Transtorno de personalidade: o que é, tipos e tratamento

transtorno de personalidade

Os transtornos de personalidade são um problema do foro mental que acabam por ser pouco reconhecidos. Enquanto que praticamente toda a gente está familiarizada com problemas como a ansiedade e depressão (embora também com algumas perceções por vezes erradas), nos transtornos de personalidade o conhecimento é menor.

Por isso, neste artigo pretendemos explicar em que consiste os transtornos de personalidade, quais os diferentes tipos e qual a intervenção necessária para este tipo de problemática. Boa leitura!

O que é um transtorno de personalidade?

Um transtorno de personalidade é um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo, é difuso e inflexível, começa na adolescência ou no início da fase adulta, é estável ao longo do tempo e leva a sofrimento e prejuízo nos diversos contextos de vida.

Este padrão manifesta-se em duas ou mais das seguintes áreas:

  • Cognição (ou seja, formas de perceber e interpretar a si mesmo, aos outros e aos acontecimentos e situações);
  • Afetividade (em termos de variação, intensidade, instabilidade e adequação da resposta emocional);
  • Funcionamento interpessoal e relações com os outros;
  • Controlo dos impulsos.

Os traços da personalidade são padrões persistentes de perceção, de relacionamento e pensamento sobre o contexto e sobre si próprio, que são exibidos numa ampla gama de contextos sociais e pessoais. Os traços de personalidade apenas constituem transtorno de personalidade quando são inflexíveis e pouco adaptativos e causam prejuízos em termos do funcionamento da pessoa nos vários contextos, bem como um sofrimento significativo.

Para diagnosticar um transtorno de personalidade é necessária uma avaliação dos padrões de funcionamento da pessoa a longo prazo, e as características da sua personalidade devem ser evidentes desde o início da fase adulta. Os traços de personalidade que definem os transtornos de personalidade devem também ser diferenciados das características que surgem em resposta a situações de vida negativas ou estados mentais transitórios, como por exemplo a depressão. Ou seja, para ser possível dizer que a pessoa efetivamente tem um transtorno de personalidade os traços devem ser estáveis ao longo do tempo e ocorrer em diversas situações.

As características de um transtorno de personalidade costumam-se tornar reconhecíveis durante a adolescência ou no início da idade adulta. Alguns transtornos de personalidade tendem a ficar menos evidentes ou a desaparecer com o envelhecimento, mas outros tipos mantêm-se sempre. Isto também poderá depender de pessoa para pessoa.

Apesar de geralmente os transtornos de personalidade exigirem um surgimento até ao começo da vida adulta, as pessoas podem não procurar ajuda especializada até um período relativamente tardio na vida. Isto porque o transtorno pode ser exacerbado após a perda de pessoas significativas (p.ex divórcio) ou de situações sociais e de vida como por exemplo a perda do emprego.

Quais os tipos de transtorno de personalidade?

Existem diferentes transtorno de personalidade que variam na forma como as cognições, afetos, funcionamento interpessoal e controlo de impulsos se manifestam.

Transtorno de personalidade paranoide

Este transtorno de personalidade caracteriza-se por um padrão de desconfiança e suspeita difusa dos outros, de modo que as suas motivações são interpretadas como sendo malévolas. Este tipo de padrão está presente em vários contextos e pode ser expresso por aspetos como:

