.

Medicação como alguns antidepressivos também podem ser responsáveis por retardar ou inibir o orgasmo. Problemas ao nível genital, por exemplo no caso das mulheres secura vaginal, prurido e dor, fazem com que exista também uma maior propensão a ter dificuldade em atingir o orgasmo. Também outras condições como incontinência urinária, infeções urinárias ou vaginais ou cirurgias ginecológicas podem estar associadas à anorgasmia. O uso abusivo de álcool ou drogas também pode ter interferência e estar na base da anorgasmia.

É importante salientarmos ainda que alguns estudos encontraram algumas variáveis que, pelo menos no caso das mulheres, parecem promover melhorias ao nível do orgasmo, como por exemplo a existência de um parceiro fixo e a intensidade do estímulo sexual. Não podemos esquecer ainda que a própria natureza da vida sexual do casal tem uma interferência importante. Se há dificuldades no outro parceiro ou se a vida sexual é pouco estimulante e não tem em conta as preferências, interesses ou dificuldades de cada um, será difícil atingir o prazer sexual.

Como é feito o diagnóstico da anorgasmia?

Quando os sintomas da anorgasmia se encontram presentes, é importante recorrer a um profissional para que seja feita uma correta e completa avaliação da situação, na qual serão tidos em conta os seguintes fatores:

  • História de vida da pessoa, nomeadamente a nível familiar, experiências de infância, primeiras experienciais sexuais, adaptação à puberdade, vivência de situações de abuso sexual ou experiências sexuais indesejadas, etc;
  • Compreender que crenças e informações a pessoa tem acerca da sexualidade e como foram adquiridas, nomeadamente que tipo de educação sexual teve, prestando especial atenção a eventuais informações e crenças repressivas que tenham sido incutidas;
  • Avaliar fatores relativos ao casal e à relação conjugal, nomeadamente padrões de comunicação, fatores de insatisfação, desequilíbrios nos níveis de desejo sexual, comunicação sobre sexo e sexualidade, problemas e conflitos, entre outros;
  • Avaliar a vida sexual do casal e os problemas existentes, por exemplo, o conhecimento que cada um tem do próprio corpo e do corpo do outro, o à-vontade para comunicar sobre sexo e para experimentar diferentes tipos de estimulação, a satisfação recíproca das necessidades, etc;
  • Alterações no desejo sexual ao longo da vida e fatores ou causas associadas, bem como estratégias e formas de resolução que foram aplicadas;
  • Alterações no orgasmo e sensações orgásmicas ao longo da vida, nomeadamente se já esteve presente, o que antecedeu as alterações, etc;
  • Consumo de substâncias ou medicamentos que possam interferir com o funcionamento sexual e o orgasmo;
  • Presença de doenças ou condições de saúde que possam interferir com o orgasmo;
  • Presença de problemas de vida e stressores, como problemas laborais ou conflitos interpessoais.

Como tratar a anorgasmia?

O tratamento da anorgasmia pode incluir psicoterapia individual ou terapia de casal, dependendo dos casos ou das situações, e podem ocorrer também os dois de forma concomitante. É recomendável uma abordagem multidisciplinar para a anorgasmia.

Na intervenção da anorgasmia é importante ajudar a pessoa a compreender que tipo de toque ou de estimulação é excitante e prazeroso. Neste ponto, a autoestimulação ou masturbação assume especial importância. Outras técnicas são também utilizadas, como por exemplo técnicas de relaxamento e exercícios com foco sensorial, em que o casal é aconselhado a tocar-se e a explorar o corpo um do outro sem que exista necessariamente penetração. Promover padrões de comunicação mais saudáveis no casal e facilitar a reaproximação e alteração de padrões disfuncionais de relacionamento pode ser fundamental.

Por vezes acontece que para um dos elementos do casal o sexo é um alicerce muito importante da relação, e para outro não. Esta disparidade de expectativas interfere significativamente na vida sexual do casal e pode também interferir no prazer obtido ou no orgasmo. Assim, é importante trabalhar esta gestão de expectativas nos casos de anorgasmia.