  • Suspeita, sem ter fundamento suficiente, de estar a ser explorado, maltratado ou enganado pelos outros. Estas pessoas frequentemente suspeitam, sem terem provas suficientes, que os outros estão a tramar alguma coisa contra eles e que os podem atacar ou fazer mal de alguma forma, a qualquer momento e sem razão.
  • Preocupação com dúvidas injustificadas acerca da lealdade ou da confiabilidade de amigos e pessoas próximas. Face a comportamentos aparentemente inofensivos, fazem interpretações maldosas e hostis.
  • Dificuldade e relutância em confiar nos outros devido a um medo infundado de que as informações serão usadas contra si. Podem recursar-se a responder a perguntas pessoais dizendo que a pessoa “não tem nada a ver com isso”.  
  • Perceção de significados ocultos humilhantes ou ameaçadores em comentários que na verdade são benignos. Um indivíduo com este transtorno pode por exemplo interpretar mal um erro honesto de um funcionário de uma loja como uma tentativa deliberada de dar troco a menos ou entender um comentário bem-humorado de um colega como um ataque ao seu carácter. Os elogios costumam ser mal interpretados, por exemplo se a pessoa comprou um carro novo e alguém elogia, pode interpretar isto como um ataque ou crítica de egoísmo ou consumismo. Pode inclusivamente entender uma oferta de ajuda como uma crítica por não estar a ter um desempenho bom ou não conseguir fazer as coisas sozinho.
  • Guardar rancores de forma persistente (ex: não perdoar desprezo ou afrontas).
  • Perceção de ataques ao seu carácter ou reputação que não são percebidos pelos outros e reação de raiva ou contra-ataque. São rápidos no contra-ataque e reagem com raiva aos insultos percebidos. Há um envolvimento frequente em conflitos.
  • Suspeitas recorrentes e injustificadas acerca da fidelidade do seu parceiro ou cônjuge. As pessoas com este transtorno podem ser patologicamente ciumentas, suspeitando que o/a parceiro/a os está a trair, sem terem justificação adequada. Podem reunir “provas” triviais e circunstanciais que apoiem as suas suspeitas. Desejam manter o controlo total das suas relações íntimas para evitar serem traídos e podem questionar de forma repetida o paradeiro, as ações, intenções e fidelidade do/a parceiro/a.
  • Podem ser vistos como “fanáticos” e formar “cultos” ou grupos muito unidos com outros indivíduos que compartilham os seus sistemas paranoides de crenças.

As pessoas que apresentam o transtorno de personalidade paranoide são geralmente de difícil convivência e apresentam frequentemente problemas nos seus relacionamentos. Apesar de muitas vezes parecerem objetivos, racionais e não emotivos, demonstram com frequência instabilidade emocional, predominando as expressões hostis, inflexíveis e sarcásticas. As suas reações hostis podem gerar na outra pessoa uma resposta igualmente hostil, a qual, então, serve para confirmar as suas expectativas e suspeitas iniciais.

Transtorno de personalidade esquizoide

Este transtorno caracteriza-se por um padrão difuso de distanciamento das relações sociais e uma faixa restrita de expressão de emoções em contextos interpessoais, que se expressa através dos seguintes aspetos:

  • A pessoa não deseja nem desfruta de relações íntimas, inclusive ser parte de uma família. Parece indiferente a oportunidades de desenvolver relações próximas e não encontra satisfação em fazer parte de um grupo social.
  • Quase sempre opta por atividades solitárias. Aparenta ser socialmente isolada ou “solitária”, assim como socialmente inapta e absorvida em si mesma. Prefere tarefas mecânicas ou abstratas, como jogos matemáticos ou de computador.
  • Manifesta pouco ou nenhum interesse em ter experiências sexuais com outra pessoa. Muitas vezes parece fria ou distante por ter uma expressão emocional constrita.
  • Tem prazer em poucas atividades, por vezes em nenhuma. A sua vida parece muitas vezes sem rumo como se andasse “à deriva”.
  • Não tem amigos próximos ou confidentes que não sejam os familiares de primeiro grau. Raramente namora e não é costume casar.
  • Mostra-se indiferente ao elogio ou à crítica de outros.
  • Demonstra frieza emocional, distanciamento ou embotamento afetivo. Reage frequentemente de forma passiva a circunstâncias adversas e apresenta dificuldade em reagir adequadamente a acontecimentos importantes de vida.
  • O funcionamento profissional também pode estar prejudicado, em especial em trabalhos em que há necessidade de contactar e comunicar com outras pessoas. Pode, no entanto, ser bem-sucedido em trabalhos que não envolvem o contacto social.

Transtorno de personalidade esquizotípica

Este transtorno de personalidade consiste num padrão difuso de défices sociais e interpessoais marcado por desconforto agudo e capacidade reduzida para relacionamentos íntimos, além de distorções cognitivas ou percetivas e comportamento excêntrico, revelado por aspetos tais como:

  • Ideias de referência (ou seja, interpretações incorretas de incidentes casuais e eventos externos como tendo um sentido particular e incomum especificamente para a pessoa).
  • Crenças estranhas ou pensamento mágico que influenciam o comportamento e são inconsistentes com as normas culturais (ex: superstições, crença em clarividência, telepatia ou “sexto sentido”; em adolescentes podem ser fantasias ou preocupações bizarras). Estas pessoas podem achar que têm poderes especiais ou que sentem os eventos antes de eles ocorrerem, ou até que conseguem ler os pensamentos dos outros. Podem acreditar que exercem um controlo mágico sobre os outros, direta ou indiretamente.
  • Experiências percetivas incomuns, incluindo ilusões corporais, por exemplo sentir que outra pessoa está presente ou ouvir uma voz a murmurar o seu nome.
  • Pensamento e discurso estranhos (p.ex., vago, circunstancial, metafórico, excessivamente elaborado ou estereotipado). As respostas podem ser excessivamente concretas ou abstratas, e palavras e conceitos são, por vezes, aplicados de maneiras pouco habituais (p.ex a pessoa pode afirmar que não estava “conversável” no trabalho).
  • Desconfiança ou ideação paranoide, por exemplo achar que os colegas de trabalho estão a tentar minar a sua reputação junto do chefe.
  • Afeto inadequado ou constrito.
  • Comportamento ou aparência estranha, excêntrica ou peculiar (ex: evitar contacto visual, usar roupas manchadas que não servem bem, ser incapaz de participar em provocações e brincadeiras entre amigos ou colegas).
  • Ausência de amigos próximos ou confidentes que não sejam parentes de primeiro grau. Os relacionamentos são vividos com desconforto.
  • Ansiedade social excessiva que não diminui com o convívio e que tende a estar associada mais a temores paranoides do que a julgamentos negativos sobre si mesmo. Por exemplo, num jantar uma pessoa com personalidade esquizotípica não ficará mais relaxar com o passar das horas, ficando, pelo contrário, mais tensa e desconfiada.

Transtorno de personalidade antissocial

Este transtorno caracteriza-se por um padrão difuso de desconsideração e violação dos direitos das outras pessoas, que se expressa pelos seguintes aspetos:

  • Fracasso em ajustar-se às normas sociais relativas a comportamentos legais, conforme indicado pela repetição de atos que constituem motivos de detenção (destruir propriedade alheia, assediar outras pessoas, roubar ou ter ocupações ilegais).
  • Tendência à falsidade, conforme indicado por mentiras repetidas, uso de nomes falsos ou de batota para ganhar alguma coisa ou obter prazer pessoal (ex: conseguir dinheiro, sexo ou poder).
  • Impulsividade ou dificuldade em fazer planos para o futuro. Tomam decisões no calor do momento, sem análise e sem consideração em relação às consequências para si mesmo ou para os outros. Isto pode levar a mudanças repentinas de emprego, morada ou relacionamentos.
  • Irritabilidade e agressividade, conforme indicado por repetidas lutas corporais ou agressões físicas.
  • Despreocupação com a segurança de si próprio e dos outros (assumindo comportamentos de risco tais como conduzir em velocidade excessiva ou sob efeito de substâncias, envolver-se em comportamentos sexuais de risco, etc). Podem também negligenciar o cuidado de uma criança ao ponto de a colocar em risco.
  • Irresponsabilidade repetida, conforme indicado pela incapacidade em manter uma conduta consistente no trabalho ou honrar as suas obrigações financeiras.
  • Ausência de remorso, conforme indicado pela indiferença ou racionalização em relação a ter ferido, maltratado ou roubado outras pessoas. Racionalizam muitas vezes os seus atos dizendo coisas como “a vida é injusta” ou “perdedores merecem perder”. Podem inclusivamente culpar as vítimas por serem ingénuas ou merecerem o seu destino (“ele já esperava por isto”). Há uma ausência de empatia e tendência a ser insensível em relação aos sentimentos, direitos e sofrimento dos outros. O autoconceito da própria pessoa pode ser exacerbado e arrogante e pode ser excessivamente opinativa, autoconfiante ou convencida.
  • Podem apresentar disforia, incluindo queixas de tensão, incapacidade de tolerar a monotonia e humor deprimido.