Podem também ser aconselhados outros estímulos ou materiais, como vibradores ou vídeos eróticos, para potenciar o desejo e a excitação. Em casos de anorgasmia em que há danos nos nervos e isso impede que a estimulação leve ao orgasmo, os vibradores podem ser úteis. Deve aconselhar-se a que a própria pessoa procure conhecer o seu corpo, através de exercícios de autoconhecimento sexual, masturbação e exploração de fantasias. Uma postura mais ativa face à sua própria sexualidade pode ser importantes e refletir uma melhor autoestima sexual.

Também é fundamental que na intervenção da anorgasmia exista psicoeducação, ou seja, que sejam transmitidas informações corretas acerca do sexo, da sexualidade e da resposta sexual. Neste âmbito é importante que possam ser desconstruídos alguns mitos ou crenças erradas acerca da sexualidade que podem estar a funcionar como fatores limitadores para um funcionamento sexual adequado e para o desfrutar da atividade sexual e obtenção do prazer.

Algumas técnicas como o mindfulness ou atenção plena têm revelado também utilidade no tratamento da anorgasmia e das dificuldades associadas ao orgasmo. Com o mindfulness a pessoa é incentivada a trazer o foco e a atenção para o momento presente, o que pode ajudar a identificar e gerir o medo de perder o controlo, bem como a prestar atenção às sensações sexuais, sem fazer juízos de valor ou tentar monitorizar ou alterar o que está a acontecer.

Como prevenir a anorgasmia e potenciar o prazer?

Mesmo sem que um quadro de anorgasmia esteja instalado, há frequentemente dificuldades ligadas ao orgasmo, ou simplesmente vontade de obter um maior prazer sexual. Para isso, algumas dicas podem ser importantes para potenciar o prazer:

  • Explorar sem medo ou culpa as fantasias sexuais, apreciando as sensações que estas despertam;
  • Compreender que é normal existirem variações no desejo sexual e até no orgasmo, que podem ser influenciadas por fatores emocionais, hormonais, físicos… Entender pequenas alterações como normais sem ficar demasiado ansioso/a por causa disso é importante. Caso a queixa persista e se torne disfuncional, pode ser procurar um psicólogo na área da sexologia;
  • Compreender que o cérebro é o mais importante órgão sexual, pelo que é na mente que residem os desejos ou as crenças e pensamentos que os limitam;
  • Ter um estilo de vida saudável e priorizar o bem-estar, para diminuir o stress que é muitas vezes inimigo do prazer sexual;
  • Conversar com o/a parceiro/a sobre sexo, sobre aquilo que gosta, o que prefere, o que gostaria de experimentar… Uma boa comunicação é fundamental para um bom sexo;
  • Não limite o sexo à zona genital ou à penetração. Incorpore todo o corpo, explore as várias zonas e descubra as diferentes sensações despoletadas. A importância do toque é muito maior do que por vezes pensamos. Por isso, utilize o toque para explorar o seu corpo e o da outra pessoa;
  • Preste atenção e procure estar 100% focado nas suas respostas e sensações no ato sexual, seja na masturbação seja com parceiro/a, para conseguir usufruir da experiência e descobrir-se a si e ao outro:
  • Descubra o que funciona (ou não) para si e valide e respeite isso, percebendo que somos todos diferentes e que podemos honrar as nossas vontades, sempre e quando isso não prejudique a liberdade do outro;
  • Não tenha medo de expressar as suas necessidades e desejos;
  • Não cobre o prazer ao/à seu/sua parceiro/a sexual, em vez disso procure saber do que gosta e dê ao/à seu/sua parceiro/a sexual a oportunidade de descobrir, bem como expressarem também eles as suas necessidades. A cobrança acaba por inibir e limitar o prazer;
  • Renove as fantasias, procure a novidade e o desafio para manter e reacender o desejo sexual;
  • Procure utilizar os seus cinco sentidos durante o sexo;
  • Procure perceber se há preocupações ou pensamentos que estão a interferir com a sua vida sexual e com o seu prazer;
  • Promova a intimidade, a proximidade, o desejo e a sedução para além do sexo. Jantar a dois, sedução no dia-a-dia, “beijos e amassos” são formas importantes de manter vivo o desejo;
  • Invista na sua autoestima e em gostar de si primeiro, pois a autoestima e a autoconfiança são um combustível importante para o sexo e para o prazer;
  • Seja criativo e tente manter o bom-humor, não veja o sexo como algo assustador que tem de acontecer de uma maneira específica, mas sim como algo livre onde o importante é desfrutar. Não planeie demasiado e gira as suas expectativas.

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.