Transtorno de personalidade borderline

Este transtorno caracteriza-se por um padrão difuso de instabilidade nas relações interpessoais, na autoimagem e nos afetos, e uma impulsividade acentuada. Verificam-se os seguintes aspetos:

  • Esforços desesperados para evitar o abandono real ou imaginário. Pode ficar com raiva exagerada mesmo perante separações pequenas e justificáveis (ex: pânico ou fúria quando alguém importante para si se atrasa ou tem de remarcar um compromisso). Há uma tendência para achar que estes “abandonos” significam que são “maus”. Estes medos estão relacionados com a intolerância em ficar só e a necessidade de ter pessoas ao redor. Os esforços desesperados para evitar o abandono incluem por vezes ações impulsivas como automutilação ou comportamentos suicidas.
  • Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e desvalorização. Podem partilhar detalhes pessoais muito íntimos logo no início do relacionamento e idealizar a pessoa. Podem mudar rapidamente da idealização à desvalorização, sentindo que a pessoa não se importa o suficiente, não dá o suficiente e não está “presente” o suficiente. Há uma tendência a mudar drasticamente a forma de ver os outros, que tanto podem ser vistos como apoiantes como punitivos.
  • Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e persistente da autoimagem ou da perceção de si mesmo. Verificam-se muitas vezes mudanças súbitas nos objetivos, valores e aspirações vocacionais, assim como nas opiniões e planos, na identidade sexual e no tipo de amigos.
  • Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente destrutivas (p.ex., gastos, sexo, abuso de substâncias, condução irresponsável, compulsão alimentar).
  • Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamentos autolesivos, como a automutilação. O suicídio ocorre em 8 a 10% das pessoas com este transtorno, sendo que os atos de automutilação (p.ex cortes ou queimaduras) e ameaças ou tentativas de suicídio são bastante comuns. Estes atos autodestrutivos são geralmente precipitados por ameaças de separação ou rejeição.
  • Instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade de humor (p.ex., disforia, irritabilidade ou ansiedade intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas raramente de mais de alguns dias). A raiva é muitas vezes expressada de forma inadequada e existe dificuldade no seu controlo, seguindo-se sentimentos de vergonha e culpa.
  • Há por vezes um padrão de auto-sabotagem no momento em que a pessoa está quase a atingir uma meta (p.ex abandonar o curso logo antes de o concluir, destruir um relacionamento positivo quando se torna sério).
  • Sentimentos crónicos de vazio.
  • Raiva intensa e inapropriada ou dificuldade em controlá-la (p.ex., mostras frequentes de irritação, raiva constante, lutas físicas recorrentes).
  • Ideação paranoide transitória associada a stress ou sintomas dissociativos intensos.

As pessoas com este transtorno de personalidade apresentam muitas vezes histórias de infância marcadas pelo abuso físico e sexual, negligência, conflito hostil ou perda parental prematura. Também existem fatores genéticos e fisiológicos, uma vez que o transtorno de personalidade borderline é cerca de cinco vezes mais comum em parentes biológicos de primeiro grau de pessoas que têm o transtorno. Também há o aumento do risco familiar para transtornos por uso de substância, transtorno de personalidade antissocial e transtorno depressivo ou bipolar.

Transtorno de personalidade histriónica

Caracteriza-se por um padrão difuso de emocionalidade e procura de atenção em excesso, verificando-se os seguintes aspetos:

  • Desconforto em situações em que não é o centro das atenções. Comandam o papel de “vida da festa” e, caso não sejam o centro das atenções, podem fazer algo dramático como inventar histórias ou criar uma cena para atrair o foco de atenção.
  • A interação com os outros é frequentemente caracterizada por comportamento sexualmente sedutor ou inadequado ou provocativo. A aparência é geralmente sedutora ou provocativa de forma inadequada, e este comportamento é voltado não apenas para as pessoas por quem têm interesse romântico ou sexual, mas também numa grande variedade de relacionamentos sociais, ocupacionais e profissionais.
  • Exibe mudanças rápidas e expressão superficial das emoções. As emoções são expressadas de forma exagerada e teatral. Podem envergonhar amigos e conhecidos pela exibição pública excessiva de emoções (ex: abraçar conhecidos casuais com demasiado entusiasmo, chorar de forma inconsolável em situações de menor importância, ter ataques de raiva repentinos). As emoções, no entanto, parecem frequentemente aparecer e desaparecer com muita rapidez, o que pode levar os outros a acusá-los de dissimular esses sentimentos.
  • Usa repetidamente a aparência física para atrair a atenção para si. Dedicam geralmente muito tempo, energia e dinheiro em roupas e produtos de beleza. Podem procurar elogios acerca da sua aparência e também ficar facilmente chateados se ouvem alguma crítica ou se uma fotografia sua não sair tão bem.
  • Tem um estilo de discurso que é excessivamente impressionista e carente de detalhes. Por exemplo, podem comentar que determinada pessoa é um ser-humano maravilhoso, sem conseguir fornecer exemplos específicos de qualidades que suportem esta opinião.
  • É sugestionável (ou seja, facilmente influenciado pelos outros ou pelas circunstâncias). Podem confiar em demasia, em especial em figuras fortes de autoridade que veem como capazes de solucionar de forma mágica os seus problemas. Têm tendência a dar palpites e a adotar convicções rapidamente.
  • Considera as relações pessoais mais íntimas do que na realidade são.

É difícil para as pessoas com este transtorno alcançar intimidade emocional nos relacionamentos sexuais ou românticos. Sem se darem conta disso, tendem a desempenhar um papel (por exemplo de vítima ou “princesa”) nas suas relações com os outros. Podem procurar controlar o/a parceiro/a através da manipulação emocional ou sedução e ao mesmo tempo mostrar dependência acentuada. Também tendem a afastar os amigos com exigências de atenção constante. Ficam muitas vezes deprimidos quando não são o centro das atenções, e procuram obstinadamente novidades, estímulos e excitação e têm tendência a entediar-se com a rotina, buscando satisfação imediata. Podem começar um trabalho ou projeto com muito entusiasmo e o interesse dissipar-se rapidamente, ou negligenciar relacionamentos de longa data em busca da excitação de novos relacionamentos.

Transtorno de personalidade narcisista

Consiste num padrão difuso de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), necessidade de admiração e falta de empatia, caracterizado por aspetos como:

  • Ter uma sensação grandiosa da própria importância (p.ex exagerar conquistas e talentos, esperar ser reconhecido como superior sem que tenha as conquistas correspondentes). Indivíduos com este transtorno podem tranquilamente partir do pressuposto de que os outros atribuem o mesmo valor aos seus esforços e podem surpreender-se quando o elogio que esperam e o sentimento que sentem merecer não ocorrem. A par da sobrevalorização das suas próprias conquistas está frequentemente uma desvalorização das conquistas dos outros.
  • Preocupação com fantasias de sucesso ilimitado, poder, brilho, beleza ou amor ideal.
  • Acreditar ser especial e único e que pode ser somente compreendido por, ou associado a outras pessoas (ou instituições) especiais ou com condição elevada. Estas pessoas acreditam que as suas necessidades são especiais e estão além do conhecimento de pessoas comuns. Tendem a insistir em ser atendidos apenas por pessoas “top” (médico, advogado, cabeleireiro, instrutor) ou em ser afiliados às melhores instituições.
  • Procura de admiração excessiva, com uma autoestima geralmente muito frágil. Podem estar preocupados com o quão bem se estão a sair e o quão favoravelmente os outros os consideram. Podem esperar que a sua chegada seja saudada com grandes comemorações e ficam surpreendidos quando os outros não cobiçam os seus pertences. Podem também procurar frequentemente elogios, em geral com muita sedução.
  • Apresenta um sentimento de possuir direitos (ou seja, expectativas irracionais de tratamento especialmente favorável ou que estejam automaticamente de acordo com as próprias expectativas). Esperam ser servidos e ficam furiosos ou atónitos quando isso não acontece. Por exemplo, podem supor que não precisam de esperar em filas e que as suas prioridades são tão importantes que os outros farão uma cedência.
  • Exploração nas relações interpessoais (ou seja, tira vantagem dos outros para atingir os próprios fins). Esperam receber qualquer coisa que desejam ou sintam necessitar, independentemente do que isso possa significar para os outros. Tendem a formar relações de amizade ou romance somente se a outra pessoa parece possibilitar o avanço dos seus propósitos ou, então, incrementar a sua autoestima. Costumam usurpar privilégios especiais e recursos extraordinários que creem merecer por serem tão especiais.
  • Carência de empatia: relutância em reconhecer ou identificar-se com os sentimentos e as necessidades dos outros. Tendem a discutir as suas próprias preocupações de forma detalhada e prolongada, ao mesmo tempo que falham em reconhecer que os outros também têm sentimentos e necessidades. Podem não ter consciência do quanto ferem os outros com os seus comentários.
  • É frequentemente invejoso em relação aos outros ou acredita que os outros o invejam. Podem ver com má vontade o sucesso ou os pertences das outras pessoas, sentindo que eles é que são os reais merecedores dessas conquistas, admiração ou privilégios. Podem desvalorizar as contribuições dos outros, sobretudo quando essas pessoas receberam reconhecimento ou elogio pelo que realizaram.
  • Demonstra comportamentos ou atitudes arrogantes e insolentes. Com frequência exibe snobismo, desdém ou atitudes condescendentes.

Transtorno de personalidade evitativa

Caracteriza-se por um padrão difuso de inibição social, sentimentos de inadequação e hipersensibilidade a avaliação negativa, verificam-se os seguintes aspetos:

  • Evita atividades profissionais que envolvam contacto interpessoal significativo por medo de crítica, desaprovação ou rejeição. Ofertas de promoções na vida profissional podem não ser aceites pelo facto de as novas responsabilidades poderem resultar em críticas dos colegas.
  • Não se dispõe a envolver-se com pessoas, a menos que tenha a certeza de que será recebido de forma positiva. Há um evitamento em fazer novos amigos, vendo as outras pessoas como críticas ou desaprovadoras. Tende a não participar em atividades, a não ser que tenha ofertas repetidas e generosas de apoio e atenção. A intimidade interpessoal costuma ser difícil, a menos que haja certeza de aceitação sem críticas.
  • Mostra-se reservado em relacionamentos íntimos devido a medo de passar vergonha ou de ser ridicularizado.
  • Preocupa-se com críticas ou rejeição em situações sociais. Ao menor sinal de desaprovação ou crítica, pode sentir-se extremamente magoado. Tende a ser tímido, quieto, inibido e “invisível” pelo medo de que toda a atenção seja rejeitadora. Há uma crença de que independentemente do que diga os outros entenderão como algo errado.
  • Inibe-se em situações interpessoais novas em razão de sentimentos de inadequação. Dúvidas em relação à competência social ficam especialmente claras em contextos que envolvem a interação pessoal com estranhos.
  • Vê-se a si mesmo como socialmente incapaz, sem atrativos pessoais ou inferior aos outros.
  • Relutância em assumir riscos pessoais ou em se envolver em quaisquer novas atividades, por poderem ser constrangedoras. Há uma tendência em exagerar os perigos potenciais de situações comuns, levando a um estilo de vida restrito. A pessoa pode por exemplo cancelar uma entrevista de emprego por medo de passar vergonha.

Transtorno de personalidade dependente

Caracteriza-se por uma necessidade difusa e excessiva de ser cuidado que leva a comportamentos de submissão e apego, verificando-se os seguintes aspetos:

  • Dificuldades em tomar decisões quotidianas sem uma quantidade excessiva de conselhos e aprovação por parte dos outros.
  • Precisa que outros assumam responsabilidade pela maior parte das principais áreas da sua vida. Podem depender de pais ou cônjuge para decidir onde morar, o tipo de trabalho a realizar e os vizinhos com quem fazer amizade. Adolescentes com este transtorno podem permitir que os pais decidam o que devem vestir, com quem fazer amizade, como usar o tempo livre e a escola ou universidade para onde ir. Esta necessidade vai para além das solicitações de auxílio adequadas à idade ou à situação.
  • Dificuldades em manifestar desacordo com outros devido ao medo de perder o apoio ou a aprovação. As pessoas sentem-se tão incapazes de funcionar por conta própria que podem vir a concordar com coisas que consideram erradas apenas para não arriscar perder a ajuda daqueles que procuram para orientação.
  • Dificuldade em iniciar projetos ou fazer coisas por conta própria (devido mais a falta de autoconfiança do que a falta de motivação ou energia). Podem vir a aguardar os outros para começar algo, por pensarem que, em regras, os outros podem fazer melhor. Existe a convicção de que são incapazes de funcionar de forma independente e apresentam-se como incapazes e como se precisassem de ajuda constante. É provável que funcionem adequadamente caso tenham a certeza de que a outra pessoa está a supervisionar o seu trabalho. Uma vez que dependem dos outros para lidar com os seus problemas, não aprendem as competências necessárias para uma vida independente, perpetuando assim a dependência.
  • Vai a extremos para obter carinho e apoio dos outros, a ponto de se voluntariar para fazer coisas desagradáveis. Estas pessoas estão dispostas a submeter-se ao que os outros desejam e a sua necessidade de manter um vincula resulta frequentemente em relacionamentos desequilibrados. Podem fazer sacrifícios extraordinários ou tolerar abusos físicos, verbais ou sexuais.
  • Sente-se desconfortável ou desamparado quando está sozinho, devido a medos exagerados de ser incapaz de cuidar de si mesmo. Pode-se juntar a alguém apenas para evitar a solidão, mesmo sem ter interesse na pessoa.
  • Procura com urgência outro relacionamento como fonte de cuidado e amparo logo após o término de um relacionamento íntimo.
  • Tem preocupações irreais com medos de ser abandonado.

Transtorno de personalidade obsessivo-compulsiva

Caracteriza-se por um padrão difuso de preocupação com ordem, perfeccionismo e controlo mental e interpessoal à custa de flexibilidade, abertura e eficiência, caracterizando-se por:

  • Preocupação exagerada com detalhes, regras, listas, ordem, organização ou horário a ponto de o objetivo principal da atividade ser perdido. Existe um cuidado excessivo e uma propensão para a repetição, prestando demasiada atenção aos detalhes e conferindo repetidas vezes à procura de possíveis erros. Estas pessoas frequentemente esquecem o facto de que os atrasos e inconveniências podem ser prejudiciais para os outros. Por exemplo, quando se esquecem onde colocaram uma lista de tarefas, gastam demasiado tempo a procurar a lista em vez de a refazer de memória e passar a realizar as tarefas.
  • Perfeccionismo que interfere com a conclusão de tarefas (p.ex., não consegue completar um projeto porque os seus padrões demasiado rígidos não são atingidos). Por exemplo, a conclusão de um relatório escrito é adiada por várias revisões e alterações para que tudo fique perfeito. Os prazos não são atendidos e os aspetos da vida da pessoa que não são o foco atual da atividade poem desorganizar-se.
  • Excesso de dedicação ao trabalho e à produtividade em detrimento de atividades de lazer e amizades. Com frequência sentem que não têm tempo para tirar uma tarde ou um fim-de-semana de folga. Quando realmente dedicam algum tempo ao lazer, sentem-se bastante desconfortáveis, a não ser que tenham consigo algum tipo de trabalho para “não desperdiçar tempo”. Também pode haver muito concentração em tarefas domésticas, como limpeza excessiva e repetida. Os passatempos e atividades recreativas são levadas como tarefas sérias que exigem uma organização criteriosa e trabalho duro para serem dominadas. O desempenho tem de ser sempre perfeito, e as brincadeiras e jogos são muitas vezes transformados em tarefas estruturadas.
  • Inflexibilidade quanto a assuntos de moralidade, ética ou valores. Podem obrigar-se e obrigar os outros a seguir princípios morais rígido e padrões muito austeros de desempenho. Podem ainda ser demasiado críticos em relação aos próprios erros e respeitam a autoridade e as regras de forma inflexível e literal.
  • Incapacidade em descartar objetos usados ou sem valor mesmo quando não têm valores sentimentais. Frequentemente podem admitir ser acumuladores. Consideram o descarte de um objeto um desperdício, porque “nunca se sabe quando poderá precisar dele” e ficam incomodados se alguém se tentar livrar de coisas que eles guardaram.
  • Relutância em delegar tarefas ou trabalhar com outras pessoas, a menos que elas se submetam à sua forma de fazer as coisas. Insistem que tudo tem que ser feito à sua maneira e dão instruções bastante detalhadas sobre como tudo deve ser feito, ficando surpresos ou irritados quando os outros sugerem alternativas criativas. Podem rejeitar ofertas de ajuda mesmo quando estão atrasados num prazo, porque consideram que ninguém pode fazer as coisas tão bem quanto eles mesmos.
  • O dinheiro é visto como algo a ser acumulado para futuras catástrofes e não algo para ser gasto.
  • Rigidez e teimosia. Há uma preocupação em realizar as tarefas da única maneira “certa”. O futuro é planeado ao mínimo detalhe e não existe disponibilidade para eventuais mudanças. Completamente envolvidos pela própria perspetiva, estas pessoas têm dificuldade em reconhecer os pontos de vista dos outros. Os amigos e pessoas próximas podem ficar frustradas com esta rigidez constante.

Qual o tratamento para os transtornos de personalidade?

O tratamento para o transtorno de personalidade geralmente envolve a combinação de medicação com psicoterapia. Tanto a psicoterapia individual como em grupo são eficazes para muitos destes transtornos. A medicação, por sua vez, é destinada não a “curar” o transtorno, mas a atenuar sintomas associados, como a ansiedade ou depressão.

Os objetivos do tratamento no transtorno de personalidade são:

  • Reduzir o sofrimento subjetivo;
  • Permitir que os pacientes compreendam a origem interna dos seus problemas;
  • Diminuir comportamentos desadaptativos e socialmente indesejáveis;
  • Modificar traços de personalidade problemáticos.

Nos transtornos de personalidade o tratamento geralmente ocorre a longo-prazo e prolonga-se por um período de tempo significativo, pois, para além de muitas vezes os pacientes se mostrarem resistentes à mudança, as alterações estruturais requerem tempo e esforço.

Ainda assim, o tratamento é altamente recomendável e necessário para que as pessoas com transtorno de personalidade possam diminuir o seu sofrimento e aumentar a funcionalidade nos vários contextos de vida.

Diana Pereira

Amante de histórias, gosta de as ouvir e de as contar. Tornou-se Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, pela Universidade do Porto, mas trouxe sempre consigo a escrita no percurso. Preocupada com histórias com finais menos felizes, tirou pós-graduação em Intervenção em Crise, Emergência e Catástrofe. Tornou-se também Formadora certificada, e trabalha como Psicóloga Clínica, com o objetivo de ajudar a construir histórias felizes, promovendo a saúde mental. Alimenta-se de projetos, objetivos e metas. No fundo, sonhos com um plano.